http://www.psiquiatriainfantil.com.br/congressos/uel2007/034.htm |
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Londrina, 29 a 31 de outubro de 2007 – ISBN 978-85-99643-11-2
A SÍNDROME DE BURNOUT E A DOCÊNCIA NO ENSINO FUNDAMENTAL
Solange Franci Raimundo Yaegashi – Universidade Estadual de Maringá
Ana Maria T. Benevides Pereira – Universidade Estadual de Maringá e Pontifícia e Universidade
Católica do Paraná
Irai Cristina Boccato Alves – Universidade de São Paulo
Fernando Vinícius Pereira Boccato – Universidade Estadual de Maringá
RESUMO
O presente estudo tem como objetivo investigar os níveis de burnout entre professores do ensino
público fundamental de diversas cidades paranaenses (Umuarama, Pato Branco, Guaíra, Foz do
Iguaçu, Campo Mourão, Londrina, Ivaiporã, Ibiporã e Apucarana). Para a realização do estudo,
foram utilizados os seguintes instrumentos: 1) Questionário sócio-demográfico para caracterização
da amostra e 2) MBI (Maslach Burnout Inventory). Dados de investigações recentes têm
demonstrado que os índices de rotatividade de pessoal, absenteísmo e licenças médicas entre
docentes de diferentes níveis de ensino têm aumentado significativamente nas últimas décadas, o que
justifica a necessidade de investigarmos quais as variáveis que afetam a saúde física e mental destes
profissionais. Os resultados do estudo revelam que os professores da amostra possuem não só
sintomas de estresse, mas também de burnout. Isso evidencia a necessidade de uma melhor
qualidade laboral para estes docentes, uma vez que o estresse e o burnout interferem de forma
significativa na relação professor-aluno e, conseqüentemente, no processo de aprendizagem.
Palavras-chave: estresse; burnout; prática docente;
saúde mental, Maslach Burnout Inventory.
Introdução
Ao longo da história, diversos acontecimentos, doenças e eventos de diferentes etiologias marcaram
a vida do ser humano. Por isso, o estresse não é um problema apenas do século XXI. Todos os
estudos sobre o tema apontam que o estresse é um desequilíbrio físico e mental, que pode ser
causado pelo comprometimento da qualidade de vida.
Segundo Lazarus e Folkman (1984) o estresse se dá quando a avaliação sobre um determinado
evento ou situação indica que não existem recursos suficientes para o enfrentamento. No estresse há
um rompimento do equilíbrio interno – homeostase -, sendo que o organismo, através de uma série
de mecanismos, tenta recuperar o equilíbrio perdido. O processo de estresse possui três etapas: a)
alarme, quando o agente estressor é percebido, ativando de forma intensa o organismo para seu
enfrentamento; b) resistência, em que há uma adaptação em função da ameaça sentida; c) e de
esgotamento, quando o organismo, após o emprego das estratégias possíveis, se desgasta, vindo
muitas vezes a sucumbir. Desta forma, a pessoa começa a apresentar uma série de sintomas
psicossomáticos que se intensificam, caso este estado perdure, podendo acarretar problemas sérios,
até mesmo a morte.
O estresse característico do ambiente de trabalho é denominado “estresse ocupacional”. Quando
ocorre a cronificação do estresse ocupacional, como resposta e forma, mesmo que inadequada de
enfretamento, pode vir a ocorrer o que tem sido designado como síndrome de burnout.
“O Burnout é a resposta a um estado prolongado de estresse, ocorre
pela cronificação deste, quando os métodos de enfrentamento
falharam ou foram insuficientes. Enquanto o estresse pode apresentar
aspectos positivos ou negativos, o Burnout tem sempre um caráter
negativo (distresse). Por outro lado, o Burnout está relacionado com o
mundo do trabalho, com o tipo de atividades laborais do indivíduo”
(BENEVIDES-PEREIRA et al, 2003, p. 45).
Para Harrison (1999, apud CARLOTTO, 2003a), o Burnout é o resultado do estresse
crônico que
é típico do ambiente de trabalho, principalmente quando neste estão presentes situações de
excessiva pressão, conflitos, poucas recompensas emocionais e pouco reconhecimento. Além disso,
inúmeras pesquisas têm apontado que os profissionais que trabalham diretamente com outras
pessoas, assistindo-as, ou como responsáveis pelo seu desenvolvimento e bem-estar, encontram-se
mais susceptíveis ao desenvolvimento do Burnout. Dentre estes profissionais destacam-se os
profissionais da saúde e os educadores (BENEVIDES-PEREIRA et al, 2003; ARANTES E
VIEIRA, 2002; CARLOTTO 2002b e 2003a).
Segundo Malasch, Schaufeli e Leiter (1999, apud CARLOTTO, 2003a), o Burnout é
considerado
um fenômeno psicossocial constituído de três dimensões: exaustão emocional, despersonalização e
sentimento de baixa realização profissional.
“A Exaustão Emocional é caracterizada pela falta ou carência de
energia, entusiasmo e por sentimento de esgotamento de recursos. Os
trabalhadores acreditam que já não têm condições de despender mais
energia para o atendimento de seu cliente ou demais pessoas como
faziam antes. A Despersonalização faz com que o profissional passe a
tratar os clientes, colegas e a organização como objetos, de maneira
que pode desenvolver insensilibidade emocional. Já a Baixa
Realização Profissional caracteriza-se por uma tendência do
trabalhador em se auto-avaliar de forma negativa. As pessoas
sentem-se infelizes com elas próprias e insatisfeitas com o seu
desenvolvimento profissional” (CARLOTTO, 2003a, p. 55).
Benevides-Pereira (2002) ressalta que a Síndrome de Burnout tem sido considerada um problema
social de extrema relevância, pois se encontra vinculada a grandes custos organizacionais, devido à
rotatividade pessoal, absenteísmo, problemas de produtividade e qualidade e também por
encontrar-se associada a vários tipos de disfunções pessoais. Segundo essa autora, na literatura
pode-se encontrar uma lista bastante extensa de diversos sintomas associados ao Burnout, sendo
os mesmos subdivididos em físicos, psíquicos, comportamentais e defensivos.
Dentre os sintomas físicos, Benevides-Pereira (2002) destaca: fadiga constante progressiva,
distúrbios do sono, dores musculares ou osteomusculares, cefaléias, enxaquecas, perturbações
gastrointestinais, imunodeficiência, transtornos cardiovasculares, distúrbios do sistema respiratório,
disfunções sexuais, alterações menstruais nas mulheres. Quanto aos sintomas psíquicos, a autora
cita: falta de atenção e de concentração, alterações de memória, lentificação do pensamento,
sentimento de alienação, sentimento de solidão, impaciência, sentimento de insuficiência, baixa auto-estima, labilidade emocional, dificuldade de auto-aceitação, astenia, desânimo, disforia, depressão,
desconfiança, paranóia. No que se refere aos sintomas comportamentais, a autora aponta:
negligência ou excesso de escrúpulos, irritabilidade, incremento da agressividade, incapacidade para
relaxar, dificuldade na aceitação de mudanças, perda de iniciativa, aumento do consumo de
substâncias (álcool, calmantes, etc.), comportamento de alto risco, suicídio. Por fim, no que diz
respeito aos sintomas defensivos, a autora destaca: tendência ao isolamento, sentimento de
onipotência, perda do interesse pelo trabalho (ou pelo lazer), absenteísmo, ironia, cinismo.
Uma pessoa com a Síndrome de Burnout não necessariamente apresenta todos estes sintomas.
Segundo Benevides-Pereira (2002), o grau, o tipo e o número de manifestações apresentadas
dependerá da configuração de fatores individuais (como predisposição genética, experiências
socioeducacionais), fatores ambientais (locais de trabalho ou cidades com maior incidência de
poluição por exemplo) e da etapa em que a pessoa se encontra no processo de desenvolvimento
da Síndrome.
Método
Amostra: 105 professores do ensino fundamental do Estado do Paraná de diversas regiões
(Umuarama, Pato Branco, Guaíra, Foz do Iguaçu, Campo Mourão, Londrina, Ivaiporã, Ibiporã e
Apucarana), sendo que a maioria dos participantes (97,1%; N=102) era do sexo feminino, com
idade média de 33,65 anos (DP=9,32), tendo 20 anos o mais novo e 63 o mais velho.
Instrumentos: foi utilizado um protocolo contendo,
) Questionário sócio-demográfico e profissional para caracterização
da amostra com dados
sobre idade, sexo, assim como contexto familiar e laboral;
) MBI - Maslach Burnout Inventory (MASLACH e JACKSON, 1986) em sua versão ES
Educational Survey, traduzida e adaptada pelo GEPEB, Grupo de Estudos sobre
Estresse e Burnout (BENEVIDES-PEREIRA, 2001; BENEVIDES-PEREIRA, 2002).
Trata-se de um inventário composto por 22 afirmativas, sendo 9 para a dimensão de
exaustão emocional (EE), 5 para desumanização (DE) e 8 para realização pessoal (RP),
para serem respondidas em uma escala do tipo Likert de 7 pontos, que varia de 0 “nunca”
a 6 “todos os dias”.
Em amostra nacional (BENEVIDES-PEREIRA, 2002), os alfas de Crombach
de cada uma
das dimensões foi de 0,84 para EE, 0,57 para DE e de 0,76 para RP, evidenciando nível de
confiabilidade aceitável. Utilizando os mesmos parâmetros estabelecidos por Maslach e
Jackson (1986), os padrões médios para EE situam-se entre 16 e 25 pontos, de DE entre 3
e 8 e o de RP entre 34 e 42.
) Termo de Esclarecimento e Compromisso, conforme o disposto pela Resolução
nº169/1996.
Procedimento: Inicialmente o projeto foi enviado ao Comitê de Ética da Universidade Estadual de
Maringá. Após sua aprovação os professores foram contatados e esclarecidos quanto aos objetivos
da pesquisa e informados de que os dados coletados seriam avaliados em grupo, o que não
permitiria identificação, garantindo o anonimato e a confidencialidade. Foi exposto o caráter
voluntário da participação e que poderiam vir a solicitar o desligamento em qualquer ocasião do
transcurso da mesma. Os professores foram contatados e responderam aos instrumentos entre os
meses de maio a julho de 2007.
Análise Estatística: para as análises descritivas, de comparação de médias (t de Student
e
ANOVA) assim como para o qui-quadrado, foi usado o programa estatístico SPSS – Statistical
Package of Social Sciences em sua versão 13.
Resultados e Discussão
A educação fundamental constituída predominantemente pelo sexo feminino é um fator intimamente
ligado a esta categoria profissional e presente em todas regiões do Brasil.
Quanto aos resultados relativos ao MBI para a avaliação do burnout, estes se encontram
compatíveis com os padrões nacionais como pode ser observado na Tabela 1.
Tabela 1. Médias, desvio-padrão, valores mínimos e máximos das dimensões do MBI em
um grupo de professores do interior do Paraná
Dimensão
|
Média
|
DP
|
Mínimo
|
Máximo
|
EE
|
24,62
|
10,94
|
0
|
50
|
DE
|
5,09
|
5,18
|
0
|
20
|
RP
|
36,25
|
7,60
|
15
|
48
|
Legenda: EE=exaustão emocional; DE=desumanização; RP=realização pessoal.
Para que houvesse uma melhor comparação dos dados, os valores de cada dimensão foram
divididos pelo número de itens. O resultado segue expresso na Figura 1.
Legenda: EE=exaustão emocional; DE=desumanização; RP=realização pessoal.
Figura 1. Médias ponderadas das dimensões do MBI em um grupo de professores do
interior do Paraná.
Observa-se que a exaustão emocional foi a dimensão predominante entre as demais. A
desumanização foi a que apresentou os menores valores, sendo que estes professores traduziram
pontuações intermediárias de realização pessoal.
Considerando os padrões estabelecidos como descrito anteriormente, os resultados de cada
dimensão foram distribuídos pelas categorias – elevado, moderado e reduzido. A tabela 2 apresenta
os resultados auferidos.
Tabela 2. Distribuição das pontuações do grupo de professores nas categorias – elevado,
moderado e reduzido
Dimensão
|
Elevado
|
Moderado
|
Reduzido
|
X2
|
p
|
N
|
%
|
N
|
%
|
N
|
%
|
EE
|
46
|
43,8
|
35
|
33,3
|
24
|
22,9
|
3,914
|
,032
|
DE
|
25
|
23,8
|
38
|
36,2
|
42
|
40,0
|
4,514
|
,105
|
rRP
|
33
|
31,4
|
48
|
45,7
|
24
|
22,9
|
8,400
|
,015
|
Legenda: EE=exaustão emocional; DE=desumanização; rRP=reduzida realização pessoal
Os dados da Tabela 2 revelam que 43,8% (N=46) da amostra apresentava valores
significativamente mais elevados de exaustão emocional. Dentre os professores, 31,4% (N=33) já
não sentia realização em sua ocupação, enquanto que 45,7% denotavam pontuações moderadas em
nível significativo quando comparadas com os demais. O fato de 23,8% (N=25) dos professores
revelarem níveis elevados de desumanização, inicialmente não parece ser tão expressivo. No
entanto, quando se observa que a relação professor-aluno é um elemento importante para o ensino,
permeando de forma especial a aprendizagem, chama a atenção o fato de que quase um quarto dos
docentes denotarem atitudes desumanizadas, até mesmo cínicas e sarcásticas em relação a seus
alunos.
Conforme definido por Maslach e Jackson (1986), as dimensões do MBI são independentes, mas
inter-relacionadas entre si. Para que uma pessoa seja considerada em burnout ela deve apresentar
elevação das dimensões de exaustão emocional e desumanização, bem como rebaixamento em
realização pessoal. No grupo estudado foram identificados 9 casos nessas condições, refletindo que
8,57% destes já se encontravam em burnout.
As médias das dimensões do MBI subdivididas pelas categorias sexo e idade denotaram os
resultados descritos na Tabela 3.
Tabela 3. Distribuição e comparação de médias das dimensões do MBI por sexo e idade
em um grupo de professores do Paraná
Dimensão
|
Variável
Sexo
|
N
|
Média
|
D.Padrão
|
T
|
p
|
EE
|
Feminino
|
102
|
24,81
|
10,93
|
1,064
|
0,290
|
Masculino
|
3
|
18,00
|
11,14
|
DE
|
Feminino
|
102
|
5,06
|
5,24
|
-0,308
|
0,758
|
Masculino
|
3
|
6,00
|
3,00
|
RP
|
Feminino
|
102
|
36,10
|
7,60
|
-1,179
|
0,241
|
Masculino
|
3
|
41,33
|
7,02
|
Dimensão
|
Variável
Idade
|
N
|
Média
|
D.Padrão
|
F
|
p
|
EE
|
até 25 anos
|
23
|
25,35
|
11,48
|
1,59
|
0,210
|
De 26 a 36 anos
|
41
|
26,51
|
10,53
|
37 anos ou +
|
41
|
22,32
|
10,89
|
DE
|
até 25 anos
|
23
|
6,11
|
5,04
|
1,161
|
0,317
|
De 26 a 36 anos
|
41
|
5,42
|
4,91
|
37 anos ou +
|
41
|
4,18
|
5,49
|
RP
|
até 25 anos
|
23
|
33,62
|
7,53
|
2,591
|
0,080
|
De 26 a 36 anos
|
41
|
35,96
|
6,63
|
37 anos ou +
|
41
|
38,01
|
8,23
|
Legenda: EE=exaustão emocional; DE=desumanização; RP=reduzida realização pessoal.
Como apontado por alguns autores (BENEVIDES-PEREIRA, 2002; GIL-MONTE, 2005;
MASLACH, SCHAUFELI e LEITER, 2001), a média da dimensão de exaustão emocional foi
mais elevada no sexo feminino que no masculino e a de desumanização mais elevada nos homens do
que nas mulheres, no entanto nenhuma delas apresentou diferenças significativas. Observa-se que os
maiores valores em exaustão se deu entre os professores entre 26 a 36 anos.
As atitudes características de desumanização foram diminuindo neste grupo à medida que a faixa
etária avançava. Quanto à realização pessoal, o resultado foi no sentido inverso, os docentes de
mais idade se mostraram mais realizados em suas atividades ocupacionais que seus colegas mais
novos, embora as diferenças entre as idades não tenham sido significantes.
Considerações Finais
De acordo com Lipp (2006), a profissão e o trabalho irão determinar grande parte de nossas vidas.
Portanto, o trabalho satisfatório determina prazer, alegria e saúde. Contudo, quando o trabalho é
desprovido de significação, não é reconhecido ou é fonte de ameaças à integridade física e/ou
psíquica, acaba gerando sofrimento no trabalhador.
No caso específico do professor, vários autores apontam uma série de eventos que podem ser
causadores do estresse, tais como: falta de reconhecimento, falta de respeito dos alunos, dos
governantes e sociedade em geral, falta de remuneração adequada, sobrecarga de trabalho, conflito
de papéis, baixa participação direta na gestão e planejamento do trabalho, exigência de muito
envolvimento com o aluno, inclusão de crianças com necessidades educacionais especiais em
classes de ensino regular, dentre outros (CARLOTTO, 2002a e 2002b; BENEVIDES-PEREIRA,
et al, 2003; BARASUOL, 2005). Tudo isso pode levar o professor à insatisfação, desestímulo e à
falta de perspectiva de crescimento, chegando inclusive a desenvolver a Síndrome de Burnout.
Neste sentido, é de suma importância que seja propiciada uma melhor qualidade laboral para estes
docentes, uma vez que o estresse e o burnout interferem de forma significativa na relação
professor-aluno e, conseqüentemente, no processo de aprendizagem.
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CARLOTTO, M.S. Síndrome de Burnout em professores de instituições particulares de ensino.
Aletheia, 17/18: 53-61, 2003a.
CARLOTTO, M.S. Burnout e o trabalho docente: considerações sobre a intervenção. Revista
Eletrônica InterAção Psy, 1: 12-18, 2003b.
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LAZARUS, R.S.; FOLKMAN, S. Stress, appraisal and coping. Nova York: Springer, 1984.
LIPP, M.N. O stress do professor. Campinas: Papirus, 2006.
MASLACH, C.; JACKSON, S. E. Maslach Burnout Inventory. 2nd ed. Palo Alto, CA:
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