http://www.psiquiatriainfantil.com.br/congressos/uel2007/076.htm


Londrina, 29 a 31 de outubro de 2007 – ISBN 978-85-99643-11-2


COMUNICAÇÃO ALTERNATIVA: RECURSO ESSENCIAL NA EDUCAÇÃO DE PARALISADOS CEREBRAIS


Professor PDE: Vânia Teodoro da Silva Junqueira



RESUMO


A escola deveria ter como principal função a socialização do conhecimento. Isso posto, o conceito de trabalhar potencialidades, objetivando propiciar desenvolvimento pessoal e social, por meio da disseminação de uma cultura e de saberes coletivos, torna-se uma concepção que contempla, inclusive, as pessoas com necessidades especiais. Atualmente, essas pessoas tornaram-se cidadãos detentores de direitos constitucionais cuja redação preconiza a garantia de receberem, dentro de um estabelecimento de ensino regular, sua formação educacional. No entanto, o cumprimento desse compromisso, traz consigo muitas questões implícitas: a estrutura escolar deficitária, a formação de professores que irão receber este aluno, os recursos e serviços necessários ao seu desenvolvimento global. CARVALHO (2000) pontua que:

O grande desafio é, portanto, identificar o modo mais seguro de evitar que, apesar dos direitos consagrados solenemente em discursos, não continuem a ser, tão lamentavelmente, violados na prática. A violação de direitos é, sem dúvida, um dos mais significativos entraves à democracia e à paz. O direito de ter direitos aplica-se, por certo, aos portadores de deficiência (sic) e aos superdotados (os de altas habilidades) que, como quaisquer pessoas, devem ter respeitados seus direitos à vida, à dignidade, à liberdade, à convivência familiar e comunitária, à igualdade de oportunidades em saúde, educação, trabalho e à participação social (p.19).

CHAUÍ (apud BARBOSA, 2006) defende que:

Se educação é direito, é preciso tomá-la no sentido profundo da sua origem, como formação para a cidadania e da cidadania, como o direito de todos de terem não só acesso ao conhecimento, mas também à criação do conhecimento. Isso é decisivo para que outros direitos sejam criados e para que a sociedade se torne democrática. A educação formadora se realiza como trabalho do pensamento, para pensar e dizer o que ainda não foi pensado nem dito.

Quando se propõe a inclusão de Paralisados Cerebrais na rede regular de ensino, há muitas nuances a serem consideradas. Tal educando não irá adaptar-se ao cotidiano escolar como qualquer criança.  A noção errônea de que o aluno deve se acomodar àquilo que a estrutura escolar oferece torna-se totalmente insuficiente, pois surgem novos desafios: Qual metodologia irá favorecer o aprendizado deste aluno especial; de que forma se processa seu aprendizado; que recursos são necessários na busca de seu desenvolvimento pleno?

No que concerne à convivência e produção escolar com tal alunado, de forma a se promover sua interação e auto-estima, ou seja, a percepção deste educando sobre sua própria capacidade intelectual e potencial de aprendizado, PIRES (1998) sugere uma reflexão produtiva:

...tais vivências exigem muito mais. Supõem uma estruturação curricular com métodos, técnicas e recursos educativos que dêem espaço à intercomunicação; uma sintonia de ação em torno de objetos comum (sic), e também uma perfeita integração do pessoal de apoio com a direção, a coordenação pedagógica, os serviços de orientação, o corpo docente, os conselhos de classe, os pais e os representantes comunitários. Tudo isso, evidentemente, não pode ser improvisado. Precisa ser objeto de uma planificação minuciosa, com previsão de momentos de treinamento da escola para implementar esses novos dispositivos, tanto em nível de estruturação e organização curricular, que devem ter um caráter participativo, quanto em nível de treinamento em técnicas especializadas para o atendimento das crianças com necessidades especiais. A tudo isso acrescente-se, ainda, a necessidade de instrumentalização da escolas para o uso de novos recursos educativos (p.25).


MÉTODO

O trabalho inicialmente constará de um levantamento do índice de alunos Paralisados Cerebrais freqüentando a Rede Regular de Ensino e Escolas especiais no ano de 2007. Posteriormente, com tais dados em mãos, a pesquisa bibliográfica e o aprofundamento teórico sobre o assunto será o método contemplado. Compreender como ocorre o aprendizado deste alunado será um dos objetivos, esmiuçado por meio de questionário e entrevistas pessoais com aqueles já alfabetizados e o corpo docente que os assistiu nessa trajetória. Concluindo, o acesso ao Software Comunique, que é um software destinado ao desenvolvimento da Comunicação Alternativa, será amplamente divulgado junto às professoras desses alunos de qualquer faixa etária, com sugestões relevantes de atividades, que poderão ser desenvolvidas também num editor de textos, com gravuras inseridas de programas comuns (Print Art).


RESULTADOS ESPERADOS

Após a implementação da proposta, junto aos professores de alunos com Paralisia Cerebral, será feito um relato da maneira como ocorreu o trabalho, a situação inicial do aprendizado dos educandos contemplados e a aferição de resultados alcançados. As impressões e observações dos docentes será um dos dados fundamentais para o registro de conclusões. A percepção dos alunos, quando os mesmos tiverem condições de opinar, também será considerada. Os seminários, cursos, encontros e disciplinas freqüentadas igualmente serão alvos de análise sobre sua importância no desenvolvimento do programa.

Proporcionar um ambiente favorável à inclusão, é uma questão de respeito às limitações, às diversidades, às diferenças e à valorização das potencialidades. 

Inserir os alunos com necessidades educacionais especiais na rede regular de ensino constitui o primeiro passo para a jornada da inclusão - o passo mais indutor -, devendo ser seguido de medidas pedagógicas que garantam o acesso à aprendizagem e ao conhecimento proposto na vivência escolar. Traduzido na prática, é preciso acionar os meios que efetivamente possibilitem a permanência do aluno na escola, favorecendo-lhe o acesso (BRASIL,1999,p.51).

Vygotsky (in REGO, 1999) enfatiza a relevância para o desenvolvimento humano, do processo de apropriação, por parte do indivíduo, das experiências presentes em sua cultura; a importância da ação, da linguagem e dos processos interativos, na construção das estruturas mentais superiores. Este autor ainda oferece subsídios que estimulam a discussão sobre o fato de que a educação deve incidir sobre as potencialidades e não sobre os déficits.

Isto posto, o aluno com Paralisia Cerebral tem direitos de receber uma educação coerente em classe comum, com os devidos suportes que a Tecnologia Assistiva* atualmente oferece. Seu déficit de comunicação precisa encontrar meios de expressão. DAMASCENO E FILHO, 2002 explicitam que:

no momento em que lhe são dadas as condições para interagir e aprender, explicitando o seu pensamento, o indivíduo com deficiência mais facilmente será tratado como um "diferente-igual"... Ou seja, "diferente" por sua condição de portador (sic) de necessidades especiais, mas ao mesmo tempo "igual" por interagir, relacionar-se e competir em seu meio com recursos mais poderosos, proporcionados pelas adaptações de acessibilidade de que dispõe. É visto como "igual", portanto, na medida em que suas "diferenças" cada vez mais são situadas e se assemelham com as diferenças intrínsecas existentes entre todos os seres humanos. Esse indivíduo poderá, então, dar passos maiores em direção a eliminação das discriminações, como conseqüência do respeito conquistado com a convivência, aumentando sua auto-estima, porque passa a poder explicitar melhor seu potencial e pensamentos (online).

Nestes parâmetros, a Comunicação Alternativa se apresenta como um recurso de acessibilidade concreto para neutralizar barreiras e inserir esse indivíduo nos ambientes ricos para a aprendizagem, proporcionados pela cultura. SOUZA (2006) explica que:

Interagir com o(a) outro(a) [...], auxilia a pessoa a construir seu conhecimento, aprender outras formas de pensar sobre idéias e clarear seu próprio pensamento, enfim, elaborar significados, estabelecer relações interpessoais, perceber limites, descobrir no outro possibilidades para si (p.50).

A comunicação define a situação que vai dar sentido às mensagens trocadas e, portanto, não consiste apenas na transmissão de idéias e fatos, mas principalmente, em oferecer novas formas de ver essas idéias, de lidar com as diferenças e ritmos individuais, de pensar e relacionar as informações recebidas de modo a construir significados (p. 49).

De acordo com DAMASCENO E FILHO (2002):

O objetivo da Tecnologia Assistiva é: proporcionar à pessoa portadora de deficiência maior independência, qualidade de vida e inclusão social, através da ampliação da comunicação, mobilidade, controle do seu ambiente, habilidades de seu aprendizado, competição, trabalho e integração com a família, amigos e sociedade .... Podem variar de um par de óculos ou uma simples bengala a um complexo sistema computadorizado (online).

Essas tecnologias têm possibilitado otimizar a utilização de Sistemas Alternativos e Aumentativos de Comunicação (SAAC), com a informatização de métodos tradicionais de comunicação alternativa.

De antemão, pela pesquisa inicial, verifica-se que todo trabalho efetuado com Paralisados Cerebrais que contam com meios de expressar seus interesses, emoções e necessidades, tem contribuído para um índice maior de sucesso no processo educacional dos mesmos.

* Tecnologia Assistiva é toda e qualquer ferramenta ou recurso utilizado com a finalidade de proporcionar uma maior independência e autonomia à pessoa portadora (sic) de deficiência (GALVÃO FILHO, 2007).


DISCUSSÃO

A paralisia cerebral, geralmente, não traz associada consigo a condição de deficiência mental. Sua capacidade de aprendizagem em sua essência, comumentemente, equipara-se a de um ser humano sem tais limitações físicas. Suas necessidades são as mesmas de qualquer pessoa comum: socializar-se e crescer, tendo oportunidades educacionais similares a de seus pares, sem deficiências. Contrariando idéias pré-concebidas, instituídas ao longo de décadas sobre suas impossibilidades, o Paralisado Cerebral (PC), salvo raríssimas exceções, possui um potencial de aprendizagem intacto. O que dificulta a percepção de suas capacidades inatas são os meios ou recursos ofertados para que as mesmas se tornem visíveis.

GÓES E LAPLANE (2004) reforçam essa premissa, quando pontuam:

Ainda, sob a bandeira da inclusão, algumas crianças com diferenças orgânicas [...] têm sido matriculadas em classes comuns do ensino regular, muitas vezes sem qualquer cuidado por parte da escola com a adequação de procedimentos didáticos, adaptação de material e outros requisitos básicos.

Esses procedimentos têm tido como defesa a preocupação com a não-estigmatização e com a socialização dessas crianças. No entanto, ressalto que a escola tem uma responsabilidade que nas sociedades modernas é conferida quase que exclusivamente a ela: propiciar às novas gerações o acesso (á) e a apropriação da cultura produzida pela humanidade no decorrer de sua existência e esse aspecto não pode ser negligenciado ou apresentado em segundo plano (p.63).

 A denominação Paralisia Cerebral descreve uma condição de saúde, uma dEficiência adquirida, resultado de um dano cerebral, que induz a uma inabilidade, dificuldade ou descontrole de músculos e certos movimentos do corpo. O termo Cerebral significa que a parte afetada é o cérebro (Sistema Nervoso Central -SNC). Paralisias cerebrais NÃO SÃO DOENÇAS, mas uma condição médica especial, uma conseqüência, uma seqüela de um determinado quadro que pode ocorrer antes, durante ou logo após o parto, quase sempre resultantes da ausência de oxigenação no cérebro. As lesões advindas podem ter inúmeras causas e, portanto, não existem dois casos semelhantes: alguns paralisados apresentam apenas perturbações sutis, quase imperceptíveis, pequenos desvios no caminhar, falar ou usar as mãos; outros apresentam quadros mais graves, como incapacidade motora acentuada, impossibilidade de locomoção e comunicação, sendo totalmente dependentes para as atividades básicas do viver cotidiano. Entre esses dois grupos há uma tendência a apresentar-se uma associação de distúrbios, em graus variados. Entre a denominação de PC, com raríssimas exceções, encontram-se crianças com INTELIGÊNCIA NORMAL ou mesmo superior, desde que lhes sejam fornecidas as condições necessárias para aprendizagem. Portanto não existem padrões definidos na conceituação do PC. Dessa maneira a criança PC deve ser considerada uma pessoa com características específicas que ocasionam uma série de necessidades especiais, inclusive de comunicação, que devem ser atendidas a fim de que ocorra o maior nível possível de desenvolvimento integral. COLL, PALACIOS E MARCHESI (1996) explicam que:

Sem dúvida, a linguagem, além de uma forma de comunicação, é uma função instrumental da máxima importância para a construção do conhecimento e, portanto, qualquer limitação ou alteração das habilidades lingüísticas pode acarretar problemas no desenvolvimento da inteligência (p.259).

A ausência de expressão verbal, em geral, torna a trajetória escolar insípida e desestimulante para essas pessoas. Os trejeitos faciais e a sinalização manual (quando existentes) nem sempre se revelam capazes de exprimir sentimentos, emoções, necessidades pessoais e dúvidas do Paralisado Cerebral. Neste contexto, a inserção de uma Comunicação Alternativa (que envolve o emprego de gestos manuais, expressões faciais, código Morse e signos gráficos {incluindo escrita, desenhos, fotografias e gravuras}; recursos, estes, utilizados como meios de efetuar comunicação face a face de indivíduos não capazes de usarem a linguagem oral) torna-se imprescindível, pois isso pode ser um fator decisivo entre dois resultados de relação intrínseca ao universo escolar: o sucesso ou o fracasso, parciais ou absolutos.

Este alunado especial precisa de auxílios pedagógicos adequados, de sistemas, apoios técnicos e tecnológicos para a comunicação ampliada e alternativa, que são formas de proporcionar-lhes a possibilidade de manipular o meio, ter acesso ao currículo escolar e ocupação para o tempo de lazer. O desenvolvimento de equipamentos apropriados que contribuam na expressão e na comunicação do aluno PC é imprescindível no seu processo ensino-aprendizagem. SOUZA (2006) defende que a possibilidade de comunicação pode contribuir para que o mesmo:

...sinta-se aceito e desimpedido de expressar-se e ser como é, conscientizando-se de suas potencialidades e de suas responsabilidades, como ser individual e coletivo, frente a Deus a ao próximo, construindo uma nova postura diante da vida e do mundo (p.49).

A escola, como uma instituição mediadora na construção do conhecimento, com o objetivo de disseminar a cultura de maneira ampla, detém em si uma gama de responsabilidades. Por meio da escola a sociedade adquire, fundamenta e modifica conceitos.

A escola, para que possa ser considerada um espaço inclusivo, precisa abandonar a condição de instituição burocrática, apenas cumpridora das normas estabelecidas pelos níveis centrais. Para tal, deve transformar-se num espaço de decisão, ajustando-se ao seu contexto real e respondendo aos desafios que se apresentam. O espaço escolar, hoje, tem de ser visto como espaço de todos e para todos (BRASIL, 1999, p.45).

O desafio não se restringe apenas à escola. São também fundamentais uma justiça que funcione, uma saúde de abrangência integral e uma política comprometida com o cidadão.

Contudo, a escola e seus profissionais devem assumir este compromisso, crendo que as mudanças não são utópicas e dependem de uma transformação nos atuais moldes do ensino, novos posicionamentos diante das metodologias e da aprendizagem, com concepções e práticas pedagógicas mais evoluídas. Enfim, uma transformação muito mais ampla que o espaço institucional da escola.

Portanto, antes de considerar-se a inclusão do Paralisado Cerebral, há que se pensar nas condições em que a mesma se efetivará, numa estrutura adaptada, adequada para recebê-lo, com garantias plenas de acolhimento e desenvolvimento.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


BARBOSA, B. Marilena Chauí diz que Brasil convive com violência... Disponível em http://www.une.org.br/home3/educacao/m_4912.html Acesso em 30/06/2007 14:24:32 h.

BAPTISTA, C.R.(Org). Inclusão e Escolarização: múltiplas perspectivas. Porto Alegre: Mediação, 2006

BRASIL, MEC. Educação Especial: Tendências Atuais. Brasília: Estação das Mídias,1.ª Edição, 1999. 95p. (Série de Estudos: Educação à Distância 96p, v9).

CARVALHO, R. E.. Removendo Barreiras para a Aprendizagem. Porto Alegre, Mediação, 2000.174 p.

COOL, C., PALACIOS, J., MARCHESI, A. Os Alunos com Paralisia Cerebral: Desenvolvimento e Educação- Desenvolvimento Psicológico e Educação. Cortez, Porto Alegre, 1996

GALVÃO FILHO, T.A. O Desenvolvimento de Projetos Pedagógicos em Ambiente Computacional e Telemático com Alunos com Paralisia Cerebral. Disponível em < http://www.anped.org.br/reunioes/28/textos/gt15/gt15103int.doc> Acesso em 11/04/2007 09:35:14 h

GÓES, M.C. e LAPLANE, A. F. (Orgs.) Políticas e Práticas de Educação Inclusiva. Campinas, SP: Autores Associados, 2004

PIRES. J.;PIRES.G.N.da L. A Integração Escolar de Crianças Portadoras de Necessidades Especiais na Classe Regular: Implicações Legais e Compromisso Social. Revista Integração. Ministério da Educação e dos Desportos/ Secretaria de Educação Especial, Ano 08, n.º  20, 1998, p.09-42.

REGO, T. C. Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação.. Petrópolis, RJ: Editoras Vozes, 1994, 7. ª Edição

SOUZA, É. T. de. Capelania Cristã Através da Pedagogia Participativa in Bíblia do Capelão Cristão.  UCEBRAS, Minas Gerais: Sociedade Bíblica. 2006, p.43 a 51.