http://www.psiquiatriainfantil.com.br/congressos/uel2007/077.htm


Londrina, 29 a 31 de outubro de 2007 – ISBN 978-85-99643-11-2


COMUNICAÇÃO SUPLEMENTAR E ALTERNATIVA E HABILIDADES COMUNICATIVAS DE UMA CRIANÇA COM PARALISIA CEREBRAL

Adriana Ponsoni
Débora Deliberato
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho




RESUMO

O recurso de comunicação suplementar e alternativa pode ser utilizado por crianças, jovens, adultos e idosos com deficiência que apresentam severos distúrbios da comunicação. Para a implementação deste recurso é necessário realizar a avaliação, seleção e adaptação conforme as necessidades individuais da criança com objetivo de expandir esse recurso para os diferentes contextos naturais como familiar, escolar e social. Estudos recentes têm demonstrado que a comunicação suplementar e alternativa auxilia no desenvolvimento das habilidades lingüísticas dos usuários, além de possibilitar outra forma de linguagem expressiva que não a oral e proporcionar o desenvolvimento da narrativa, aumento do repertório lexical e estruturação sintática. O objetivo do presente estudo foi ampliar as habilidades lingüísticas de uma criança com deficiência por meio do uso de recurso da comunicação suplementar e alternativa em âmbito escolar, familiar e social. A participante da pesquisa foi uma criança com paralisia cerebral espástica, do gênero feminino com idade de 8 anos, que utilizou o recurso de comunicação alternativa e suplementar em âmbito terapêutico e escolar, matricula em uma classe especial de uma escola do ensino fundamental. Durante as sessões fonoaudiológica foram trabalhadas histórias infantis através do conto e reconto de histórias, para proporcionar o desenvolvimento das habilidades comunicativas. O trabalho demonstrou que a comunicação suplementar e alternativa possibilitou o desenvolvimento das habilidades lingüísticas: ampliação do vocabulário e das estruturas frasais nos contextos escolar, social e terapêutico.
 

1 INTRODUÇÃO
A Comunicação Suplementar e Alternativa é uma área de conhecimento que surgiu na década de 70, com o objetivo de auxiliar pessoas que apresentavam dificuldades e incapacidades para se comunicar. Esse tipo de comunicação envolve expressões faciais e corporais, gestos indicativos e representativos, voz digital, símbolos gráficos como figuras, fotos, além do uso de  objetos concretos (REILY, 2004).
A comunicação alternativa foi definida como qualquer forma de comunicação que não seja a fala, utilizada por sujeitos em contextos de comunicação face a face e, pode ser considerada suplementar quando a pessoa utiliza os diferentes recursos de comunicação  como suporte a uma fala que existe, mas não é suficiente para ser entendida pelos diferentes interlocutores (VON TETZCHNER, 1997).
Segundo Von Tetzchner e Martinsen (2000), existem diversas formas de expressão que necessitam de uma comunicação alternativa, como por exemplo, as crianças que direcionam o olhar para determinados objetos, presença de vocalizações, expressões faciais, choro e outros sinais de excitação.
A comunicação alternativa engloba muitos sistemas que permitem a expressão da linguagem de pessoas com severos distúrbios da comunicação. Esses sistemas podem ser de alta ou baixa tecnologia.
Dentre os mais conhecidos sistemas de comunicação alternativa estão a Semantografia Bliss (BLISS, 1965), Pictogram Ideogram Communication System-P.I.C. (MAHARAJ, 1980) e o P.C.S. Picute Comunication Symbols (JOHNSON,1981, 1985, 1992). O P.C.S. e o P.I.C. são sistemas pictográficos baseados em imagens ou desenhos que estabelecem uma relação mais transparente entre o símbolo e seu significado.
A Comunicação suplementar e Alternativa é um recurso que pode ser utilizado em crianças, jovens, adultos e idosos com severos distúrbios da comunicação, como crianças com Paralisia cerebral, autismo, traumatismo crânio-encefálico, entre outras. Esse recurso auxilia na interação social desses indivíduos em diferentes contextos. Entretanto para a implementação da Comunicação Suplementar e Alternativa seria importante considerar os aspectos cognitivos, lingüísticos, etapas do desenvolvimento, condições sócio-culturais entre outros.
No âmbito escolar os recursos de comunicação suplementar e alternativa são utilizados por crianças com alterações lingüísticas, sendo estas falantes e não-falantes, com o objetivo de possibilitar uma nova forma de comunicação que não seja a linguagem oral, além de suplementar e/ou promover a fala de outras crianças com necessidades educacionais especiais. Segundo Thiers (1995) e Manzini (1999), na área de Educação Especial, a comunicação alternativa vem sendo utilizada como procedimentos técnicos e metodológicos por pessoas que possuam alguma deficiência que impossibilitam a fala.
O uso da comunicação suplementar e alternativa no contexto escolar necessita a participação de uma equipe com diferentes profissionais para avaliar, selecionar, adaptar e implementar este recurso.
Estudos recentes têm demonstrado a importância da avaliação e dos cuidados na seleção de recursos  suplementares e alternativos de comunicação, visando que seus usuários possam ser inseridos em contextos comunicativos funcionais, escolares e no uso familiar (DELIBERATO; MANZINI, 1997).
Durante o processo de seleção, implementação e acompanhamento dos recursos e/ou estratégias da comunicação suplementar e alternativa é importante a participação da família, escola e de todo uma equipe de profissionais que possam avaliar cada etapa de procedimento com os alunos usuários do recurso ( DELIBERATO; MANZINI, 1997,2000; DELIBERATO; MANZINI; GUARDA, 2004; MANZINI; DELIBERATO, 2004).
A Comunicação suplementar e alternativa no contexto escolar pode ser implementada através da contagem e recontagem de histórias, com o objetivo de auxiliar o processo de ensino-aprendizagem do aluno com paralisia cerebral, possibilitando o aprendizado de novos repertórios lexicais, ampliação da estrutura frasal e contribuindo para a construção do processo de interpretação de texto.
Segundo Nunes et al (2003) as narrativas são utilizadas como estratégias para a aquisição e o desenvolvimento das habilidades lingüísticas dos usuários de comunicação gráfica. As sentenças possibilitam a compreensão mais fidedigna das narrativas, englobando os constituintes semânticos e estruturação sintática.
Deste modo, o uso da narrativa proporciona a aprendizagem de crianças falantes e não falantes que são usuários do recurso de comunicação suplementar e alternativa.  


2 OBJETIVO
Ampliar a aquisição de habilidades lingüísticas de uma criança com paralisia cerebral por meio da comunicação suplementar e alternativa.

2.1 Objetivos Específicos:
Ampliar a aquisição de vocabulário.
Ampliar as estruturas  de frases utilizadas nos diferentes ambientes.

3. METODOLOGIA
3.1 Participante
Foi selecionada uma criança com paralisa cerebral espástica do gênero feminino, com idade de oito anos matriculada em classe especial da rede estadual do interior de São Paulo.

3.2. Local e período
A coleta de dados também foi realizada durante atendimento fonoaudiológico do Setor de Comunicação Alternativa de um Centro de atendimento na área da saúde e educação de uma Universidade do interior de São Paulo.
A coleta de dados foi realizada durante o período de agosto 2006  julho de 2007.

3.3. Material de pesquisa
Foi utilizado o software Boardmaker (MAYER-JONHSON, 2004) para confecção dos símbolos gráficos do Picture Comunication Symbols (PCS), referentes à história infantil. Também foram utilizados objetos concretos, histórias infantis e materiais para a confecção e adaptação dos livros de histórias infantis.

3.4. Procedimentos para coleta
3.4.1 Primeira Etapa:
A primeira etapa foi à realização da identificação do repertório lexical pertencente aos diferentes contextos que a criança estava inserida. A identificação foi realizada por meio de visita à escola e entrevista com a família.

..2        Segunda Etapa:
Foram selecionadas histórias infantis que continham conteúdos pedagógico, familiar e social. As histórias infantis foram adaptadas de acordo com as etapas de desenvolvimento lingüístico e cognitivo da criança.

3.4.3 Terceira  Etapa:
Inicialmente, a história foi apresentada através da utilização de objetos concretos e símbolos gráficos Picture Comunication Symbols (PCS), com o auxilio de livros infantis.
A história foi trabalhada nos atendimentos fonoaudiológicos realizados duas vezes por semana. Primeiramente, a terapeuta oferecia o modelo de estruturação frasal adequado e o ensino de novos repertórios lexicais.
Em um segundo momento foi solicitado o auxilio da criança para a realização da estruturação sintática da história, sendo também inserido o vocabulário trabalhado em diferentes contextos lingüísticos, a fim de verificar a generalização do repertório lexical.

3.4.4 Quarta Etapa:
A confecção da história foi realizada no computador durante as sessões fonoaudiológicas, em que a criança participava da elaboração e organização da estrutura frasal. Posteriormente, a criança era conduzida para outros ambientes do centro de atendimento, a fim de estabelecer novos parceiros de comunicação e auxiliar no processo de desenvolvimento da narrativa.
O desenvolvimento do discurso narrativo foi proporcionado pela contagem e recontagem de historias através dos livros e do computador.
O livro infantil adaptado foi entregue à criança para a utilização em contextos lingüísticos variados e com diversos parceiros de comunicação.


4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
A avaliação, seleção e adaptação antes da implementação do recurso da comunicação suplementar e alternativa foram de  importância, pois proporcionaram melhor desempenho da criança em diferentes contextos. Foi descrita, em diversos estudos, a importância da adequação do recurso de comunicação suplementar e alternativa, conforme as necessidades individuais do sujeito. (DELIBERATO; MANZINI, 1997,2000; DELIBERATO; MANZINI; GUARDA, 2004; MANZINI; DELIBERATO, 2004).
Foi possível verificar que o uso da comunicação suplementar e alternativa em âmbito escolar e terapêutico auxiliou no processo de ensino e aprendizagem, proporcionando à criança, o desenvolvimento do discurso narrativo, aumento do repertorio lexical e organização sintática adequada.  Segue um exemplo de uma situação de história realizada com a criança com deficiência:
T:  Terapeuta  /    C: criança
T: Vamos agora montar essa parte da história T. ? (A T. apontou para a figura do livro infantil).
Neste momento a C. responde vocalizando que sim.
T: Eu vou começar, o lobo mau (colocou na prancha a figura do lobo mau), fez o que?
A C. pegou a figura do comer.                                                              
T: Isso, muito bem, vamos colar essa figura?
T: Mas C. quem o lobo mau comeu?
Neste momento a P. pegou a figura da vovó e colocou na prancha com auxilio da terapeuta. A C. inicia apontando para a frase solicitando que a T. realizasse a leitura.
T: O lobo mau comeu a vovó. (modelo fornecido pela C)
      Enquanto a terapeuta realiza a leitura dos símbolos gráficos a C. apontou para as figuras com estruturação frasal adequada.

Assim pode-se verificar que a utilização do recurso de comunicação suplementar e alternadiva em diferentes contextos podem auxiliar no desenvolvimento da narrativa, aumento do repertório lexical e ampliação da estruturação sintática como citado no estudo realizado por Nunes et al (2003).

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BLISS, C. Semanthography (Blyssimbolics). Sidney: Semanthography Publications, 1965.

DELIBERATO, D.; MANZINI, E. J. Comunicação Alternativa: delineamento inicial para a implementação do Picture Comunication System (P.C.S). Boletim do C.O.E, Marília, n. 2,  p. 29-39, 1997.

DELIBERATO, D.; MANZINI, E. J. Análise de processos comunicativos utilizados por uma criança com paralisia cerebral espástica. In: MANZINI, E. J. Educação Especial: temas atuais. Marília: Unesp-Publicações, 2000.

DELIBERATO, D.; MANZINI, E. J.; GUARDA, N. S. A implementação de recursos suplementares de comunicação: participação da família na descrição de comportamentos comunicativos dos filhos. Revista Brasileira de Educação         Especial, Marilia, v.10, n.2, p. 217-240, mai./ago 2004.

MANZINI, E. J. Recursos pedagógicos para o aluno com paralisia cerebral. Revista mensagem da Apae, São Paulo, v. 36, n. 84, p. 17-21, 1999.

MANZINI, E. J; DELIBERATO, D. Portal de ajudas técnicas para a educação: equipamento material pedagógico para a educação, capacitação e recreação da pessoa com deficiência física-recursos para comunicação alternativa. Brasília: Mec/Secretaria de Educação Especial, 2004. Fascículo 2,

MAYER-JOHNSON, R. The Picture Communication Symbols - P.C.S. Software Boardmaker. Porto Alegre:Clik Tecnologia Assistiva, 2004.  

NUNES, L. R. O. P. Linguagem e Comunicação Alternativa: uma introdução. In: NUNES, L.R.O.P. (Org.).Favorecendo o desenvolvimento da comunicação em crianças e     jovens com necessidades educacionais especiais. Rio de Janeiro: Dunya, 2003, p. 1-13.

NUNES, L. R. O. P. et al.  Narrativas sobre fotos e vídeos e narrativas          livres através de sistema gráfico de Comunicação Alternativa. In: NUNES, L.R.O.P. (Org.). Favorecendo o desenvolvimento da comunicação em crianças e jovens com necessidades educacionais especiais. Rio de Janeiro: Dunya, 2003, p. 143-169.

REILY, L. Sistemas de Comunicação suplementar e alternativa. IN: REILY, L. Escola Inclusiva: linguagem e mediação. Campinas: Papirus, 2004. (Série Educação Especial). cap. 3, p. 67-88.

THIERS, V. O. Comunicação alternativa em paralisia cerebral: avaliação de iconicidade de símbolos picto-ideográficos e de variáveis de controle de busca a símbolos Bliss em tabuleiros de comunicação. 1995. 130f. Tese (Mestrado em Psicologia)- Universidade de São Paulo, São Paulo, 1995.

VON TETZCHNER S. Argumentative and alternative communication: assessment andintervention – a functional approach. Theoretical aspects. Department of Psychology, University of Oslo, Norway. Manuscrito não publicado, 1997.

VON TETZCHNER  S.; MARTINSEN H. Introdução à comunicação alternativa. Porto, Portugal: Porto Editora, 2000.