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Londrina, 29 a 31 de outubro de 2007 – ISBN 978-85-99643-11-2

EQUIPE MULTIPROFISSIONAL NA IMPLEMENTAÇÃO DE RECURSOS DE COMUNICAÇÃO SUPLEMENTAR E ALTERNATIVA COM ALUNOS COM DEFICIÊNCIA
Adriana Ponsoni
Fabiana da Silva Zuttin
Patrícia Cristina Nóbrega Contarini
Débora Deliberato
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho


RESUMO

Crianças com paralisia cerebral podem apresentar limitações motoras, cognitivas, sensoriais e severos distúrbios da comunicação que dificulta a inclusão social e escolar. Deste modo a atuação de diferentes profissionais auxilia no processo de ensino-aprendizagem da criança com paralisia cerebral falante e não-falante por meio da utilização do recurso de comunicação suplementar e alternativa. O objetivo do presente estudo foi utilizar o Recurso de Comunicação Suplementar e Alternativa com crianças com paralisia cerebral por profissionais de diferentes áreas como: fonoaudiologia, fisioterapia, terapia ocupacional e pedagogia para auxiliar no processo de ensino e aprendizagem acadêmica e, assim facilitar a inclusão social e escolar. Esse trabalho foi desenvolvido com duas crianças com paralisia cerebral do tipo atetóide uma do gênero feminino e a outra do masculino, com idades entre 8 e 6 anos respectivamente. Atividades foram realizadas em um Centro de Atendimento nas áreas da saúde e educação de uma Universidade no interior de São Paulo e em duas classes especiais, sendo uma pré-escola da rede municipal de ensino e a outra de pertencente ao ensino fundamental estadual. Procedimentos: os profissionais realizaram encontros quinzenais com os professores e as famílias das crianças participantes; identificaram o planejamento escolar e o vocabulário necessário para as atividades pedagógicas; seleção e adaptação de histórias; adaptação de recursos segundo as necessidades motoras e comunicativas. O trabalho indicou que a atuação conjunta dos profissionais favoreceu as  adequações dos recursos de comunicação suplementar e alternativa às especificidades dos alunos do ponto de vista motor, comunicativo e funcional.
 
INTRODUÇÃO
Nos últimos anos têm sido observados grandes debates e investigações nas áreas da educação e educação especial, principalmente no que diz respeito à inclusão e a existência de classes de educação especial no ensino regular. Essa temática também tem sido expandida para outras áreas como fonoaudiologia, psicologia, terapia ocupacional, pedagogia, fisioterapia, educação física dentre outras.
Essa discussão traz embasamentos teóricos sobre o contexto histórico da educação especial e inclusiva; a criação de leis que asseguram o direito a educação de alunos com deficiência; as mudanças necessárias para a implementação de estratégias para a inclusão escolar; as políticas públicas de inclusão, a qualidade de ensino das escolas; a formação dos professores, a participação da família e profissionais e o trabalho colaborativo proposto para efetivar a prática deste processo.
Mendes (2002) ressaltou a necessidade de ensino colaborativo ou cooperativo entre os professores do ensino regular e especial, e entre os professores do ensino regular e consultores especialistas de áreas afins. Dessa forma, esse trabalho no âmbito da educação escolar, demonstra a importância da avaliação, planejamento e implementação de programas para suprir as dificuldades de alunos com deficiência na inclusão social e escolar.
Neste contexto, a área da Comunicação Suplementar e Alternativa tem sido indicada pelos pesquisadores da educação e da saúde como uma possibilidade importante para a atuação de equipes interdisciplinares e multidisciplinares no planejamento de ações coletivas para viabilizar o processo de inclusão escolar e social.
De acordo com Manzini (2001) a comunicação alternativa na área da Educação Especial está sendo utilizada como um conjunto de procedimentos técnicos e metodológicos com indivíduos acometidos por alguma doença, deficiência ou situação temporária que dificulta a comunicação pela linguagem oral.
Capovilla (2001) definiu Comunicação alternativa (CA) como toda e qualquer modalidade de comunicação diferente da oral e/ou escrita, sendo este o único recurso disponível para a comunicação por parte de pessoas com severos distúrbios e/ou limitações motoras e/ou cognitivos e/ou de linguagem.
O uso da comunicação alternativa considera as características pessoais de cada indivíduo, o estágio de desenvolvimento cognitivo, os aspectos sociais, natureza e grau de comprometimento e de preservação dessas funções.
Dessa maneira, a comunicação alternativa pode ser empregada temporariamente como um recurso terapêutico e educacional de (re)habilitação e educação até que as funções subdesenvolvidas ou perdidas se (re)estabeleçam, e ou mais permanentemente como recurso de substituição e compensação das funções cognitivas que não podem desenvolver-se ou recuperar-se (CAPOVILA, 2001).
A comunicação alternativa tem como objetivo promover e suplementar a fala de forma a garantir uma comunicação alternativa e suplementar de pessoas falantes e não-falantes. De forma geral, os usuários desse recurso podem ser pessoas que possuem boa compreensão, mas dificuldade de expressão; pessoas que possuem fala ininteligível o que dificulta a compreensão da fala por outras pessoas; acometimentos graves como autismo, paralisia cerebral, traumatismo crânio- encefálico; doenças degenerativas; afasia; lesões medulares, dentre outros severos distúrbios da comunicação.
Dentre os severos distúrbios da comunicação, ressalta-se a paralisa cerebral (PC). Esse termo que também pode ser encontrado como Encefalopatia Crônica não progressiva da infância foi descrito pela primeira vez por Freud em 1987, como conjunto de afecções que comprometem o sistema nervoso central imaturo e que tem em comum o distúrbio motor como uma de suas manifestações mais evidentes.
As crianças com Paralisia Cerebral apresentam déficits motores e outros distúrbios que podem aparecer decorrentes da lesão neurológica como distúrbios de fala e linguagem; distúrbios de deglutição; déficit cognitivo; alterações auditivas; distúrbios do comportamento; alterações oculares e visuais; convulsões; alterações das funções corticais superiores, dentre outras (GIANI, 2003).
Assim, a paralisia cerebral é definida como um grupo não progressivo, mas freqüentemente mutável, de distúrbios motores (tônus e postura), secundários á lesão do cérebro em desenvolvimento (KUBAN; LEVITON,1994).
A lesão do cérebro pode ocorrer em qualquer momento, desde a fase embrionária até os dois anos de idade, sendo que as causas podem ter origem pré-natal, perinatal ou pós-natal. Além disso, a paralisia cerebral pode ser classificada de acordo com as manifestações clínicas e o tipo do distúrbio do comportamento em espástico, atetóide, atáxico e misto.
Segundo Gianni (2003), cerca de 75% dos casos de paralisia cerebral podem ser classificados como espásticos. Caracteriza-se por lesão do córtex cerebral comprometendo o sistema piramidal, com diminuição da força muscular e aumento do tônus muscular. Neste tipo de paralisia cerebral é comum encontrar deformidades osteoarticulares; atraso nas aquisições motoras e permanência de reflexos primitivos.
O segundo tipo de paralisa cerebral classificada como atetóide, caracteriza-se pelo acometimento de 15 a 20% dos casos que apresentam lesões nos núcleos da base. As manifestações clínicas são descritas por movimentos involuntários, o que pode dificultar a realização de tarefas funcionais pela criança. No entanto, essas crianças demoram para adquirir etapas motoras convivem bem com a persistência dos reflexos primitivos, utilizando- os funcionalmente.
O terceiro tipo de paralisa cerebral classificada como atáxica é considerada o tipo mais raro, sendo que somente 2% das crianças são acometidas. Caracteriza-se por uma lesão no cerebelo, ocasionando alterações de coordenação e do equilíbrio.  A incidência de deficiência mental nestes casos é alta.
A paralisia cerebral classificada como mista refere-se quando apenas 20% dos casos apresentam sintomas associados de mais de um tipo clínico. Na grande maioria dos casos, há predomínio de um dos quadros citados anteriormente.
Estudos demonstraram a importância do uso do recurso de comunicação suplementar e alternativa por crianças com paralisia cerebral, falantes e não-falantes, em diferentes contextos escolar, terapêutico, familiar e social (DELIBERATO, 2005, ALVES, 2006; SAMESHIMA, 2006).
O uso da comunicação suplementar e alternativa no âmbito escolar necessita a participação de uma equipe com diferentes profissionais composta por fonoaudiólogo, terapeuta ocupacional, fisioterapeuta, pedagogo, entre outros para avaliar, selecionar, adaptar e implementar este recurso.
Segundo Gray (1997), é importante que a equipe de profissionais que atua com alunos não-falantes realize avaliações para que encontre as necessidades de comunicação do aluno e desenvolvam estratégias para facilitar a comunicação em vários ambientes.
A literatura compilada demonstrou que pesquisadores têm se preocupado com a avaliação das habilidades comunicativas em indivíduos não-falantes na educação especial (DELIBERATO; MANZINI, 2000; MANZINI, 2002).
 Durante a avaliação das habilidades comunicativas pode-se identificar o recurso que o indivíduo não-falante utiliza para se comunicar com os outros. Segundo Deliberato e Manzini (2000), durante a avaliação da linguagem é importante observar os meios comunicativos utilizados pela criança além da linguagem oral.
A literatura tem discutido a importância da avaliação e dos cuidados na seleção de recursos alternativos e/ou suplementares de comunicação, visando que seus usuários possam ser inseridos em contextos comunicativos funcionais, escolares e no uso familiar (DELIBERATO; MANZINI, 1997).
Durante a seleção do recurso de comunicação para o aluno não-falante deve-se levar em consideração a facilidade do uso desse recurso em todo ambiente, além das características funcionais e habilidades físicas, cognitivas e comunicativas desse indivíduo.
Dessa forma, a implementação do recurso de comunicação alternativa deve considerar as necessidades individuais de cada criança, assim como, a parceria com família e profissionais para auxiliar na escolha do recurso comunicativo a ser utilizado e também no levantamento do vocabulário a ser empregado.
A importância da participação da família de crianças não-falantes relatada por Ângelo (1997) e Von Tetzchner e Martinsen (2000), refere-se ao processo de avaliação e seleção do vocabulário do sujeito. Para esses autores, o convívio diário dos familiares com essas crianças faz com que possam identificar as várias formas de comunicação e o vocabulário utilizado por elas.
Manzano (2001) ressaltou que é plenamente necessário que os pais e a equipe profissional estejam interligados com a finalidade de trabalhar juntos na educação da criança. Assim, os pais podem fornecer informações importantes a cerca das características de seus próprios filhos, para assessorar na escolha da implementação e desenvolvimento de programas pela equipe através do trabalho colaborativo.
Chiattone (2004) destacou a importância do trabalho colaborativo em equipe pela uniformidade dos objetivos a serem atingidos, realçando as relações de trocas entre os diferentes membros o que pode facilitar à aquisição das habilidades das crianças deficientes. Desta forma, salienta-se a importância do conhecimento das habilidades e necessidades da criança deficiente juntamente com o conhecimento de seu meio e as opções de recursos e estratégias disponíveis a fim de estabelecer um trabalho educacional eficaz.
A escola deve disponibilizar uma série de recursos e apoios de caráter mais especializado juntamente com os profissionais, para proporcionar ao aluno deficiente meios para o acesso ao currículo viabilizando o processo de ensino-aprendizagem (BRASIL, 2001).
O processo de ensino aprendizagem pode ser construído através da utilização do recurso de comunicação suplementar e alternativa de crianças com paralisia cerebral falantes e não-falantes nos diversos contextos.
Dessa maneira, torna-se necessário a realização de adaptações desse recurso, respeitando as diferenças individuais, culturais e sociais de cada criança a fim de proporcionar oportunidades e possibilidades de ensino e aprendizagem, assim como a inclusão social e escolar.

OBJETIVO
Implementação de recurso de comunicação suplementar e alternativa por equipe multidisciplinar em alunos com deficiência.

METODOLOGIA
Participantes
Foram selecionadas duas crianças com paralisa cerebral, sendo uma do tipo atetóide do gênero masculino, de seis anos e a outra com paralisia cerebral do tipo espástica, do gênero feminino, com idade de oito anos matriculados em classe especial da rede municipal e estadual de uma cidade do interior de São Paulo.

Local e período
A pesquisa foi realizada em duas classes especiais, sendo uma pré-escola da rede municipal de ensino e a outra pertencente ao ensino fundamental da rede estadual de ensino de uma cidade do interior de São Paulo. Além das atividades programadas na escola, também foram realizados procedimentos no setor de comunicação alternativa de um Centro de atendimento nas áreas da saúde e da educação de uma Universidade do interior de São Paulo.
A coleta de dados foi realizada durante o primeiro semestre de 2007.


Material de pesquisa
Foi utilizado o software Boardmaker (Mayer-Jonhson, 2004) para confecção dos símbolos gráficos do Picture Comunication Symbols (PCS), referentes ao conteúdo e a estrutura pedagógica escolar. Também foram utilizados objetos concretos, histórias infantis e materiais para a confecção e adaptação dos livros de histórias infantis.

Procedimentos para coleta
Os procedimentos utilizados para coleta de dados deste estudo foram:
1.A realização de visitas periódicas a escola pela equipe composta por profissionais de fonoaudiologia, fisioterapia, terapia ocupacional e pedagogia a fim de avaliar as necessidades das crianças com Paralisia cerebral deste estudo, usuárias do recurso de CSA e identificar o conteúdo e estrutura pedagógica para implementar o recurso de comunicação suplementar e alternativa.
2.Adaptações de livros de histórias infantis para a realização de conto e reconto de histórias no contexto escolar, terapêutico e domiciliar.
3.Orientação aos educadores e familiares para a utilização do recurso de CSA.


RESULTADOS E DISCUSSÃO
Através da realização das visitas escolares e dos atendimentos terapêuticos com a utilização do recurso de Comunicação Suplementar e Alternativa e a participação do trabalho colaborativo foi possível observar que esse trabalho proporcionou o aumento das trocas e das habilidades comunicativas das crianças por meio da utilização do recurso de CSA, sendo condizente com estudos de Deliberato e Manzini (1997); Chiattone (2004) e Gray (1997).
Outro aspecto visualizado foi a importância da realização da avaliação, seleção, adaptação, implementação e disponibilização do recurso de CSA para possibilitar o aumento da atenção visual e auditiva durante a atividade de conto e reconto de histórias infantis, auxiliando o processo de ensino-aprendizagem e ampliação de habilidades comunicativas como demonstrado pela literatura (DELIBERATO; MANZINI, 2000; MANZINI, 2000; BRASIL, 2001).
Este estudo possibilitou observar que os livros adaptados foram utilizados nos diferentes contextos social, familiar, escolar e terapêutico através da parceria realizada entre pais, professores, alunos e profissionais da saúde, proporcionando assim, a ampliação da interação social e educacional dessas crianças. Esses dados se relacionam com as pesquisas de Ângelo (1997); Von Tetzchener e Martinsen (2000); Manzano (2001).
Portanto, esta pesquisa demonstrou a importância do trabalho colaborativo para beneficiar as necessidades do usuário de Comunicação Suplementar e Alternativa nos contextos multidimensionais de cada indivíduo.


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