http://www.psiquiatriainfantil.com.br/congressos/uel2007/087.htm |
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Londrina, 29 a 31 de outubro de 2007 – ISBN 978-85-99643-11-2
A CORRELAÇÃO ENTRE O TDAH E A PSICOMOTRICIDADE
BARDY, L.R.
MASTROIANNI, E.Q.C.
BOFI, T.C
CARVALHO, A.C.
Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”- Faculdade de Ciências e Tecnologia,
Campus de Presidente Prudente (UNESP)
RESUMO
O Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH) é diagnosticado em
crianças, adolescentes e em adultos, com prevalência em torno de 3 a 6% da população mundial.
Tem como principais características: desatenção, tendência à distração, não aceitação de regras,
impulsividade, excessiva atividade motora, antecipação de respostas, inabilidade para esperar um
acontecimento, dificuldade no aprendizado, déficits motores tais como: equilíbrio, noção de espaço
e tempo. O fracasso escolar é também um agravante na vida das crianças com TDAH. Com o
intuito de amenizar as dificuldades das crianças com TDAH e investigar as correlações entre o
TDAH e a Psicomotricidade são atendidas no Laboratório de Atividades Lúdico Recreativas (LAR)
dezoito crianças diagnosticadas com este transtorno. Os atendimentos ocorrem semanalmente, por
graduandos dos cursos de Pedagogia, Educação Física e Fisioterapia da FCT/Unesp. A
metodologia utilizada trata-se da técnica lúdica. Durante as sessões foram aplicadas práticas lúdicas
abrangendo jogos, pintura, dobraduras, esquema corporal e atividades de motricidade fina e global.
Foi possível observar no decorrer das sessões que a maioria das crianças obteve melhor
desempenho escolar, além de adquirir minimizações em algumas das características negativas do
TDAH.
Introdução:
Muito tem se comentado sobre o Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH),
também conhecido como Hiperatividade, não apenas na comunidade educacional como na social.
Parte dessa realidade deve-se ao fato de que a incidência desse transtorno é de 3% a 6% da
população mundial.
De acordo com Oliver (2007), tal transtorno pode ser também definido como Déficit de Atenção e
Aprendizagem com Hiperatividade (DAAH), pelo fato de que a vida escolar dessas crianças torna-se enormemente prejudicada.
Ainda segundo Oliver, o DAAH é visto como um transtorno multifatorial associado a fatores
ambientais e genéticos, provocado provavelmente por alterações no desenvolvimento
neuroemocional. Tais alterações ocorrem nos neurotransmissores, portanto afetam a atenção e a
coordenação motora.
Segundo Goldstein (1994), foram classificados quatro subtipos de TDAH: o tipo desatento,
hiperativo impulsivo, tipo combinado e um tipo não específico.
O tipo desatento evita tarefas que exigem um esforço mental prolongado; parece não ouvir;
esquecimento nas atividades diárias; não enxerga detalhes ou faz erros por falta de cuidado; distrai-se com facilidade; dificuldade na organização.
Já no tipo hiperativo impulsivo pode-se observar inquietação; fala excessivamente; responde a
perguntas antes mesmo de elas serem formuladas; dificuldade em esperar sua vez.
O tipo combinado é caracterizado pela pessoa que apresenta os dois conjuntos de critérios do tipo
desatento e hiperativo/impulsivo.
O tipo não específico apresenta algumas características, mas insuficiente de sintomas para chegar a
um diagnóstico completo. Esses sintomas, no entanto, desequilibram a vida diária.
As causas do TDAH ainda não são plenamente conhecidas, apesar de vários estudos terem sido
realizados. Pensa-se na possibilidade do envolvimento de fatores genéticos, lesões neurológicas
decorrentes de dificuldades na gestação ou nos estágios iniciais do desenvolvimento neonatal e
alterações de sistemas de neurotransmissores (MELLO, MIRANDA, MUSZKAT, 2005).
Conforme citado anteriormente, o TDAH afeta o desenvolvimento psicomotor da criança,
especificamente Equilíbrio, Noção Espaço-temporal e Esquema Corporal.
A Psicomotricidade é a ciência que investiga o homem por meio do seu corpo em movimento e em
relação a seu mundo, tanto externo como interno, bem como suas possibilidades de perceber, atuar,
agir com o outro, com os objetos ao seu redor e consigo mesmo. Está relacionada ao processo de
maturação, onde o corpo é a origem de aquisições cognitivas, afetivas e orgânicas. (Almeida,
2007).
A Psicomotricidade quer justamente destacar e aliar a relação que existe entre a motricidade, a
mente e a afetividade, elementos fundamentais para o bom desenvolvimento de uma criança.
A partir dos três meses de idade a criança já se descobre como proprietária de um corpo, e que
pode através dele ter o prazer de brincar; ao mexer os pés e as mãos e após com outras partes do
corpo. Desta maneira, aos poucos a criança obtém o domínio do próprio corpo. (Alves, 2007).
Através de estímulos ambientais, como por exemplo: experiências lúdicas com ou sem brinquedos
vivenciados por mediadores significativos à criança, o processo de maturação vai sendo
desenvolvidos, de fato.
Por isso, todo tipo de experiência corporal que a criança tenha desde pequena influenciará
diretamente nas suas experiências motoras, para que o desenvolvimento seja adequado.Sendo
assim, torna-se fundamental que qualquer criança receba estímulos desde a tenra idade, relacionada
a experiências corporais para que não haja prejuízos em seu desenvolvimento.
De acordo com Le Boulch (1982) In: Almeida (2007):
“A educação psicomotora concerne uma formação de base
indispensável a toda criança que seja normal ou com problemas. Ela
ainda responde por uma dupla finalidade: assegurar o desenvolvimento
funcional tendo em conta possibilidades da criança e ajuda sua
afetividade a expandir-se e a equilibrar-se por meio de intercâmbio
com o ambiente humano”. p.26
Em relação ao TDAH é importante que um acompanhamento precoce seja realizado com a criança
para que seus déficits e prejuízos advindos das características do transtorno sejam minimizados, uma
vez que não há cura, mas sim um controle das características.
Portanto, as características mais comuns do TDAH são:
- Dificuldade em manter a atenção e o esforço;
- Fracasso em inibir respostas impulsivas;
- Incapacidade de modular a excitação em níveis apropriados (ficar superecitado em algumas
situações, mas sem motivações em outras;
- Inclinação para procurar recompensa imediata. (MELLO, MIRANDA, MUSZKAT, 2005,
p.69).
De acordo com Cypel, 2001 a capacidade da fixação da atenção varia-se com a idade, no entanto,
é extremamente importante para que os processos de aprendizagem, sobretudo escolar atendam às
expectativas esperadas.
Neste ínterim, há necessidade de uma investigação sobre a correlação existente entre o transtorno e
os aspectos psicomotores, isto é compreender se há influências positivas em relação ao
desenvolvimento das crianças com TDAH após o tratamento baseado na Psicomotricidade através
da aplicação de técnicas lúdicas para que essas crianças tenham uma vida social, profissional,
familiar e emocional o mais “normal” possível.
Método:
Realiza-se no Laboratório de Atividades Lúdico-Recreativas (LAR) da Faculdade de Ciências e
Tecnologias (FCT)/Unesp, Campus de Presidente Prudente o atendimento de onze crianças
diagnosticadas com TDAH, sendo oito do sexo masculino e três do sexo feminino. Sessões
ocorrem semanalmente com as crianças tendo a duração de quarenta e cinco minutos ministrada por
graduandos dos cursos de Educação Física, Fisioterapia e Pedagogia da FCT.
Além de crianças diagnosticadas com TDAH o LAR também atende crianças com: Paralisia
Cerebral, Síndrome de Down, Síndrome do X frágil, Cavernoma, Síndrome de Kabuk, Deficiências
Mentais, Citomegalovirus ou simplesmente crianças que tenham atraso no desenvolvimento
psicomotor e/ou dificuldades de aprendizagem.
Para o diagnóstico em relação nível de desenvolvimento das referidas crianças efetuou-se uma
avaliação psicomotora utilizando a Escala de Desenvolvimento Motor (Rosa Neto, 2001), que
consiste em uma bateria de testes padronizados que avaliam as seguintes áreas do desenvolvimento:
motricidade fina; motricidade global; equilíbrio; esquema corporal/rapidez; organização/espacial;
linguagem /organização temporal.
As variáveis da avaliação são: idade motora, quocientes motores, escala motora e perfil motor.
Torna-se importante ressaltar que os testes são aplicados a partir da idade cronológica da criança;
se a mesma obtiver êxito em uma prova, o resultado é considerado positivo e registrava-se ‘’1’’ na
folha de resultados, evoluindo assim para o teste da próxima área, sempre iniciando-se pela idade
cronológica da criança. Porém, se a criança não apresenta êxito na realização da prova após três
tentativas, registrava-se ‘’0’’ na folha de resultados e aplica-se o teste relativo a idade anterior, e
assim sucessivamente até atingir o objetivo proposto pelo teste, diagnosticar a idade psicomotora.
O principal resultado a ser observado é a Idade Motora Geral, pois é através dela que se obtém o
atraso da criança. A seguir estão as variáveis que o teste se propõe a investigar, bem como a
fórmula utilizada.
- Idade Motora Geral (IMG):
IMG1+IMG2+IMG3+IMG4+IMG5+IMG6
6
Onde:
- IMG1 é a idade motora da criança na área Motricidade Fina;
- IMG2 é a idade motora da criança na área Motricidade Global;
- IMG3 é a idade motora da criança na área Equilíbrio;
- IMG4 é a idade motora da criança na área Esquema Corporal;
- IMG5 é a idade motora da criança na área Organização Espacial;
- IMG6 é a idade motora da criança na área Organização Temporal.
O atraso é verificado através da diferença entre a idade cronológica e a idade
motora geral. (IC – IMG)
Resultados:
As avaliações demonstraram que a defasagem mais considerável entre as crianças TDAH atendidas
no LAR foi encontrada em relação ao Esquema Corporal. A segunda maior defasagem encontrada
foi em relação à Equilíbrio e Organização/Espacial.
A noção ou competência de esquema corporal tem papel fundamental no desenvolvimento da
criança com o mundo exterior, pois é vista como ponto de partida para o agir (Alves, 2007).
O Equilíbrio é uma função psicomotora bem relevante, pois não pode haver movimento sem atitude,
também não pode haver coordenação de movimento sem um bom equilíbrio, permitindo o
ajustamento do homem ao meio.À medida que ele cresce e evolui, o equilíbrio torna cada vez mais
fundamental e a sua base de sustentação (a seu tamanho e sua forma) imprescindível para sua
manutenção (Alves, 2007). Assim como a Estruturação Espacial, que tem como finalidade situar-se
através do espaço e das relações espaciais para vivermos no meio estabelecendo relações entre as
coisas, fazendo observações, comparando-as, combinando-as, vendo as semelhanças e diferenças
entre elas (Alves, 2007).
Gráfico 1: Média da Idade Motora em relação a Média da Idade Cronológica
Onde:
MF = Motricidade Fina
MG = Motricidade Global
EQ = Equilíbrio
EC = Esquema Corporal
OE = Organização/Espacial
OT = Linguagem/Organização Temporal
No gráfico acima a ordenada representa a média da idade motora em anos e a abscissa representa
cada aspecto motor.
Na média das avaliações realizadas as crianças apresentaram no esquema corporal um resultado de
5 anos e 4 meses na idade motora sendo que idade cronológica elas tem em média 7 anos e 8
meses isso nos mostra que elas obtiveram uma defasagem em média de 2 anos e 4 meses por
criança. Outro aspecto que as crianças apresentaram déficit foi o equilíbrio que em média elas
apresentaram idade motora de 6 anos e meio e na organização/espacial 6 anos e 7 meses.
A Psicomotricidade e as atividades lúdicas mostraram-se importantes e eficientes, uma vez que
amenizaram algumas das principais características do transtorno, proporcionando, assim, um melhor
desempenho na vida escolar e considerável influência na socialização.
A intervenção obteve resultados positivos nas seguintes características: agitação, impulsividade,
dificuldade com frustrações, desatenção, pois trabalha não apenas o aspecto educacional como
também o psicossocial.
Todas as crianças atendidas apresentaram melhor desempenho em relação ao desenvolvimento
motor.
Discussão:
Acreditamos que a defasagem em relação ao Esquema Corporal está ligada ao nível qualitativo das
experiências que as crianças têm, ou seja, como não possuem a capacidade de selecionar estímulos,
praticamente todas as experiências das crianças com o ambiente ocorrem de maneira inadequada,
desordenada, uma vez que não focam sua atenção em uma atividade por um tempo considerado
ideal para que sua realização seja proveitosa. Com essa defasagem, torna-se dificultoso que haja
avanços nas outras valências que apresentam em defasagem, pois a noção de esquema corporal
pode ser encarada como precursora das outras capacidades.
Por isso, durante o atendimento às crianças, tornou-se fundamental o enfoque as atividades
voltadas ao Esquema Corporal em simbiose com a capacidade de atenção para que êxitos
pudessem ser alcançados.
A noção de Esquema Corporal compreende a noção do “eu” corporal, assim como o tônus
muscular e a mobilidade. Por isso, foi utilizado durante os atendimentos atividades que trabalhassem
o controle do tônus muscular, o deslocamento global do corpo e o equilíbrio deste.
Compreendemos que o fato de ter havido defasagem no Equilíbrio deve-se ao empobrecimento da
noção de Esquema Corporal.
Para Ajuriaguerra (1972) In: Alves (2007): “o tônus que prepara e guia o gesto é simultaneamente a
expressão da realização ou frustração do indivíduo”. O tônus apresenta-se como uma tensão que
regula e controla a atividade postural como suporte do movimento. p.60
Para Le Boulch (1983) in (Alves 2007), a representação do espaço e imagem corporal evolui
paralelamente e suas etapas de evolução são correlativas.
Com isso concluímos que para uma evolução no desenvolvimento psicomotor de crianças com
TDAH inicialmente será realizado uma reeducação no fator esquema corporal e a partir dessa
valência poder-se-á alcançar êxito nos aspectos psicomotores que se encontram em defasagem
(Equilíbrio, Organização/Temporal), pois a estruturação corporal está diretamente ligada com o
tônus muscular que é a base para ter um bom equilíbrio e com a mobilidade, deslocamento globais
do corpo que seria o alicerce para obter a estruturação espacial. Conclui-se também que a
Psicomotricidade em paralelo com as atividades lúdicas podem ser um interventor na criança com
TDAH, pois com ela consegue-se criar estratégias e ambientes adequados tanto para trabalhar a
parte motora em defasagem como as características do transtorno.
Referências Bibliográficas:
ALMEIDA, G.P. Teoria e Prática em Psicomotricidade: jogos, atividades, atividades
lúdicas, expressão corporal e brincadeiras infantis. Rio de Janeiro: Wak Ed, 2006.
ALVES, F. Psicomotricidade: Corpo, Ação e Emoção. Rio de Janeiro: Wak Ed, 2007.
CYPEL, S. A criança com déficit de atenção e hiperatividade: Atualização para pais,
professores e profissionais de saúde. São Paulo: Lemos Editorial, 2001.
GOLDSTEIN, S. et GOLDSTEIN, M. Hiperatividade – como desenvolver a capacidade de
atenção da criança. Campinas: Papirus, 1994.
MELLO, C.B., MIRANDA, M.C., MUSKAT, M. Neuropsicologia do desenvolvimento. São
Paulo: Memnon, 2005.
NETO, F.R. Manual de Avaliação Motora. 1.ed. Florianópolis, 2001
OLIVIER, L. Distúrbios de Aprendizagem e de Comportamento. Rio de Janeiro: WAK Ed.,
2007.