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Londrina, 29 a 31 de outubro de 2007 – ISBN 978-85-99643-11-2

O ATENDIMENTO AO DISCENTE DIANTE DAS NECESSIDADES EDUCACIONAIS PERMANENTES E TRANSITÓRIAS NAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR DE SANTA MARIA-RS

Andréa Tonini –UFSM
Cláudia Terra do Nascimento- UFSM
Vantoir Roberto Brancher- UFSM
Luciane Leoratto Pozobon - UFSM
Jordana Lima de Moraes - UFSM
Fabiane Adela Tonetto Costas – UFSM


RESUMO

O presente estudo visa constatar as formas de atendimento que está sendo oferecido aos alunos com de necessidades educacionais especiais permanentes e transitórias nas Instituições de Ensino Superior em Santa Maria/RS. Esses dados podem ser úteis na formação docente em geral e do educador especial, podendo contribuir sobremaneira no entendimento dos complexos elementos que cercam tal processo, sejam eles sociais, políticos, econômicos, dentre outros. Pesquisar a respeito das necessidades educativas especiais permanentes e transitórias nas demandas universitárias nos aproxima das significações construídas pelas próprias Instituições de Ensino Superior a respeito dos processos de ensino - aprendizagem relacionados aqueles que possuem tais necessidades. O desvelamento do atendimento discente acerca das necessidades educacionais especiais permanentes e transitórias poderá revelar uma faceta até então desconhecida nas representações e significações das Instituições de Ensino Superior a respeito da necessidade e obrigatoriedade prevista em lei para tal atendimento, clareando concepções acerca do que essas instituições entendem por necessidades educativas especiais permanentes e transitórias. O desenvolvimento da investigação está acontecendo através de um aporte metodológico quali-quantitativo descritivo, tendo como instrumento uma entrevista semi-estruturada junto aos profissionais que atendem aos discentes nas áreas psicológica, psicopedagógica, pedagógica e/ou de orientação vocacional profissional. Das oito IES (Instituições de Ensino Superior) de Santa Maria, seis profissionais destas já foram entrevistados. Resultados preliminares evidenciam que os serviços mais oferecidos são os de Psicologia e Psicopedagogia. Em cinco destas há presença de alunos que acorrem em necessidades educacionais especiais permanentes como a surdez, a cegueira e a deficiência física e com necessidades educacionais transitórias registram-se estudantes com dificuldades na aprendizagem (falta de concentração, dificuldades de memorização, dificuldades lógico-matemáticas). E em apenas duas existem núcleos institucionalizados de apoio ao estudante.


INTRODUÇÃO

Atualmente, entende-se a saúde não apenas como a ausência de doenças físicas, representando os cuidados integrais à pessoa. A partir deste conceito de saúde, aceito mundialmente através da Organização Mundial de Saúde, pode-se perceber a relação que existe entre saúde integral e desenvolvimento humano. Na verdade, este conceito vem sendo amplamente divulgado desde a Conferência de Alma Ata em 1978, destacando-se a importância do desenvolvimento humano e a necessidade de uma adequada observação do desenvolvimento cognitivo, enquanto aspectos fundamentais da saúde das populações (Yunes & Díaz, 1997).
A infra-estrutura necessária para responder a estas ‘novas demandas’ em saúde e em educação, no entanto, em termos de instalações, programas específicos e mesmo recursos humanos adequados, quantitativa e qualitativamente, ainda é precária para muitas áreas, principalmente as interdisciplinares. Observa-se, nesse contexto, que parecem não existir ações interdisciplinares de saúde e educação que consigam suprir todas as demandas populacionais, principalmente nas Instituições de Ensino Superior. (Veras et al., 1998). No entanto, é justamente no banco de ensino superior que essas dificuldades se tornam mais visíveis, diante das exigências de desempenho, cada vez mais cobradas. Os alunos com necessidades educacionais especiais, em geral, permanecem sem atendimento, gerando uma perda de autonomia e de qualidade de vida (Yunes & Díaz, 1997).
Como os Sistemas de Saúde e de Educação não se encontram estruturados para atender à demanda crescente deste novo perfil, a falta de serviços que atue frente às necessidades educacionais especiais faz com que muitas pessoas fiquem sem atendimento, fato que diminui as chances de um prognóstico favorável. As avaliações nesta área geralmente são múltiplas e requerem pessoal qualificado, equipe interdisciplinar, além dos cuidados básicos e preventivos (Veras et al., 1998). Daí a principal importância das Instituições de Ensino Superior possuírem formas de atendimento interdisciplinar a seus alunos, que eventualmente venham a apresentar necessidades especiais permanentes e/ou transitórias.
Pode-se perceber então, que a aprendizagem como parte do processo de desenvolvimento global do sujeito que apresenta ou não necessidades especiais, deve ser garantida enquanto aspecto inerente ao desenvolvimento sadio, pois assim garante-se também um desenvolvimento pleno, além de prevenir uma série de dificuldades inerentes aos processos de aprendizagem e de desenvolvimento.
Frente a estas necessidades, porém, o Brasil ainda possui sistemas desorganizados, com uma baixa resolutividade, baseados na desinformação, inexistência de serviços de saúde e de educação que dêem conta destas dificuldades e despreparo da sociedade e dos próprios profissionais em lidar com esses obstáculos, o que resulta em um trabalho ineficiente e, na maioria dos casos, inexistente (Veras et al., 1998).
No entanto, com as atuais mudanças sociais e científicas, espera-se que o atendimento prestado a pessoa com necessidades educacionais especiais em breve se torne uma realidade, a exemplo de outros países onde esse cuidado faz parte do rol de atendimentos prestados pelas próprias Instituições de Ensino Superior (Organização Pan-Americana da Saúde, 1997). Sobre esta questão, Stobãus & Mosquera (2005), apontam que um dos fatores da última década foi a Declaração de Salamanca, da UNESCO (1994), adotada pela Conferência Mundial sobre Educação para Necessidades Especiais – acesso e qualidade, realizada em Salamanca, Espanha. A partir desse encontro, a UNESCO registrou o conceito de inclusão no campo da educação.
Stobãus & Mosquera (2005), afirmam que:

Segundo a Declaração, o princípio da inclusão consiste no reconhecimento da necessidade de se caminhar rumo à escola para todos – um lugar que inclua todos os alunos celebre a diferença, apóie a aprendizagem e responda às necessidades individuais. Outra idéia importante é a de que há um emergente consenso de que pessoas com necessidades educativas especiais devem ser incluídas nos planos educativos, feitos para a maioria das pessoas. Isto leva a uma idéia de escola inclusiva (p. 121).

Assim, o atendimento ao aluno com necessidades especiais insere-se nos diferentes níveis da educação, o que inclui a educação superior. Para que se avance nessa direção, Pacheco & Costas (2006), colocam que “é essencial que os sistemas de ensino busquem conhecer a demanda real de atendimento a alunos com necessidades educacionais especiais” (p. 157). E, para finalizar, assim como não existe ensino pela metade, também “não existe qualidade pela metade”, como disse o Dr. Carlos Oliveira, chefe na enfermaria da Escola Paulista de Medicina/Unifesp (Lakatos, 2001). Frente ao exposto anteriormente, a presente pesquisa está investigando como as necessidades educacionais especiais permanentes e transitórias dos alunos estão sendo atendidas nas Instituições de Ensino Superior em Santa Maria – RS.
Em decorrência dessa meta, outras ações estão sendo desenvolvidas, tais como a identificação de quais são as necessidades educacionais especiais permanentes que fazem parte do quadro discente nas instituições de ensino superior em Santa Maria – RS, bem como quais são as necessidades educacionais especiais transitórias que fazem parte do quadro discente destas.
A partir dessas constatações essa pesquisa vem registrando como as necessidades educacionais especiais encontradas são atendidas nas instituições de ensino superior em Santa Maria, considerando, quando for o caso, a existência de núcleos de apoio ao discente, sua composição e formas de atendimentos prestados.

MÈTODO

 Esta pesquisa caracteriza-se por um viés quanti-qualitativo, do tipo descritivo, já que busca descrever as formas de atendimento prestadas aos alunos no ensino superior, diante das necessidades educacionais especiais. Fazem parte do grupo de pesquisa todas as Instituições de ensino superior de Santa Maria – RS, quais perfazem um total de oito, sendo uma da rede pública e sete da rede privada de ensino. Dentre estas quatro pertencentes a ordens religiosas e três vinculadas a iniciativas de sociedade anônima. Para análise e coleta dos dados está se fazendo uso de uma entrevista semi-estruturada, aplicada individualmente em cada Instituição de ensino superior, com um representante da mesma, contendo as seguintes questões:
- Quais as necessidades educacionais especiais permanentes e transitórias foram identificadas em alunos da Instituição e como foram identificadas;
- Quais as formas como essas necessidades educacionais especiais permanentes e transitórias são ou foram atendidas na Instituição;
- Quais as formas como as necessidades educacionais especiais permanentes e transitórias em geral são atendidas na Instituição. Existência de um Núcleo de Apoio Discente, sua composição, formas de atendimentos prestados, quais as especialidades compreendidas, número de profissionais contratados envolvidos, número de atendimentos realizados, número de alunos contemplados.
Os dados numéricos estão sendo tabulados e serão posteriormente analisados a partir do percentual de ocorrência de respostas, a partir da estatística descritiva. Os dados descritivos serão analisados a partir de uma matriz qualitativa de análise. Adianta-se que as informações coletadas já estão sendo transcritas e analisadas a partir de seu conteúdo. É importante salientar que a própria matriz está sendo organizada a partir do material encontrado nas respostas dos sujeitos.

RESULTADOS

Já foram contatadas todas as instituições de ensino superior da cidade de Santa Maria-RS. Dessas, em apenas três não foi possível à interlocução junto ao responsável pelo serviço de apoio ao estudante, mas ainda se espera um encontro.
Salienta-se que para fins de preservação da identidade tanto da instituição como do entrevistado será utilizado para designação a seguinte legenda IES1, IES2, IES3, IES4, IES5. Como resultado preliminar pode ser observado e apontado o fato de que das cinco IES entrevistadas, duas tem um núcleo institucionalizado que presta atendimento ao discente.
Na primeira delas (IES1) há um núcleo em que os profissionais atendem à demanda da Psicologia, Psicopedagogia, Orientação Vocacional/Profissional estritamente no limite da instituição, ou seja, comunidade discente interna que abrange desde alunos do ensino médio a estudantes de pós-graduação. Nessa IES existem casos de alunos com necessidades especiais permanentes (surdez e cegueira) e transitórias (dificuldades na aprendizagem) Entretanto o núcleo referido acolhe e intervém apenas com as necessidades educacionais transitórias, que são dificuldades na aprendizagem da leitura, do raciocínio lógico-matemático, espacial, de organização e outras que são decorrentes da relação professor-aluno.
Na segunda (IES2) não há nenhum tipo de atendimento ao estudante, pois os cursos oferecidos se inserem na modalidade à distância. Os alunos são auxiliados nas suas necessidades curriculares através de um telefone e durante as aulas de vídeo conferência, que acontecem uma vez por semana.
A terceira (IES3) dispõe de um serviço psicopedagógico que trabalha apenas com seus estudantes. Em caso de precisar maior acompanhamento o estudante é encaminhado a um serviço público de saúde mental. Quanto às necessidades especiais o serviço acolhe alunos com dificuldades na aprendizagem que envolvem organização, memorização, relacionamento professor-aluno.
Em uma quarta (IES4), registrou-se que esta não possui um núcleo instituído, apenas um grupo formado por docentes psicólogos, acadêmicos do curso de Psicologia, uma enfermeira e pedagogas que desenvolvem atividades junto aos alunos quando estes se encontram em dificuldades acadêmicas (notas baixas, reprovações, exigências curriculares). Foi relatado que há um número significativo de cadeirantes (necessidades educacionais especiais permanentes), fazendo com que a IES4 adequasse suas instalações. Entretanto estes discentes não são público-alvo do grupo mencionado.
Na quinta (IES5) há dois núcleos: um que atende questões vinculadas à Psicologia e Psicopedagogia, especificamente para os alunos da instituição, exceto os alunos do curso de Psicologia. O outro núcleo apóia tanto os alunos, como a comunidade externa nas especialidades de Enfermagem, Terapia Ocupacional, Nutrição e Fisioterapia. Nessa IES existem casos de necessidades educacionais especiais permanentes (surdez, cegueira e deficiência física). Nos casos de surdez, desde o ingresso à faculdade a IES contata os familiares para que nomeiem um intérprete para que acompanhe estes estudantes ao longo do curso. Quanto aos estudantes cegos e deficientes físicos não foi mencionada qual o tipo de adaptação é realizada pela IES5. As necessidades educacionais especiais transitórias são atendidas por profissionais ligados ao núcleo de Psicologia e Psicopedagogia. Particularmente em relação às dificuldades na aprendizagem (concentração, leitura, raciocínio lógico-matemático, organização, memorização), quando o aluno busca o núcleo lhe é oferecido o auxílio de um “tutor” (um acadêmico do mesmo curso do aluno), porém matriculado em semestres posteriores.

DISCUSSÃO

Quanto à existência de alunos com necessidades educacionais especiais transitórias e permanentes, as instituições foram unânimes ao reconhecer alunos com algum tipo de necessidade, sendo que apenas a IES2 não pode nos fornecer maiores informações, por ter apenas cursos de graduação à distância, o que impede o contato com o aluno. Pode-se observar que na maioria dos casos, as necessidades apresentadas pelos alunos são transitórias, como dificuldade na aprendizagem, tais como fixação de conteúdos, desempenho lógico-matemático, concentração, memorização, relação professor-aluno, sendo que um número mínimo destas dificuldades é de foro orgânico e/ou permanente (deficiência física, surdez, deficiência auditiva).
Em geral, essas necessidades são identificadas pelos próprios alunos, que ao sentirem necessidade buscam o atendimento quando este é oferecido pela instituição. Os professores também têm a responsabilidade de estar aconselhando o aluno a essa busca quando este demonstra algum tipo de problema e /ou dificuldade, tanto pessoal como curricular. A IES2 dispõe de um número de telefone (0800), com qual ao aluno pode estar entrando em contato com um professor para esclarecer alguma questão da matéria. Os acadêmicos da EAD podem também esclarecer dúvidas durante as aulas que ocorrem por videoconferência duas horas por semana. No entanto a IES2 limita-se a atender o discente apenas nas suas questões curriculares, sem nenhum tipo de atendimento psicológico ou psicopedagógico ao aluno.
Na IES1 e na IES5 existe um núcleo de apoio ao discente, com serviços psicopedagógico e psicológicos prestados por profissionais responsáveis pelo núcleo. Estes núcleos fazem parte dessas IESs e prestam serviço a todos os cursos oferecidos pelas mesmas. A IES3 conta apenas com o trabalho de uma psicopedagogia que presta atendimento aos três cursos oferecidos pela instituição. A IES3, por ter implantado recentemente o curso de Psicologia, utiliza-se de alguns acadêmicos e psicólogos para atender algum aluno quando necessário.
 As instituições que afirmaram ter o serviço utilizam-se de atendimento e atividades diferenciadas, fazendo uso de novas metodologias para um melhor desenvolvimento do aluno. Com ênfase na psicopedagogia e na psicologia esses núcleos atuam procurando desenvolver as potencialidades do aluno, porém quando necessário ocorre um encaminhamento para um profissional fora da instituição. A IES5 dispõe de dois núcleos, um psicológico e psicopedagógico que atende o aluno em seus aspectos emocionais e pedagógicos, e um núcleo mais voltado à saúde, com nutricionistas, enfermeiras, terapeutas ocupacionais que trabalham o aluno em suas dificuldades orgânicas, quando necessário.
Através da pesquisa bibliográfica e dos dados coletados pelas entrevistas até então realizadas, está sendo possível constatar que a preocupação maior das instituições de ensino superior e até mesmo dos órgãos financiadores (seja público ou privado) é estritamente com a formação acadêmica do aluno. Há pouca valorização das dimensões psicológicas, psicopedagógicas, vocacionais/profissionais, que são extremamente relevantes para o pleno desenvolvimento pessoal e profissional do discente em formação. No entanto, as instituições que possuem o serviço mostraram-se interessadas em ampliar e qualifica-los através de parcerias entre as diversas IES e seus respectivos núcleos e serviços, visando proporcionar ao discente um atendimento de qualidade que contemple as suas necessidades como um todo. Com este objetivo de ampliar estes núcleos de apoio e os serviços oferecidos por eles,a presente pesquisa está se desenrolando, acreditando que o aluno precisa ter um substancial suporte emocional e pedagógico nessa etapa tão importante de sua vida.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


BRASIL. Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais: Acesso e qualidade (1994 – Salamanca). Declaração de Salamanca e linha de ação sobre necessidades educativas especiais. 2ª ed., Brasília: CORDE, 1997.
YUNES, J. & DÍAZ, A. Situação de saúde materno-infantil e suas tendências na América Latina e no Caribe. IN: Organização Pan-Americana da Saúde. Ações de saúde materno-infantil a nível local: Segundo as metas da Cúpula Mundial em Favor da Infância. Washington, D.C.: OPAS, 1997.
LAKATOS, S. Pediatria de cara nova. Crescer em Família. São Paulo: 2001.
ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE. Ações de saúde a nível local: Segundo as metas da Cúpula Mundial em Favor da Saúde Integral. Washington, D.C.: OPAS, 1997.
PACHECO, R. V. & COSTAS, F. A. T. O processo de inclusão de acadêmicos com necessidades educacionais especiais na Universidade Federal de Santa Maria. Revista Educação Especial, n. 27, Santa Maria, 2006.
STOBÃUS, C. D. & MOSQUERA, J. J. Ideários da educação especial através de depoimentos de professores e alunos. IN: Krebs et all. Educação inclusiva e necessidades educacionais especiais. Editora UFSM, 2005.
VERAS, R. P. et al. 1998. Novo perfil das doenças: novos modelos de cuidado. Revista Brasileira de Home Care. IV: 24.