http://www.psiquiatriainfantil.com.br/congressos/uel2007/114.htm


Londrina, 29 a 31 de outubro de 2007 – ISBN 978-85-99643-11-2

UM ESTUDO SOBRE AS ESTRATÉGIAS DE COMUNICAÇÃO UTILIZADAS POR PROFESSORES DE ALUNOS SURDOS EM ESCOLAS MUNICIPAIS

Projeto financiado pelo CNPQ
Cibele Cristina Boscolo¹
Maria da Piedade Resende da Costa²
¹ Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Educação Especial da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar
² Docente do Programa de Pós-graduação em Educação Especial da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar




INTRODUÇÃO

A educação inclusiva é a prática de inclusão de todos os alunos independentemente de suas deficiências em escolas e salas de aulas adequadas, de modo que haja o aprendizado do conteúdo acadêmico por eles. O desafio deste ensino é o de desenvolver uma pedagogia centrada na criança capaz de educar a todo e qualquer aluno no ensino regular, independentemente de suas condições físicas ou origem social e cultural com sucesso (BUENO, 2001).
O processo de inclusão de surdos nas classes regulares se depara com duas vertentes. Uma delas o fato de que ocorrendo a inclusão nas classes regulares evita-se a discriminação. Por outro lado, observa-se que alguns alunos surdos possuem dificuldade em acompanhar a classe regular. Alguns autores como Pagliaro e Ansell (2002), e Hilawani (2003),  verificaram que os professores de alunos surdos pertencentes à classe comum do ensino fundamental apresentavam dificuldade para lidar com esses alunos, principalmente para estabelecer uma comunicação e para passar conceitos.
Narece et al (2004) enfatizaram que para a obtenção de sucesso no processo educacional da criança deficiente auditiva torna-se importante à compreensão por parte da equipe de professores, educadores e profissionais da educação a compreensão da audição bem como as conseqüências da Deficiência Auditiva. Ainda acrescentaram que a maioria dos professores desconhece os aspectos de conseqüências da deficiência auditiva para a comunicação, assim como suas formas de reabilitação.
O professor precisaria encontrar modos de intervenção pedagógica ou adequar a sua prática no sentido de chegar até o modo peculiar de aprender de cada aluno.Em relação ao aluno surdo, a comunicação e a adaptação pedagógica são sustento para o sucesso educacional. Dessa forma torna-se importante conhecermos as estratégias de comunicação e pedagógicas que os professores utilizam com seus alunos surdos, afim de orientá-los para que obtenham o sucesso educacional.
Sendo assim, esse trabalho apresentou como objetivo verificar as estratégias de comunicação utilizadas por professores de alunos surdos.

Metodologia
O presente trabalho foi apreciado e aprovado pelo Comitê de ética em Pesquisa com seres humanos, da Universidade Federal de São Carlos.

Sujeitos
Participaram deste estudo 4 professores do ensino fundamental, de uma escola municipal de Araraquara – SP, que possuíam alunos surdos em suas salas de aula.

Instrumentos:

Para a realização deste estudo, foram utilizados: a) filmagem – A filmagem é um meio que possibilita assistir o fenômeno observado várias vezes (Guarda e Deliberato, 2006). Segundo Kreppner (2001) essa tecnologia de vídeo torna um importante recurso para melhorar o consenso intra e entre observadores, além disso, possibilita a reconstrução do material gravado.

b) registro cursivo – De acordo com Guarda e Deiberato (2006), o registro cursivo é uma técnica de descrição realizada no momento da observação, por um período de tempo interrupto em que é registrado detalhadamente o que ocorre numa determinada situação. As anotações do caderno de registro descrevem as relações professor-aluno surdo, além de ser um complemento das filmagens.

c) questionário investigatório do tipo de comunicação utilizada pelos professores

Procedimento:

Após o consentimento da Secretaria de Educação do Município, foi escolhida aleatoriamente a escola que possuía mais alunos surdos . Posteriormente, foi feito o contato com a diretora da escola a fim de obter autorização para iniciar a pesquisa. Após isso, foi iniciada a filmagem em sala de aula.

Deve ser enfatizado que a atividade filmada sempre foi preparada pela professora da sala sem nenhuma interferência da pesquisadora, de forma que o planejamento inicial da aula pudesse ser seguido de acordo com o cronograma de aula. Não houve também nenhuma interferência em relação aos conteúdos e métodos adotados.

As filmagens ocorreram em dias e horários alternados, com a duração média de 30 minutos totalizando 1hora e meia, realizada nas quatro salas de aula. A filmadora permaneceu no fundo da sala visando-se não atrapalhar a rotina diária da aula.


Resultados

Os dados coletados foram transformados em gráficos para melhor visualização.

Gráfico 1 – Tipo de Comunicação utilizada com o aluno surdo, segundo relatos dos professores


O gráfico 1  ilustra o tipo de comunicação utilizada pelos professores com seus respectivos alunos surdos. Observa-se que 2 professoras (50%) utilizam a comunicação oral constituída pela fala, 1 (25%) utiliza LIBRAS e 1 (25%) relatou que não consegue estabelecer uma comunicação efetiva com seu aluno.


Gráfico 2 – Distribuição das estratégias de comunicação utilizadas professores em sala de aula

Legenda: 1- fala mais devagar; 2 - utiliza repetições; 3 - fala de frente; 4- fala de costas; 5 - fala alto; 6- articula bem; 7 - fala normalmente; 8 - usa só gestos e não fala; 9 - articula exagerado; 10 - fala perto do aluno; 11 - usa LIBRAS; 12- usa somente gestos; 13 - associa sinais e fala; 14 - associa sinais e gestos; 15 - associa gestos e fala; 16 – fala de lado; 17 - usa toque para chamar atenção; 18 - usa fala para chamar atenção; 19 - articula sem som; 20 - fala longe do aluno;

Para análise dos resultados utilizou-se a categorização das estratégias de comunicação utilizadas por Boscolo e Santos (2002).

Em relação às estratégias de comunicação, como demonstra o Gráfico 2, as 4 professoras (100%) utilizaram repetições,falaram de costas para o aluno surdo voltadas para o quadro negro, ao menos em algum momento da aula; também todas utilizaram intensidade de voz alta e por alguns momentos falaram perto do aluno surdo ao nível de seu campo visual. Das avaliadas, 3 (75%) professoras utilizaram gestos e  fala para se comunicar com o aluno surdo, 1 (25%)  utilizou-se de LIBRAS.


 Discussão

A comunicação professor x aluno surdo é um dos alicerces para o sucesso educacional dessa população. Com esse estudo, pode-se observar que os professores utilizam-se de algumas estratégias de comunicação adequadas e outras inadequadas para lidar com o aluno surdo. Deve ser ressaltado que as professoras avaliadas utilizam-se de repetições, procuram falar ao nível do aluno surdo e procuram utilizar-se de gestos, fala e sinais para comunicar-se com os alunos. Apenas 1 professora utilizou-se de LIBRAS, o que demonstra ainda ser um conhecimento precário dentre os professores. Uma professora relatou na aplicação do questionário que não conseguia estabelecer uma comunicação efetiva com seu aluno, porém durante a filmagem foi observado o uso de gestos representativos e algumas estratégias inadequadas para a comunicação com aluno surdo, como falar voltada para o quadro negro e longe do aluno. Observou-se que todas as professoras em algum momento da aula falaram de costas para o aluno surdo, utilizavam voz em intensidade alta, que além de oferecer riscos para uma disfonia funcional propicia uma distorção do som para o surdo. Embora a inclusão esteja acontecendo, o que se observa é uma falta de orientação adequada a esses professores. Culpa da escola? Nem sempre... Mais do governo em relação á necessidade de reformular grades curriculares e de oferecer cursos de formação para professores e garantir assim, a reciclagem de todo professorado. Um dos principais alicerces para que a inclusão aconteça de forma eficaz é a qualificação do professor, e o presente estudo nos mostrou que ainda faltam informações e orientações aos professores do ensino regular em relação ás estratégias de comunicação a serem utilizadas em salas de aula com surdos, corrobando com os estudos de Gutierrez, Lima, e Machado (2004). Cabe a nós, profissionais, propiciar uma proximidade maior entre fonoaudiólogos e professores de surdos, afim de orientá-los e ajudá-los na tarefa da inclusão. Incluir o aluno surdo requer preparo e dedicação por parte do professorado e escolas.


Conclusão: De acordo com esse estudo verifica-se que os professores de surdo utilizam muitas estratégias de comunicação adequadas, porém ainda necessitam de orientações mais aprofundadas nesse aspecto. 


Referências bibliográficas:

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