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Londrina, 29 a 31 de outubro de 2007 – ISBN 978-85-99643-11-2

ANÁLISE DOS MOTIVOS QUE LEVAM ADULTOS COM LESÃO MEDULAR À PRÁTICA DO BASQUETE
Silvia Regina de Souza (Universidade Estadual de Londrina)
Alice Demony C. P. de Matos (Universidade Estadual de Londrina/FPCEUL)
Thalita Canato (Universidade Estadual de Londrina)
Rosangela M. Busto (Universidade Estadual de Londrina)
Fausto Orsi Medola (Universidade Estadual de Londrina)
Gleice de Souza do Patrocínio (Universidade Norte do Paraná)


RESUMO

Este trabalho teve por objetivo investigar os motivos que levaram portadores de lesão medular à prática do basquete como também os motivos que poderiam contribuir para sua não-adesão a este esporte. Treze praticantes de basquete responderam ao Questionário de Motivação para a Prática Esportiva (SAMULSKI; NOCE, 2000). Entre os motivos citados como mais decisivos para a prática do basquete estão o prazer da prática do esporte, o aprendizado de novos movimentos e técnicas esportivas, o fazer amizades, o aprender a cooperar com outras pessoas e melhorar o desempenho esportivo. Por outro lado, problemas de saúde e lesões esportivas seriam os motivos que mais contribuiriam para o abandono do esporte. Dados de investigações desta natureza poderão auxiliar no desenvolvimento de atividades que aumentam a probabilidade de adesão desta população à prática do esporte.

A atividade física1 é definida como um conjunto de ações que um indivíduo ou grupo de pessoas pratica realizando exercícios que envolvam movimentos corporais e gasto de energia (MONTTI, 1997). É um conjunto de exercícios planejados e estruturados, realizados repetitivamente e que podem conferir benefícios aos seus praticantes, quando bem orientados.
A prática regular de exercícios físicos produz benefícios que se manifestam no organismo em todos os aspectos contribuindo, inclusive, para a prevenção de numerosas doenças crônicas, como, por exemplo, as doenças cardiovasculares (WORMER, 2004). Além disso, pode afetar, de maneira positiva, o desempenho intelectual, a velocidade de reação e o convívio social, como também contribuir para o aumento da auto-estima proporcionando uma melhora significativa da qualidade de vida de seus praticantes (BIBLIOMED, INC.,2005) .

1  Neste trabalho, o termo prática de atividade física será usado para referir-se a situações cujo foco não seja o rendimento esportivo competitivo, embora o esporte seja utilizado como meio para essas atividades

Embora os benefícios da pratica de atividade física sejam muitos, os motivos que levam as pessoas a praticá-la diferem, sendo variados e singulares para cada indivíduo (DUDA, 1989; FINKENBERG; MOODE, 1996; WHITE apud NICHOLAS; PEARCE; PENTONY; PILZ, 2005). Em vista da complexidade do tema, nos últimos anos, numerosos estudos têm procurado descobrir os motivos que levam as pessoas à prática esportiva ou de alguma atividade física. Para Serpa apud Cid (2002), este se constituiu um tema que tem gerado produção científica considerável. O interesse por este tema está associado ao crescente envolvimento dos indivíduos, de todas as idades e sexos, com a prática esportiva ou com alguma forma de atividade física e aos benefícios que este envolvimento pode gerar. Entender os motivos que mais contribuem para a prática de uma atividade física ou esporte ou, ainda, os motivos que levam à interrupção desta prática pode contribuir para o fornecimento de serviços mais adequados e compatíveis com as necessidades de uma determinada população, aumentando a probabilidade de sua adesão a esta atividade.
Entre os estudos realizados nesta área destacam-se os de Rose Junior; Campos e Tribst (2001), Samulski e Noce (2002) e Rasinaho; Hirvensalo; Leinonen; Lintunen e Rantanen (2006).
Rose Junior et al. (2001) realizaram um estudo cujo objetivo era caracterizar os motivos que levam adolescentes a optar pelo basquete como prática desportiva sistemática e competitiva. Participaram 135 jovens brasileiros praticantes de basquete. Os atletas responderam à pergunta “O que te levou a iniciar a prática do basquete?” do Formulário para Identificação de Situações de Stress no Basquete (FISSB). Os resultados obtidos mostram que 41,8% dos atletas relataram que os principais motivos que os levaram a praticar basquete estavam relacionados com aspirações, necessidades cognitivas e emocionais e prazer pela modalidade. Contudo, para 52,8% deles o ambiente social e as pessoas significativas daquele contexto (pais, treinadores, amigos etc.) foram citados como motivos para o início da prática do basquete.
Segundo Cratty apud Cid (2002), as razões pelas quais os indivíduos participam em atividades físicas podem variar, assumindo assim um carácter dinâmico. Outro autor (HORN apud CID, 2002), afirma ainda que os motivos não são imutáveis, podendo alterar-se com o tempo, com novas experiências vividas, com determinados acontecimentos em sua vida e com o contexto socioultural.
Contudo, apesar do grande número de trabalhos produzidos nesta área, não são muitos os estudos que investigaram esta questão com atletas portadores de deficiência. A pratica de um esporte para pessoas deficientes mostra-se importante, pois, quando elas são bem conduzidas, podem contribuir para um estilo de vida mais saudável melhorando a qualidade de vida desta população. Além disso,  a prática de atividade física e/ou esportiva por portadores de algum tipo de deficiência pode proporcionar, além de todos os benefícios da prática regular de atividade física que são mundialmente conhecidos, a oportunidade de testar seus limites e potencialidades, prevenir as enfermidades secundárias à sua deficiência e promover a integração social do indivíduo (MELO; LÓPEZ, 2002).
As atividades físicas, esportivas ou de lazer propostas aos portadores de deficiências físicas como os portadores de seqüelas de poliomielite, lesados medulares, lesados cerebrais, amputados, entre outros, possuem um elevado valor terapêutico. Quanto ao físico, podem-se ressaltar ganhos de agilidade no manejo da cadeira de rodas, de equilíbrio dinâmico ou estático, de força muscular, de coordenação, coordenação motora, dissociação de cinturas, de resistência física, ou seja, o favorecimento de sua readaptação ou adaptação física global (LIANZA, 1985; ROSADAS, 1989 e SOUZA, 1994 apud MELO et al., 2002). Observam-se, ainda, outros benefícios, como a melhora da auto-estima, integração social, redução da agressividade, entre outros (ALENCAR, 1986; SOUZA, 1994).
Entre os estudos conduzidos com pessoas deficientes cabe destacar os trabalhos realizados por Samulski e Noce (2002) e Rasinaho et al. (2006). Rasinaho et al. (2006) realizaram um estudo que teve por objetivo caracterizar os motivos e as barreiras para a prática de atividade física de adultos com limitações, severas ou moderadas, da mobilidade. Participaram do estudo 645 adultos. Eles responderam a um questionário acerca dos motivos e das barreiras para a prática de atividade física e foram posteriormente entrevistados relativamente à sua limitação de mobilidade. O que se verificou foi que aqueles que tinham uma limitação mais severa da mobilidade indicaram como barreiras para a prática de atividade física a falta de saúde, o medo, as experiências negativas, a falta de companhia e a falta de infraestrutura própria. Entre os motivos para a prática de atividade física citam-se a manutenção da doença, a promoção da saúde e as experiências positivas que advêm da pratica de atividade física. Concluíram ainda que estar ciente dos motivos e das barreiras de pessoas, com ou sem limitações de mobilidade, para a prática de atividade física é uma vantagem, já que pode ajudar a planejar um sistema de suporte e de incentivo para esses indivíduos.
Samulski e Noce (2002) realizaram um estudo no qual o objetivo era apresentar e discutir os resultados da preparação psicológica realizada com 64 atletas de oito diferentes esportes (paraolímpicos). Participaram 64 atletas de nove modalidades, nos Centros de Treinamento Paraolímpicos no Rio de Janeiro, São Paulo e Recife. Os atletas responderam a testes de personalidade, testes de motivação, questionário de estresse e testes psicométricos (percepção, concentração e tempo de reação). Os resultados obtidos mostraram que, de forma geral, os motivos referidos como mais importantes para iniciar uma atividade esportiva foram o prazer da prática e a necessidade de reabilitação. A participação em competições e o desejo de superar limites também foram citados como motivos fortes para a prática de um determinado desporto.
Em vista dos benefícios da prática de uma atividade física, do fato de que o aumento na procura por atividade física ou esporte não garante a adesão continuada (SANTOS, KNIJNIK, 2006); dos poucos estudos que exploram esta questão com portadores de deficiência, este trabalho teve por objetivo investigar, por meio do Questionário de Motivação para a Prática Esportiva (SAMULSKI; NOCE, 2000), os motivos que levaram portadores de lesão medular à prática do basquete como também os motivos que poderiam contribuir para sua não-adesão a este esporte.
Os dados desta pesquisa são importantes, pois o conhecimento desses motivos por aqueles que atuam com esta população pode contribuir para o desenvolvimento de atividades que aumentem a probabilidade de adesão destes indivíduos à prática do esporte.

Método

Participantes

Participaram treze praticantes de basquete da cidade de Londrina, paraplégicos por lesão medular ocorrida por acidente automobilístico, mergulho, ferimento por arma de fogo ou traumatismo raquimedular. Os participantes tem entre 18 e 40 anos e a maioria não trabalha.

Material e Instrumentos

Foi aplicado o Questionário de Motivação para a Prática Esportiva de Samulsky e Noce (2000). O questionário é constituído por três partes. Na primeira pede-se aos participantes que indiquem os principais motivos que os levaram a iniciar a prática de esportes. Isto é feito pela proposição “Cite os principais motivos que o levaram a iniciar a prática de esportes”. Na segunda e terceira partes pede-se aos participantes para avaliarem, segundo uma Escala Lickert que vai de 0 a 3, onde zero representa sem importância e 3 decisivo, os motivos que o mantêm “HOJE” praticando esportes e os motivos que poderiam levá-lo a “ABANDONAR” a prática de esportes. Para o preenchimento dos questionários foram fornecidas canetas e lápis.

Procedimento

Após contato com os atletas e explicitação dos objetivos do trabalho, aqueles que aceitaram participar da pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Em seguida os questionários foram distribuídos e foi dada a seguinte instrução:
Estamos fazendo um estudo sobre os motivos que levam as pessoas a praticar atividade física. Para isso gostaríamos de pedir a sua colaboração respondendo a este questionário de motivação. O objetivo é perceber os motivos que os levam a praticar atividade física bem como aqueles que os fariam desistir da mesma”. O questionário tem três partes. Na 1ª têm de descrever os motivos que os levaram a começar/iniciar a atividade. Na 2ª têm de avaliar umas afirmações que descrevem motivos que os mantêm hoje praticando a atividade física. Para isso, usa-se uma escala que vai de 0 – sem importância a 3 – Decisivo. Na 3ª parte pede-se o mesmo, mas as afirmações são relativas a motivos que os levariam a abandonar a atividade física. Não existem respostas certas nem erradas. Têm de responder sincera e concentradamente a todas as perguntas. Não é para colocarem o nome porque é confidencial. Quaisquer dúvidas podem nos perguntar. Muito obrigada por sua colaboração.”

Resultados

A Figura 1 apresenta a média das respostas dadas pelos atletas referentes aos motivos que os mantêm praticando esportes.
Figura 1. Pontuação média dos itens referentes aos motivos que fariam os atletas manterem-se praticando o esporte.

Verifica-se que, com exceção do item retorno financeiro, todos os outros foram avaliados como importantes para os praticantes de basquete. Entre os motivos citados como mais decisivos para a prática do basquete estão o prazer da prática do esporte, o aprender novos movimentos e técnicas esportivas, o fazer amizades, o aprender a cooperar com outras pessoas e o melhorar o desempenho esportivo. Para 62% dos participantes o prazer da prática do esporte foi considerado o fator decisivo para se manterem treinando e apenas 8% deles citaram o retorno financeiro como fator decisivo.
A Figura 2 apresenta a média das respostas dadas pelos atletas referentes aos motivos que os fariam abandonar o esporte. Constata-se que problemas de saúde e lesões esportivas seriam motivos que contribuiriam para o abandono do esporte. Este item foi considerado decisivo para 23% dos participantes. Além destes motivos, conflitos com técnicos e/ou companheiros foi citado como contribuinte para o abandono do esporte.

Figura 2. Pontuação média dos itens referentes aos motivos que fariam os atletas abandonar o esporte.

A falta de talento, por outro lado, foi identificada como um dos motivos de menor influência para o abandono do esporte. Nenhum dos participantes considerou este item decisivo para o abandono da prática esportiva.

Discussão

Verificou-se a partir dos resultados obtidos que são vários os motivos que os mantêm praticando esporte. A média das respostas foi alta para quase todos os itens, contudo, os motivos mais citados foram o prazer da prática do esporte, o aprender novos movimentos e técnicas esportivas, o fazer amizades e o aprender a cooperar com outras pessoas. Estes dados corroboram os de Samulski e Noce (2002), uma vez que naquele estudo os atletas consideraram como principal motivo para a prática do esporte o prazer da prática Além destes motivos, os atletas do estudo de Samulki et al. (2002) citaram ainda o gostar de competir, ter sucesso no esporte e melhorar o desempenho esportivo. Cabe assinalar que os participantes do estudo de Samulski eram atletas paraolímpicos, enquanto os atletas da presente pesquisa são iniciantes na pratica do basquete em cadeiras de rodas. Talvez por este motivo as respostas dos atletas deste estudo tenham citado aspectos relacionados ao convívio social (fazer amizades e aprender a cooperar com outras pessoas) como fator importante para sua adesão aos treinos. Também no estudo de Rose Junior et al. (2001), e o prazer pela modalidade foi um dos motivos citados como responsáveis pela prática do esporte.
Em relação aos motivos que levariam os atletas a abandonar a prática esportiva, os resultados desta pesquisa e da conduzida por Samulski e Noce (2002) mostram que entre os motivos que contribuiriam para o abandono do esporte destacam-se os problemas com saúde/lesões. Ao contrário do citado por Samulski e Noce (2002), a falta de prazer não foi considerada um motivo decisivo pelos atletas deste estudo. Problemas relacionados à saúde-lesões pode ter sido considerado um motivo importante para a desistência da pratica do esporte devido ao fato de uma lesão ou algum problema de saúde complicar o quadro já apresentado pelos atletas, no caso de ambos os estudos, portadores de deficiência.
Referencia Bibliográfica

CID, Luís Filipe. Alteração dos motivos para a prática desportiva das crianças. Revista Digital, Buenos Aires, Año 8, n. 55., dez. 2002. Disponível em: http://www.efdeportes.com/efd55/motiv1.htm. Acessado em: 16/08/2007.
ROSE JUNIOR, Dante de; CAMPOS, Roberto Ramos de; TRIBST, Marcelina. Motivos que llevan a la práctica del Baloncesto: Un estudo com jóvenes atletas Brasilenos. Revista de Psicologia del Deporte.  v. 10, n. 2, p. 293-304. 2001.
MELO, Ana Cláudia Raposo; LÓPEZ, Ramón F. Alonso. O Esporte Adaptado. Revista Digital. Buenos Aires, Ano 8, n. 51, ago. 2002. Disponível em http://www.efdeportes.com/efd51/esporte.htm. Acessado em: 16/08/2007.
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NICHOLAS, Cheronne; PEARCE, Jeni T.; PENTONY, Therese M.; PILZ, Christine K. (2005). Purposes for Participating in Sport: a comparison of gender, age and level of involvement in an Australian setting.  Research conducted during the taught unit ‘Exercise Psychology – HMSC236’ supervised by Dr. Stephen Burke. Disponível em: http://www.geocities.com/CollegePark/5686/su99p8.htm
Acessado em: 16/08/2007
SAMULSKI, Dietmar; NOCE, Franco. Perfil psicológico de atletas paraolímpicos brasileiros. Revista Brasileira de Medicina do Esporte. v. 8, n. 4, jul/Ago. 2002. Disponivel em http://64.233.169.104/search?q=cache:l9BV8jQI I0J:www.scielo.br/pdf/rbme/v8n4/v8n4a05.pdf Acessado em: 16/08/2007.
SANTOS, Susan Cotrim; KNIJNIK, Jorge Dorfman. Motivos de adesão à prática de atividade física na vida Adulta intermediária 1. Revista Mackenzie de Educação Física e Esporte, Barueri, Ano 5, n. 1. 2005.
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