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Londrina, 29 a 31 de outubro de 2007 – ISBN 978-85-99643-11-2
O ENVOLVIMENTO PARENTAL NOS PROGRAMAS DE ESTIMULAÇÃO
PRECOCE
Profª Ms. Ana Flávia Hansel - UNICENTRO
Prof° Dr. Mauro Luís Vieira –UFSC
RESUMO
O objetivo deste estudo é documentar algumas perspectivas teóricas de pesquisas em
estimulação precoce, destacando o envolvimento parental nestes programas, que são
oferecidos em escolas especiais e destinados às crianças na faixa etária dos zero aos três anos
de idade que apresentam, em caráter temporário ou permanente, algum tipo de deficiência
física, sensorial, cognitiva ou múltipla (BRASIL, 1995). Portanto foram traçados neste
trabalho discussões acerca de três elementos básicos que compõem a temática em questão: o
desenvolvimento humano; a criança e sua família e o atendimento da estimulação precoce,
bem como a correlação entre eles.
Buscou-se em algumas produções científicas, destacando a literatura nacional, o suporte
teórico para a realização deste ensaio.
Constatou-se a carência de estudos sobre o tema em questão, bem como a importância de se
discutir e implementar um modelo de atendimento em estimulação precoce centrado na família
como forma de promover o desenvolvimento infantil e efetivar ações de envolvimento
significativo e representativo para a criança e seus cuidadores.
No início do desenvolvimento humano, os bebês apresentam grande dependência em relação
aos adultos. Embora com grande potencial de aprendizagem, não conseguem organizar o
pensamento e efetivar ações de forma autônoma, necessitando assim, de um cuidador que
possa suprir suas necessidades básicas para que consigam sobreviver.
Os adultos, por sua vez, sentem-se envolvidos e pré dispostos a cuidarem e prestarem
assistência aos bebês. Dessa forma, existe uma relação direta entre as crianças pequenas e
seus pais, que motivam-se naturalmente para serem cuidados e cuidarem. Estas necessidades,
tanto dos bebês, quanto dos seus cuidadores dão origem a interação social e, com isso,
firmam-se várias estratégias comportamentais dos pais e dos filhos que originarão a formação
de vínculos afetivos entre eles, o que impulsiona o desenvolvimento infantil.
Nesse sentido,VIEIRA & PRADO (2004) apresentam evidências através da Psicologia do
Desenvolvimento Evolucionista confirmando que o bebê herda certas predisposições
biológicas que serão reguladas pelo meio. Isto quer dizer que a criança já nasce, com algumas
competências sensório perceptivas e motivacionais peculiares, e estas, sustentarão a interação
dela com o meio, ou seja, essa criança espera encontrar em seus cuidadores, possibilidades
de formação de vínculos afetivos e ensinamentos sobre habilidades sociais. (BUSS &
GREILING apud VIEIRA E PRADO, 2004).
Dessa forma, acredita-se que crianças normais que interagem em um ambiente estimulador
tendem a um desenvolvimento também normal, sendo que as mudanças evolutivas que vão
ocorrendo ao longo de suas vidas colaboram para que se constituam como pessoas. Porém,
quando o bebê apresenta algo que possa comprometer sua evolução, é necessário na maioria
das vezes, promover o início do seu desenvolvimento, através de processos específicos em
que a criança e seus cuidadores recebam ajuda, orientação e apoio adequados que permitam
minimizar os efeitos dessa situação especial em suas vidas. Considera-se importante, neste
casos, o encaminhamento deste bebê em situação adversa, ao primeiro programa de natureza
educacional que a Educação Especial oferece, a estimulação precoce.
Inicialmente esta criança é submetida à avaliação de vários profissionais (médicos,
fisioterapeutas, fonoaudiólogos, psicólogos, pedagogos, entre outros) e, conforme o
diagnóstico levantado, ocorre a intervenção com o objetivo de incentivar o desenvolvimento
infantil e minimizar as consequências do comprometimento.
Segundo BOLSANELLO (1998), o atendimento da estimulação precoce no Brasil, é
realizado por cada profissional individualmente, e suas atividades são centradas na criança e
na sua condição especial. Dessa forma, a ênfase do trabalho é dada a tudo aquilo que a
criança deverá alcançar em determinadas áreas do desenvolvimento humano. Este
direcionamento de trabalho em estimulação precoce valoriza a dificuldade da criança,
desprezando na grande maioria, as interações dela com seus familiares e os benefícios destas
interações para o desenvolvimento infantil.
Outro aspecto relevante nestes casos, é que o nascimento de um bebê com deficiência,
desencadeia uma série de sentimentos e reações no comportamento dos pais. Descobrir e
enfrentar tal realidade faz parte de um processo doloroso que pai e mãe terão que enfrentar.
O modelo de atendimento em estimulação precoce centralizado na criança e sua dificuldade
não prevê também, apoio a estes pais, no sentido de auxiliá-los e orientá-los neste momento
tão difícil.
Porém, algumas investigações realizadas por pesquisadores nacionais demostram que com a
valorização e o melhor aproveitamento dos recursos humanos familiares através da
participação e interação, principalmente paterna e materna na intervenção com a criança, o
trabalho se torna mais significativo para todos os envolvidos e traz mais vantagens ao
desenvolvimento do bebê. Portanto, neste modelo as famílias devem passar a constituir
elemento básico no atendimento da estimulação precoce.
Sobre isso OMOTE (2003, p. xvi) afirma que:
...o atendimento a famílias de deficientes deve pautar-se por uma perspectiva dupla: a de prover
condições favoráveis ao desenvolvimento da criança deficiente e a de auxiliar cada familiar a
enfrentar as dificuldades decorrentes da sua condição de ser mãe, pai, irmão ou irmã de uma
criança vista e tratada como desviante. Essas duas razões são solidariamente interdependentes.
Já COLNAGO & BIASOLI-ALVES (2003) descrevem suas pesquisas realizadas com
famílias de bebês com Síndrome de Down e apontam três grandes aspectos que devem ser
considerados num programa de orientação a pais: propor e/ou permitir que as famílias
discutam sobre o estresse emocional vivenciado quando nasce um bebê com a Síndrome,
discutir o desenvolvimento infantil destacando as fases que a criança passa na primeira infância
e discutir informações sobre a Síndrome e suas implicações no desenvolvimento dessa
criança.
ARAÚJO (2004), ressalta que os profissionais devem mostrar sensibilidade para lidar com
situações complexas de pessoas atingidas por determinadas ocorrências como a deficiência, e
que estes atuariam como “consultores” dos familiares, representando assim uma fonte de
suporte de informações e de apoio social à família. Esta, por sua vez, desempenharia o papel
de mediadora do desenvolvimento da criança com deficiência.
DESSEN e SILVA (2004, p. 179) inferem que:
Um programa de intervenção deve envolver o maior número possível de membros familiares,
principalmente porque seus benefícios são extensivos ao modo de organização e funcionamento
familiar, especialmente no que se refere aos recursos psicológicos e à qualidade das interações
entre eles.
Partindo do pressuposto de que a família é o primeiro grupo ao qual a criança pertence,
concorda-se com as autoras, no sentido de envolver os membros deste grupo no trabalho da
estimulação precoce, pois são eles que diretamente irão oferecer estímulos ambientais ao
bebê, são eles que passarão a maior parte do tempo com o recém nascido, são eles que
estarão interagindo emocionalmente entre si e com esta criança, são eles que conhecerão as
respostas do bebê frente a variadas situações, são eles que observarão as dificuldades e ao
mesmo tempo as conquistas dos pequenos e são eles que diariamente construirão suas
histórias de vida.
As mesmas autoras citadas anteriormente também fazem algumas reflexões sobre as
tendências atuais para os programas de intervenção em Educação Especial, destacando
àqueles cujo envolvimento e inclusão familiar, tornam o trabalho mais eficaz. Inferem o que
ZAMBERLAN e BIASOLI-ALVES (1996) afirmam:
...um programa de intervenção precoce, por exemplo, para ser bem sucedido, deveria incluir todos
os cuidadores da criança, uma vez que estes estão constantemente proporcionando cuidados à
criança e, portanto, devem ter um espaço privilegiado no planejamento de qualquer intervenção.
Já ALCAZÁR, BARREIRO, CARVALHEIRA et al. (2001, p.42) também comentam suas
experiências de trabalho, no Centro de Estimulação Precoce da Sociedade Pestalozzi do
Estado do Rio de Janeiro, afirmando que “...ao direcionarmos nossas ações às famílias,
estamos procurando criar um espaço onde estas possam verbalizar seus sentimentos, trocar
experiências, receber orientações e o apoio que tanto necessitam para minimizarem e/ou
superarem as suas dificuldades.”
As mesmas autoras ainda evidenciam suas percepções em relação a angústia de uma mulher e
de um homem que, ao se tornarem pais de um bebê com dificuldades no seu
desenvolvimento, não reconhecem o filho idealizado. Neste caso, o trabalho da equipe ou do
profissional de estimulação precoce é fundamental no sentido de: “...reinserir esta criança no
lugar de desejo dos pais, no lugar de investimento. Torna-se, assim, primordial o resgate do
vínculo entre pais e filhos, para que, de fato, este bebê assuma seu lugar nesta família.”
(ALCAZÁR, BARREIRO, CARVALHEIRA 2001, p. 41)
HANSEL (2004, p. 96) evidencia a importância do envolvimento familiar nos programas de
estimulação precoce, com destaque a figura paterna. A autora cita que:
...vale ressaltar que o pai por todas as variáveis próprias da paternidade e pelas características do
gênero, apresenta comportamentos diferenciados dos da mãe que também acabam constituindo
fonte enriquecedora ao trabalho da estimulação precoce. As atividades, os jogos, as brincadeiras,
a expressão, a motivação, os desafios e outras características inerentes do pai, são fatores que
contribuem de forma ativa para o aproveitamento do potencial do bebê.
Concorda-se com esta prática de atendimento em estimulação precoce, pois o
trabalho com os integrantes de uma família onde nasce um bebê com deficiência, se torna
indispensável, uma vez que, os sentimentos familiares em relação à nova situação que se
apresenta estão confusos e necessitando de momentos e espaços de escuta para que a
interação com o novo membro ocorra de forma efetiva.
Com relação às questões legais, a Educação Especial, assim como a educação regular, está
amparada pela lei número 9.394 de 1996, que estabelece as Diretrizes e Bases de toda
Educação Brasileira. Neste sentido, a Educação Especial como modalidade de educação
escolar, deve se organizar na tentativa de adaptar-se às exigências pedagógicas e político-filosóficas da educação nacional. Outro documento importante que vislumbra a organização
educacional em nosso país, especificamente na área da Educação Especial, são os
Parâmetros Curriculares Nacionais: Adaptações Curriculares – Estratégias para a Educação
de Alunos com Necessidades Educacionais Especiais (1999), que deixa claro que às
adaptações no currículo destes alunos deve considerar o contexto familiar e que a execução
de qualquer programa pedagógico deve contar com a participação e o apoio do grupo
familiar.
Analisando os benefícios que o envolvimento dos pais traria para a estimulação precoce,
como primeiro programa educacional inserido na Educação Especial, percebemos que,
embora os documentos não deixem claro como seria este serviço conjunto com as famílias, já
houve pequenos avanços no sentido de apontar a importância da atuação familiar no
desenvolvimento dos filhos e de perceber que os pais podem se tornar elementos
competentes e facilitadores do desenvolvimento do bebê com deficiência.
Observando todos estes movimentos e pesquisas relacionadas a inclusão da família, como
apoio e base para o desenvolvimento humano, reforça-se, mais uma vez que, o atendimento
da estimulação precoce, se voltado à família, e não visualizando somente a dificuldade da
criança, deverá possibilitar ao bebê uma construção mais efetiva de suas aprendizagens nos
seus vários aspectos, entre eles, o afetivo, o cognitivo e o social.
Neste contexto podemos afirmar que a participação dos pais na estimulação precoce poderia
ocasionar benefícios não só ao desenvolvimento do bebê, mas também aos próprios genitores
que teriam um espaço para construção das experiências junto à criança, desenvolvendo assim
suas competências paternas e maternas.
A literatura internacional aponta as recentes pesquisas realizadas na área neurológica e trazem
o conhecimento de que o cérebro infantil recebe várias influências relacionadas aos contatos e
ligações que vão se estabelecendo entre o bebê e um cuidador carinhoso, às condições e a
estimulação que a criança recebe do meio em que vive e a toda interação que ocorre entre
indivíduo e meio, desde o período pré natal. Tudo isso impulsiona uma produção de ligações
nervosas (sinapses), ativando assim as células do cérebro (neurônios) das crianças.(SHORE,
2000). A mesma autora ainda salienta que: “É por isso que a experiência inicial é tão
importante: aquelas sinapses que tinham sido reforçadas pela experiência repetida tendem a se
tornar permanentes; e as que não foram usadas constantemente, nos anos iniciais, tendem a
ser eliminada.” (p. 10).
De acordo com estes apontamentos, podemos concluir que a relação entre a estimulação que
o bebê recebe principalmente nos três primeiros anos de vida e o seu desenvolvimento
cerebral, mostra que o trabalho com criança pequena que apresentam alguma deficiência é de
extrema importância e decisivo para o seu desenvolvimento global , visto que o impacto das
atividades estimuladoras parece interferir positivamente em suas vidas.
Conforme indica este ensaio teórico, evidencia-se que existe uma relação direta entre os
cuidados e o envolvimento parental com o desenvolvimento das crianças, e que esta
interdependência, interferirá de forma significativa nas mudanças relacionadas à evolução
infantil.
Destaca-se que o período inicial do desenvolvimento do ser humano é bastante complexo e
não pode ser interpretado apenas como um momento de propiciar estímulos ambientais ao
bebê, mas também de referenciar as características deste bebê em responder a estes
estímulos, pois isso faz parte da história da evolução humana.
Tratando-se de crianças com deficiência, enfatiza-se que cada uma responderá aos estímulos
do meio e os assimilará conforme sua condição e suas peculiaridades.
As concepções familiares sobre este bebê, são necessárias para construção do conhecimento
acerca do desenvolvimento destas crianças. Da mesma forma, o exercício da paternidade e
maternidade apresentam marcas específicas e particulares que necessitam ser respeitadas e
valorizadas pelo serviço de apoio ao desenvolvimento destas crianças, a estimulação precoce,
objetivando assim a evolução e otimização do potencial infantil, nesta fase tão importante que
é o início da vida.
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