http://www.psiquiatriainfantil.com.br/congressos/uel2007/160.htm |
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Londrina, 29 a 31 de outubro de 2007 – ISBN 978-85-99643-11-2
CLASSE HOSPITALAR: PREVENÇÃO, ENFRENTAMENTO E ADESÃO AO
TRATAMENTO EM CRIANÇAS COM CÂNCER.
Renatha El Rafihi Ferreira;
Silvia Aparecida Fornazari
Universidade Paulista – UNIP – Assis/SP.
RESUMO
O tratamento do câncer e a hospitalização acarretam diversos estressores na vida do paciente
infantil, de forma que estes estressores podem comprometer o desenvolvimento físico, intelectual e
emocional dessas crianças. A possibilidade de utilizar a classe hospitalar, enquanto modalidade de
atendimento em Educação Especial, como um ambiente facilitador considerando prevenção,
enfrentamento e adesão ao tratamento em crianças com câncer foi o objetivo deste estudo. Trata-se
de uma pesquisa bibliográfica sobre o tema apontado, considerando também um estudo que teve
por objetivo compreender as relações entre comportamento e câncer, especialmente, as
contingências recorrentes na história de vida de pacientes oncológicos, que possam contribuir para o
desenvolvimento ou adesão ao tratamento. Os resultados apontam para a necessidade de se
considerar a relação que permeia a hospitalização infantil e refletir sobre a possibilidade de
estratégias que visem uma contribuição para o tratamento oncológico em crianças, tendo a classe
hospitalar como recurso para promoção de aspectos como prevenção, enfrentamento e adesão ao
tratamento.
INTRODUÇÃO
No Brasil, as modalidades de atendimento em Educação Especial são: escola especial, sala de
estimulação essencial, classe especial, oficina pedagógica, classe comum, sala de recursos, ensino
com professor itinerante, classe hospitalar, atendimento domiciliar e centro integrado de Educação
Especial (SEESP/MEC, 1994).
A legislação brasileira reconhece o direito de crianças e jovens hospitalizados ao atendimento
pedagógico-educacional. A Declaração dos Direitos da Criança e do Adolescente Hospitalizados
decorreu de formulação da Sociedade Brasileira de Pediatria e da Resolução do Conselho Nacional
dos Direitos da Criança e do Adolescente, com a chancela do Ministério da Justiça em 1995. Essa
modalidade de atendimento denomina-se classe hospitalar, prevista pelo Ministério da Educação e
do Desporto em 1994, por meio da publicação da Política Nacional de Educação Especial
(MEC/SEESP, 1994).
O tratamento do câncer infantil configura-se em uma experiência traumática. A hospitalização, o
tratamento prolongado, o tempo considerável de hospitalização, os procedimentos invasivos e
desagradáveis, o afastamento da criança do seu ambiente familiar, o confronto com a dor, a
limitação física e o medo da morte são aspectos presentes neste processo que merecem notável
atenção, pois representam estressores importantes que estão presentes no tratamento do câncer
infantil. Para enfrentar essas novas situações, a criança necessita utilizar estratégias em busca de
adaptação. (MOTTA E ENUMO, 2004). A classe hospitalar pode descrever um importante papel
nesta questão.
Além dos aspectos prejudiciais da própria doença, as condições da hospitalização podem
comprometer a criança de forma a afetar sua totalidade no que diz respeito aos seus aspectos
físicos, intelectuais e emocionais. (PEDROSA; MONTEIRO; LINS; PEDROSA; MELO, 2007).
Autores como Chaves (1976), Samudzhen (1954), Turkevich (1955), Friedman (1969) e outros
citados por Chiattone (1992) acreditam na relação do estresse como fator importante no
desenvolvimento e/ou agravamento da neoplasia. As situações de estresse crônico determinam
efeitos que interferem em mecanismos fisiológicos, tendo os estados emocionais uma contribuição
para o surgimento e evolução de tumores.
Segundo Nunes (1998), citado por Nunes (2003), o estresse e a depressão vem sendo pesquisados
pela Psicoimunologia como fatores influentes na saúde e no desencadeamento e agravamento de
doenças auto-imunes, infecciosas e neoplásicas.
Lê Shan (1992), Simonton, Simonton e Creighton (1987) e outros estudiosos do assunto, que
relacionam o câncer com aspectos psicológicos, verificaram o enfraquecimento do sistema
imunológico provocado por estresse e depressão, como fatores a contribuir no desenvolvimento da
formação do tumor. (CARVALHO, 2002).
Muitos pesquisadores ressaltam a importância de intervenções psicossociais que minimizem o medo,
a angústia e a ansiedade, tanto das crianças quanto dos familiares e profissionais de saúde frente aos
procedimentos invasivos. (MOTTA E ENUMO, 2004).
Estudando o desenvolvimento psicológico da criança, Zannon (1991) discute
aspectos da intervenção comportamental no ambiente hospitalar em nosso país, com
destaque para a despersonalização (grifo da autora) dos pacientes, decorrente da
cultura hospitalar, que pode ser caracterizada pelo reforçamento (recompensa) de
comportamentos deprimidos. Dessa forma, parece inevitável encontrar no hospital
crianças com depressão. É fundamental, portanto, criar mecanismos para promover
um ambiente que não reforce esses comportamentos e ajude a criança a enfrentar as
dificuldades da hospitalização e da doença. (MOTTA E ENUMO, 2004, p.03).
Segundo Pedrosa et al (2007) o progresso científico no setor de oncologia infanto-juvenil vem
aumentando o índice de cura e sobrevida em crianças acometidas pelo câncer.
Nessa perspectiva, considerando a necessidade de uma atenção especial a esses estressores que
configuram o contexto hospitalar infantil e considerando a influência de contingências de vida no
agravamento da neoplasia, o presente trabalho analisa a possibilidade do desenvolvimento de uma
educação especial que preocupe-se em atender essas contingências de forma a minimizar e/ou
modificar seus comportamentos de risco. Considera-se que a possibilidade de obter resultados
favoráveis em crianças poderia ser facilitada, pois estas ainda não possuem comportamentos
cristalizados. Utilizar a classe hospitalar como um espaço que possibilite, além da transmissão de
conteúdos pedagógicos, um ambiente reforçador, que viabilize a apreensão de aspectos que
contribuam para a prevenção, enfrentamento e adesão ao tratamento em crianças com câncer pode
facilitar o tratamento e contribuir para a saúde e qualidade de vida.
MÉTODO
Foi realizado um levantamento bibliográfico através do site www.bvs-psi.org.br, considerando o
assunto aqui tratado. A Tabela 1 revela as palavras-chave e os artigos selecionados para o estudo
apresentado.
Os artigos encontrados foram correlacionados com uma pesquisa realizada pelas autoras
(FERREIRA e FORNAZARI, 2007), que teve como participantes dez pacientes oncológicos, de
duas instituições especializadas, com idades de 35 a 55 anos, de nível socioeconômico
diversificado. A coleta de dados deu-se através de entrevistas, realizadas com base em um roteiro
preestabelecido e gravadas. A análise dos dados considerou, entre outros objetivos, o conteúdo do
relato verbal com relação às contingências recorrentes na história de reforço e punição desses
participantes.
Tabela 1 – Descrição do título, autores, palavras-chave e assuntos dos artigos selecionados para a
presente análise.
Título do artigo
|
Autores e ano
|
Palavras-chave
|
Assunto
|
A Situação Brasileira do
Atendimento
Pedagógico-Educacional
Hospitalar
A escuta pedagógica à
criança hospitalizada:
discutindo o papel da
educação no hospital
|
Fonseca / 1999
Fontes / 2005
|
Hospital / Educação
Especial
Pedagogia hospitalar
|
Classe hospitalar como
modalidade
atendimento em
Educação Especial.
|
A mãe, seu filho
hospitalizado e o brincar:
um relato de experiência
Brincar no hospital:
estratégia de
enfrentamento da
hospitalização infantil
Câncer infantil: uma
proposta de avaliação
das estratégias de
enfrentamento da
hospitalização
A promoção do brincar
no contexto da
hospitalização infantil
como ação de saúde
|
Junqueira / 2003
Motta e Enumo / 2004
Motta e Enumo / 2004
Mitre e Gomes / 2004
|
Hospitalização infantil
Hospitalização /
Câncer Infantil
Hospitalização /
Câncer Infantil
Criança hospitalizada/
Promoção da saúde
|
Estressores
acarretados pela
hospitalização que
podem comprometer o
desenvolvimento
infantil.
.
|
RESULTADOS
Classe hospitalar como modalidade de atendimento em Educação Especial.
Os resultados demonstram uma preocupação com o atraso escolar em crianças que permaneciam
hospitalizadas durante um período de suas vidas. (FONTES, 2005). Nesse estágio de vida estas
crianças desenvolvem estratégias para viverem individualmente como também na coletividade, sendo
fundamental para seu desenvolvimento cognitivo e psíquico, programas que atendam não só as
necessidades do âmbito da saúde, como também as necessidades pedagógicas – educacionais.
(FONSECA, 1999).
No entanto, é preciso deixar claro que tanto a educação não é elemento exclusivo da
escola quanto a saúde não é elemento exclusivo do hospital. O hospital é, inclusive,
segundo definição do Ministério da Saúde, um centro de educação. (FONTES, 2005,
p.02).
A educação pode influenciar de forma positiva na saúde da criança hospitalizada de forma a
proporcionar uma escuta pedagógica atendendo as demandas afetivas, físicas, sociais e cognitivas
da criança. (FONTES, 2005).
Há uma necessidade em melhor conhecer essas relações entre hospitalização e políticas
pedagógicos – educacionais, para que os profissionais elaborem propostas mais efetivas para
repercutir de forma positiva na saúde e educação de crianças e adolescentes. (FONSECA, 1999).
Estressores acarretados pela hospitalização que podem comprometer o desenvolvimento
infantil.
Os resultados do levantamento bibliográfico demonstram alguns aspectos que norteiam a situação
de hospitalização em crianças com câncer, destacando-se neste presente estudo os estressores que
envolvem este contexto.
Méndez, Ortigosa e Pedroche (1996) citados por Motta e Enumo (2004) identificam na
hospitalização infantil importantes estressores, como: o ambiente hospitalar; a doença; a dor; a
exposição a procedimentos médicos invasivos; a separação dos pais; o stress dos acompanhantes;
a perda da autonomia, controle e competência pessoal; a incerteza sobre a conduta mais
apropriada; a ruptura da rotina de vida e adaptação a uma nova rotina imposta e desconhecida; e a
morte.
Tais estressores se intensificam devido ao tempo prolongado do tratamento. Mitre e Gomes (2004)
apontam para o impacto que a hospitalização causa na criança, referindo-se ao afastamento da
criança de sua vida cotidiana, do ambiente familiar, o confronto com a dor, a passividade e a
limitação física, o que aflora sentimentos de culpa, punição e medo da morte.
Ajuriaguerra (1973) citado por Junqueira (2003) revela que a hospitalização leva a criança a
experimentar sua fragilidade corporal devido ao adoecimento e vivenciar um estado de desamparo,
promovendo reações como: estados depressivos, regressões, fobias e transtornos de
comportamento em geral.
O câncer, por ser uma doença crônica, também expõe a criança e seus familiares a
outras situações estressantes, que se somam à possibilidade de internação. De
acordo com Eiser (1992), a criança com doença crônica, que necessita de visitas
regulares ao hospital, pode encontrar dificuldades e obstáculos na sua vida social e
familiar, como, por exemplo, a restrição do convívio social, ausências escolares
freqüentes e aumento da angústia e tensão familiares. Acrescenta-se a esse quadro a
necessidade de se adaptar aos novos horários, confiar em pessoas até então
desconhecidas, receber injeções e outros tipos de medicação, ter que permanecer em
um quarto, ser privada de atividades de brincar - situações estas que não faziam parte
da vida da criança e que caracterizam uma hospitalização. (MOTTA E ENUMO, 2004,
p.02).
Comportamento e suas relações com o câncer
Os resultados da pesquisa concluída que investigou
a influência de comportamentos sobre o câncer,
considerando causa e agravamento da doença, apontou para a existência de contingências
recorrentes e comportamentos de pensar e sentir na história de reforço e punição dos participantes.
Contingências como: ambiente constituído por relações conflituosas; preocupação e doação aos
outros em detrimento de si mesmo; situações e/ou vivências marcadas por estresse, dificuldades e
tristeza; sentimento de fracasso ou inferioridade; cobranças; dificuldades de expressar sentimentos e
pensamentos; comportamento autoritário e/ou rígido; ensegurança e/ou medo; excesso de tarefas e
responsabilidades; nervosismo, ansiedade e estresse; abandono de desejos ou não prioridade de
desejos e necessidades; e conformismo. A análise de contingências investigou as várias situações de
vida que o indivíduo passou antes e/ou durante a neoplasia e que possam ser significativas no
desencadeamento/ agravamento desta. As contingências recorrentes levantadas através dos relatos
dos dez participantes (Figura 1) mostram o quanto os fatores psicossociais influenciam na vida dos
entrevistados.
Figura 1 – Porcentagem de Contingências Recorrentes analisadas a partir dos relatos verbais dos
participantes.
Considerando os dados apontados por Ferreira e Fornazari (2007), cabe apontar que tais
contingências recorrentes presentes na vida de pacientes oncológicos podem contribuir para o
desenvolvimento ou agravamento da doença. Deste modo torna-se imprescindível, no trabalho com
crianças com câncer, criar contingências positivas, onde a criança possa desenvolver
comportamentos favoráveis ao enfrentamento e tratamento de sua doença, afastando-a de
contingências negativas como as expostas no estudo.
DISCUSSÃO
Através dos resultados obtidos pelo levantamento bibliográfico e pela pesquisa existente, pode-se
considerar a relação que permeia a hospitalização infantil e refletir sobre a possibilidade de
estratégias que visem uma contribuição para o tratamento oncológico em crianças, tendo a classe
hospitalar como recurso para promoção de aspectos como prevenção, enfrentamento e adesão ao
tratamento.
O contexto hospitalar muitas vezes promove o estresse e a depressão nas crianças que passam por
essa situação. Considerando a influência dessas contingências sobre a causa/agravamento do
câncer, a depressão e o estresse fazem parte de contingências de risco. O desenvolvimento de
possibilidades de intervenção a partir da educação especial, considerando a modalidade de
atendimento classe hospitalar, para pacientes oncológicos infantis que utilize estratégias para
modificar e/ou minimizar comportamentos que estejam associados a contingências de risco é
importante. As contingências presentes no ambiente da criança, considerando as questões expostas
pode influir de forma positiva no tratamento desses pacientes de maneira, possibilitando uma melhor
qualidade de vida, ajudando também na adesão ao tratamento e no enfrentamento da doença.
É relevante destacar que por se tratar de crianças, o repertório comportamental ainda não está
cristalizado considerando a sua história de reforço e punição, o que tende a contribuir no
desenvolvimento e efetividade das possibilidade expostas neste trabalho.
A continuidade deste estudo prevê uma aplicação prática para testar as hipóteses levantadas neste
trabalho.
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