http://www.psiquiatriainfantil.com.br/congressos/uel2007/168.htm |
|
Londrina, 29 a 31 de outubro de 2007 – ISBN 978-85-99643-11-2
PESQUISAS COM ABORDAGEM ETNOGRÁFICA SOBRE A INCLUSÃO DE
PESSOAS COM NECESSIDADES EDUCACIONAIS ESPECIAIS
NO ENSINO REGULAR
Márcia Denise Pletsch
Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do
Rio de Janeiro – UERJ
Rejane de S. Fontes
Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do
Rio de Janeiro – UERJ
Rosana Glat
Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do
Rio de Janeiro – UERJ
RESUMO
A inclusão de pessoas com necessidades educacionais especiais em classes comuns da rede
regular de ensino tem assumido uma posição importante nos debates educacionais nacionais e
internacionais. No entanto, nosso sistema educacional enfrenta, ainda, grandes entraves para a
sua implementação efetiva. Dentre estes destacamos, o número excessivo de alunos nas salas
de aula, padrões rígidos e uniformes de avaliação, ausência de adaptações curriculares para
atender os alunos com necessidades educacionais especiais, a precária acessibilidade física de
muitas escolas, inadequação da formação de professores, bem como a freqüente
descontinuidade de programas (mesmo quando bem sucedidos), em função de mudanças de
Governo. Também são significativas as dificuldades decorrentes de barreiras atitudinais, como
o preconceito e a estigmatização. Merece destaque também a falta de pesquisas de campo
que avaliem, sob diferentes enfoques metodológicos, as reais condições das inúmeras
experiências em curso, mais ou menos bem sucedidas, de inclusão que são oferecidas nas
escolas. Partindo do exposto, o objetivo deste ensaio teórico é refletir, a partir dos dados de
cinco recentes investigações sobre inclusão escolar realizadas no Programa de Pós-Graduação em Educação da UERJ (PROPEd/UERJ), sobre o uso da abordagem etnográfica
e os seus procedimentos de coleta dos dados em pesquisas sobre o cotidiano das escolas no
contexto da política de Educação Inclusiva.
Introdução
Nos últimos quinze anos a política de inserção de pessoas com necessidades educacionais
especiais em rede regular de ensino, vem ganhando espaço nos debates educacionais
brasileiros. No entanto, nosso sistema educacional enfrenta, ainda, grandes entraves para a
sua implementação efetiva. Dentre estes destacamos, o número excessivo de alunos nas salas
de aula, padrões rígidos e uniformes de avaliação, ausência de adaptações curriculares para
atender os alunos com necessidades educacionais especiais, a precária acessibilidade física de
muitas escolas, inadequação da formação de professores, bem como a freqüente
descontinuidade de programas (mesmo quando bem sucedidos), em função de mudanças de
Governo. Também são significativas as dificuldades decorrentes de barreiras atitudinais, como
o preconceito e a estigmatização. Merece destaque também a falta de pesquisas de campo
que avaliem, sob diferentes enfoques metodológicos, as reais condições das inúmeras
experiências em curso, mais ou menos bem sucedidas, de inclusão que são oferecidas nas
escolas (GLAT & PLETSCH, 2004).
Partindo do exposto, nosso objetivo é refletir sobre o uso da abordagem etnográfica e os seus
procedimentos de coleta dos dados em pesquisas sobre o cotidiano das escolas no contexto
da política de Educação Inclusiva. Para tal o texto foi organizado em duas partes. A primeira
trata da pesquisa do tipo etnográfico e sua aplicabilidade em estudos educacionais, bem como
dos procedimentos adotados para a coleta dos dados neste tipo de pesquisa. A segunda
parte apresenta, de forma sucinta, como caráter ilustrativo, os dados de cinco recentes
investigações sobre inclusão escolar realizadas no Programa de Pós-Graduação em Educação
da UERJ (PROPEd/UERJ). Ao final, são apresentadas as conclusões gerais e algumas
perspectivas a respeito dos limites e das possibilidades desta abordagem de pesquisa sobre a
política de Educação Inclusiva.
1- Breve caracterização da abordagem etnográfica em pesquisas educacionais
A pesquisa etnográfica é também conhecida como pesquisa social, pesquisa interpretativa ou
pesquisa analítica, sendo que a sua maior preocupação é a prática descritiva, densa e
interpretativa das ações e relações dos atores sociais pertencentes ao grupo investigado
(GEERTZ, 1989; ALVES, 2003; PLETSCH & GLAT, 2007). Assim, numa pesquisa
etnográfica, o papel do pesquisador torna-se central, uma vez que ele passa a ser a principal
fonte de interpretação dos dados.
A etnografia caracteriza-se essencialmente pela observação sistemática das situações no
espaço onde os eventos acontecem, possibilitando ao pesquisador uma revisão teórica e
metodológica contínua diante das informações coletadas, desenvolvendo novas questões ou
hipóteses de investigação. Esse método comporta o uso de técnicas diferenciadas, como a
observação participante, a realização de entrevistas, análise de documentos e filmagem em
áudio (microanálise), a fotografia e produções do próprio grupo pesquisado, o que permite ao
pesquisador uma análise mais profunda da realidade investigada (PLETSCH & GLAT, 2007;
FONTES, 2007). Por essas características, o uso desse método tem se mostrado
extremamente profícuo para os estudos que investigam a inclusão de alunos com necessidades
educacionais especiais no contexto do ensino regular, tanto no que tange às relações entre os
diversos atores envolvidos no processo, quanto na compreensão do significado que os
mesmos dão as suas ações.
Mattos (2001) adverte que em pesquisas sobre o cotidiano escolar, deve-se levar em
consideração a subjetividade e as singularidades individuais sempre de maneira relacional, isto
é, a partir da interação entre o pesquisador e uma coletividade, uma cultura, um dado
contexto social. As ações humanas são vistas como um texto em cuja leitura o etnógrafo
busca o que Monteiro (1998) denomina de insights interpretativos da realidade observada.
Para tal, as percepções dos informantes acerca da realidade que os cerca se constituem em
relevantes eixos de análise da pesquisa, juntamente com as questões colocadas pela
observação in loco.
A etnografia é, portanto, um instrumento de grande aplicabilidade para a realização de
estudos focados em grupos socialmente excluídos ou estigmatizados, especialmente, por
buscar entender do ponto de vista de tais grupos como produzem e compreendem esta
realidade. Os estudos etnográficos também contribuem de maneira significativa para a
validação científica de práticas e estratégias de desmitificação de preconceitos em relação a
sujeitos marginalizados, como é o caso de pessoas com necessidades educacionais especiais
(MELO, 2004; PLETSCH, 2005; MACHADO, 2005; DIAS, 2006; SUPLINO, 2007;
FONTES, 2007). Além disso, ao proporcionar uma compreensão mais refinada da realidade
“local” em relação ao contexto mais abrangente, permite apontar caminhos para possíveis
intervenções.
Ainda nesta direção, Lüdke e André (1986), utilizando-se dos estudos de Wolcott (1975),
discutem alguns critérios para o uso da abordagem etnográfica em pesquisas de cunho
educacional. Em primeiro lugar, o problema, embora já formulado como uma problemática é
redescoberto em campo, uma vez que o etnógrafo deve evitar uma definição rígida de
hipóteses anterior à entrada em campo, mas sim, questões norteadoras. Este tipo de
movimento na pesquisa é chamado de hipóteses progressivas, “pois a cada momento de
reflexividade sobre o trabalho, modifica-se o caminhar e cria-se um movimento próprio aos
dados e como eles refletem as nossas questões” (MATTOS, 2001, p. 53). Este traço aponta
para uma característica essencial da etnografia que é a de possuir uma estratégia de pesquisa
aberta, ou seja, seu rigor metodológico deve permitir a revisão de suas perguntas iniciais,
reformulando-as em parte ou substituindo-as totalmente, à luz das conclusões que o
pesquisador vai construindo a partir de sua entrada em campo. Em segundo lugar, a
abordagem etnográfica combina diferentes métodos de coleta, nos quais se destacam a
observação direta das atividades grupais e as entrevistas com os informantes do grupo.
A seguir são apresentadas, de forma breve, algumas pesquisas que utilizaram a metodologia
qualitativa com abordagem etnográfica, tendo como objeto de investigação a inclusão de
alunos com necessidades educacionais especiais no ensino regular, sob diferentes aspectos.
2 –A abordagem etnográfica e as pesquisas sobre Educação Inclusiva
Inicialmente apresentamos a pesquisa desenvolvida por Pletsch (2005) que, além da
observação participante, realizou micro-análise de contexto e entrevistas abertas e semi-estruturadas, para conhecer e analisar o papel e atribuições cotidianas de duas professoras
itinerantes da Rede Pública Municipal de Educação do Rio de Janeiro. O itinerante é um
professor especialista em Educação Especial que dá suporte a escolas e seus professores que
têm alunos com necessidades educacionais especiais incluídos em classes regulares. Este
apoio é oferecido ao educando, em grupo ou individualmente, de acordo com as
necessidades específicas de cada caso e, se necessário for, o referido professor pode ainda
trabalhar com o aluno em horário distinto do tempo de aula.
Esta pesquisa evidenciou que o trabalho do professor itinerante constitui um instrumento
favorável para a viabilização da inclusão de pessoas com necessidades especiais, pois estes
profissionais podem atuar como agentes de mediação, sensibilização e mobilização pró-inclusão junto ao conjunto de personagens — diretores, coordenadores pedagógicos,
professores regulares e demais funcionários — responsáveis pela dinâmica cotidiana das
escolas. Seu trabalho, portanto, não se limita à questão pedagógica stricto sensu, mas
envolve a esfera da cultura e dos valores constitutivos das relações intra-escolares e da escola
com a comunidade em seu entorno (PLETSCH, 2005).
No entanto, apesar das evidências a respeito da viabilidade e da potencialidade do ensino
itinerante, ficou claro na fala das professoras que não basta incluir os alunos especiais em
classes regulares com o suporte itinerante. É necessário mudar concepções preconceituosas a
respeito do que seja Educação Inclusiva, bem como possibilitar aos professores regulares
conhecimentos sobre essa proposta, já que a maioria não se sente preparada para receber
estes alunos. Essa situação, de certa forma, reforça a idéia do ensino itinerante como agente
de “internalização” nas escolas da política de inclusão de pessoas com necessidades
educacionais especiais.
A inclusão educacional de alunos com necessidades especiais no ensino regular também foi
objeto de estudo de Machado (2005). Sua pesquisa buscou identificar os benefícios e as
dificuldades referentes à implementação desta proposta educacional para a comunidade
escolar como um todo.
O uso da abordagem etnográfica possibilitou à pesquisadora confrontar falas e ações, a partir
da observação e entrevistas semi-estruturadas no cotidiano de uma escola do Ensino
Fundamental da Rede Pública Municipal do Rio de Janeiro, tendo como foco uma turma do
1º Ciclo de Formação (equivalente à 1ª Série), composta de 26 alunos. Nesta turma havia
uma menina de oito anos com paralisia cerebral, usuária de cadeira de rodas e que
apresentava uma defasagem idade-série de, aproximadamente, dois anos.
Os dados obtidos revelaram a complexidade deste tema, evidenciando,
entre outros aspectos,
a falta de materiais pedagógicos e de profissionais devidamente qualificados para atender às
necessidades educacionais da aluna com paralisia cerebral, pouco conhecimento das
professoras e a ausência de estrutura física adaptada na escola. Apesar da proposta de
inclusão ser bem vista pelas educadoras, destacou-se que sua implementação, na prática,
ainda era precária. Essa pesquisa contribui para a reflexão acerca da prática educacional
inclusiva, apontando alguns caminhos a serem trilhados, tais como a necessidade da realização
de adaptações pedagógicas e de acesso ao currículo, bem como, da formação continuada
dos educadores do ensino regular, para receber alunos com necessidades educacionais
especiais.
A pesquisa desenvolvida por Dias (2006), também analisou o processo de inclusão no
cotidiano escolar, sendo o sujeito uma criança surda inserida em classe regular numa escola
da rede privada do Rio de Janeiro. Participaram do estudo, além da mãe da aluna surda, as
duas professoras responsáveis por ela e a equipe docente e administrativa da escola. Dias
utilizou-se da observação do campo, entrevistas semi-estruturadas e questionários para
conhecer e avaliar os aspectos dificultadores e facilitadores sugeridos pelos sujeitos
participantes da investigação no que se refere à inclusão de uma criança surda.
Como nas demais pesquisas, também foram identificadas uma série de dificuldades para a
efetiva inclusão da aluna, dentre as quais Dias destacou a preocupação e apreensão das
professoras com o futuro acadêmico da aluna surda e a ausência de comunicação por meio da
Língua Brasielira de Sinais (LIBRAS). Os dados ainda evidenciaram a ambiguidade referente
ao entendimento do conceito de Educação Inclusiva. É como se o mesmo se referisse apenas
aos alunos com deficiência e não para todas as crianças que estão na escola com alguma
necessidade educacional temporária ou permanente.
A inclusão escolar de alunos com autismo foi o objeto de reflexão da pesquisa de doutorado
desenvolvida por Suplino (2007). Para o desenvolvimento da pesquisa foram eleitas duas
escolas particulares de Educação Infantil localizadas no município do Rio de Janeiro. O
estudo, de cunho etnográfico, buscou retratar e analisar as salas de aula, visando
compreender as relações estabelecidas no seu interior. Os dados registrados em vídeo
permitiram à pesquisadora uma microanálise das diferentes situações que os alunos com
autismo vivenciavam na escola.
A pesquisa foi conduzida a partir da observação das interações entre os membros da
comunidade escolar e as crianças com autismo, tanto na sala de aula, quanto em outros
espaços, para o que a pesquisa do tipo etnográfico é uma importante, senão, a principal
abordagem metodológica, em função dos diferentes instrumentos que utiliza para captar a
realidade. Os sujeitos da pesquisa foram dois meninos com autismo, ambos com cinco anos
de idade, suas professoras e os demais integrantes das escolas. Entre os resultados,
evidenciou-se que o papel do adulto como facilitador mostrou-se fundamental e as
brincadeiras representaram uma importante via de comunicação e interação entre os alunos.
Os dados apontaram ainda que o compromisso com a inclusão daquelas crianças não
representou uma transformação prática nos procedimentos de ensino das escolas, suas
práticas pedagógicas e critérios de avaliação, evidenciando a necessidade de uma mudança
de postura das escolas desdobrada em ações práticas.
Em outro estudo, Fontes (2007) se propôs a analisar como acontece a inclusão pedagógica
de alunos com necessidades educacionais especiais em classes regulares de ensino, sob a luz
das políticas públicas de inclusão e da cultura escolar. Para isto, realizou uma pesquisa de
abordagem etnográfica em duas escolas da Rede Pública Municipal de Educação de Niterói
(RJ).
A análise pautou-se nas três dimensões do modelo proposto por Booth & Ainscow (2002),
que leva em consideração a triangulação entre as políticas públicas, a cultura escolar e
práticas pedagógicas. Foram utilizados como instrumentos de coleta de informação, a
observação participante, entrevistas semi-estruturadas, fotografia e análise documental.
Os resultados do estudo apontam que, embora os professores já possuam um discurso
incorporado sobre Educação Inclusiva, suas ações ainda não revelam esta prática. As
observações mostraram que as escolas estão se estruturando para receber os alunos com
necessidades educacionais especiais, buscando desde adaptações físicas e curriculares até
suportes pedagógicos especializados, como salas de recursos, intérprete de LIBRAS e
professor de apoio. Todavia, o ensino em colaboração entre todos os membros da equipe
escolar, especialmente o professor do ensino regular e o professor especialista da Educação
Especial, ainda é um desafio e se revelou um importante obstáculo a ser vencido nas escolas
observadas para que a inclusão aconteça.
Considerações finais
Constatamos que a metodologia qualitativa com abordagem etnográfica tem se apresentado
um importante instrumento para conhecer efetivas condições da implementação da política de
Educação Inclusiva, principalmente por dar “voz” aos sujeitos da investigação que geralmente
não são ouvidos, no caso, alunos e professores.
Nesta direção, a abordagem etnográfica, mostrou-se relevante por permitir uma compreensão
da complexidade das relações e culturas de inclusão e exclusão a partir do ponto de vista dos
sujeitos da escola. Além disso, ao lançar mão de um significativo número de instrumentos de
coleta e análise de dados, entre os quais, encontra-se a construção da análise junto aos
sujeitos da pesquisa, o estudo oferece a possibilidade do confronto entre diferentes fontes, a
fim de se compreender com mais profundidade as diferentes nuances que envolvem a inclusão
no cotidiano escolar.
De acordo com André (1995), a etnografia não se limita à descrição das ações e situações
observadas no campo de investigação, seu objetivo é reconstruir as cenas e as interações dos
sujeitos observados segundo seus pontos de vista, sua lógica de significação e compreensão
do mundo, como visto no esforço das pesquisas apresentadas.
Entretanto, um problema apontado por esta autora e reforçado por Fontes (2007), refere-se
à ausência de clareza sobre o papel da fundamentação teórica na pesquisa etnográfica. Este
fato pode ser observado em pesquisas em que se busca ir a campo para confirmar dados de
uma teoria predeterminada ou quando se supervaloriza os registros empíricos da forma como
eles se apresentam, não se elaborando uma análise teórica e crítica dos mesmos relacionando
questões micro do contexto investigado com macro questões gerais da sociedade em que este
se localiza. Neste sentido, as pesquisas relatadas buscaram, a partir do enfoque na sala de
aula, apresentar uma discussão que englobasse as condições da educação em geral no Brasil.
É válido observar que durante a pesquisa de campo novos questionamentos e temáticas foram
surgindo a partir das observações desenvolvidas in loco pelos investigadores. O que
proporciona condições para uma prática de pesquisa mais reflexiva, entendida aqui como “o
modificar do caminho e criação de um movimento próprio aos dados e como eles refletem as
nossas questões” (MATTOS, 2001, p. 56).
E, por fim, um outro problema encontrado nos estudos tidos como etnográficos na área de
Educação e extensivos para a área de Educação Inclusiva diz respeito à necessidade de saber
delimitar a questão da objetividade em relação à participação do pesquisador no universo de
pesquisa. A participação do pesquisador no grupo investigado pode gerar equívocos em sua
forma de compreensão do objeto que também é sujeito do estudo, levando-o a substituir
revelações originadas no campo por opiniões particulares preexistentes. Para André (1995, p.
48), “o grande desafio nesses casos é saber trabalhar o envolvimento e a subjetividade,
mantendo o necessário distanciamento que requer um trabalho científico” (grifo da autora).
Distanciamento este que não deve ser lido como sinônimo de neutralidade científica, mas
sim, com o sentido de rigor acadêmico.
Embora esses critérios nos auxiliem no desenvolvimento de uma pesquisa que toma o fluxo do
cotidiano escolar como objeto de investigação, não existe um método que possa ser
recomendado como o melhor. Para Mattos (2001), talvez a diferença básica entre as
pesquisas de caráter etnográfico e as demais pesquisas qualitativas utilizadas em Educação
resida no fato de que estas últimas buscam a causa dos fenômenos educacionais, enquanto a
etnografia procura revelar a caixa preta que envolve a cultura escolar, tomando como foco
de análise as interações interpessoais que se dão no micro universo da sala de aula para
responder a perguntas do tipo como? e por que? com o intuito de compreender situações
reais sobre as quais se tem pouco ou nenhum tipo de controle. Pesquisas como as de Pletsch
(2004), Dias (2006), Suplino (2007) e Fontes (2007), por exemplo, desenvolveram nas
interações de um micro-universo, que é a sala de aula, reflexões que tangenciam questões
mais amplas relacionadas à política educacional em nosso país, mostrando como estas são
produzidas no cotidiano escolar.
Finalizando, por meio do uso da abordagem etnográfica nas pesquisas voltadas para a
Educação Inclusiva, foi possível refletir, de forma breve, sobre as reais dificuldades
vivenciadas por professores, alunos e gestores educacionais no que se refere à proposta de
Educação Inclusiva. Mas, não só. Também foi possível conhecer práticas pedagógicas com
alunos com necessidades educacionais especiais incluídos com sucesso, em classe regular
que, infelizmente, na sua maioria, integram iniciativas isoladas com o esforço de professores
e/ou de gestores educacionais e não de uma política pública dirigida a elas.
Neste sentido, o caminho a ser percorrido ainda é longo. No entanto, acreditamos que, com
base em pesquisas com ancoragem etnográfica, será possível contribuir para a produção de
conhecimento sobre a experiência da inclusão educacional em escolas localizadas no Rio de
Janeiro. Por sua vez, a partir da análise sobre essa realidade local específica, será possível
abrir um diálogo com outros estudos sobre o processo de Educação Inclusiva no Brasil. Em
ambos os casos, os dados destas pesquisas podem vir a ser úteis para a discussão crítica
sobre o “rumo” deste processo em nosso país e o aperfeiçoamento de pesquisas de linha
etnográfica voltadas para essa área.
Referências bibliográficas
ALVES, W. B. A Reflexividade na Pesquisa Etnográfica. Dissertação (Mestrado em
Educação) - Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Rio de Janeiro. 2003.
ANDRÉ, M. E. D. A. de. Etnografia da prática escolar. Campinas – SP: Papirus, 1995.
(Série prática pedagógica).
BOOTH, T.; AINSCOW, M. Index for inclusion: developing learming and participation in
Schools. Brsitol. Centre for Studies in incluive Education. 2002.
DIAS, V. L. L. Rompendo a barreira do silêncio: interações
de uma aluna surda
incluída em uma classe do ensino fundamental. 2006, 164 f. Dissertação (Mestrado em
Educação) - Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Rio de Janeiro, 2007.
FONTES, R. de S. O desafio da Educação Inclusiva no município de Niterói: das
propostas oficiais às experiências em sala de aula. 2007. 160 f. Projeto de Tese (Doutorado
em Educação) – Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Rio de Janeiro. 2007.
GEERTZ, C. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 1989.
GLAT, R.; PLETSCH, M. D. O papel da Universidade frente às políticas públicas para
educação inclusiva. Revista Benjamin Constant, Rio de Janeiro, p. 3-8, 2004.
LÜDKE, M.; ANDRÉ, M.E.D.A. Pesquisa em Educação: abordagens
qualitativas. São
Paulo: E.P.U., 1986.
MACHADO, K. A prática da inclusão de alunos com necessidades educativas especiais
em classe regular: um estudo de caso com abordagem etnográfica. 2005. 108 f. Dissertação
(Mestrado em Educação) - Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Rio de
Janeiro. 2005.
MATTOS, C. L. G. A abordagem etnográfica na investigação científica. (p. 42-59) In:
Revista INES-ESPAÇO, nº16, Jul./dez., p. 42-59, 2001.
MELO, S. C.de. Autismo e educação: a dialética na inclusão. 2004. Dissertação
(Mestrado em Educação) - Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Rio de
Janeiro, 2004.
MONTEIRO, R.A. Pesquisa em Educação: alguns desafios da abordagem qualitativa. In.:
Fazendo e aprendendo pesquisa qualitativa em educação. Juiz de Fora: FEME/UFJF,
1998, p.7-22.
PLETSCH, M. D. O ensino itinerante como suporte para em escolas da rede municipal
de educação do Rio de Janeiro. 2005. 121 f. Dissertação (Mestrado em Educação) -
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Rio de Janeiro, 2005.
______.; GLAT, R. O ensino itinerante como suporte para inclusão de pessoas com
necessidades educativas especiais na rede pública de ensino: uma abordagem etnográfica. In:
Revista Iberoamericana de Educacion, nº 41, vol. 12, 2007.
SUPLINO, M. H. S. Retratos e imagens das vivências inclusivas de dois alunos com
autismo em classes regulares. 2007. 191 f. Tese (Doutorado em Educação) - Universidade
do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Rio de Janeiro, 2007.