http://www.psiquiatriainfantil.com.br/congressos/uel2007/186.htm


Londrina, 29 a 31 de outubro de 2007 – ISBN 978-85-99643-11-2

AVALIAÇÃO DE ALUNOS COM NECESSIDADES ESPECIAIS: ENCAMINHAMENTOS DA REDE PÚBLICA MUNICIPAL DO RIO DE JANEIRO.
Mércia Cabral de Oliveira
Rosana Glat
Programa de Pós-Graduação em Educação
Universidade do Estado do Rio de Janeiro


RESUMO

O presente trabalho apresenta uma análise preliminar sobre o processo de avaliação pedagógica dos alunos com necessidades especiais na Rede Pública Municipal do Rio de Janeiro, o encaminhamento de propostas de adequação curricular nas escolas, bem como os desdobramentos face às políticas de inclusão educacional.
 

Visando o entendimento dos diversos movimentos direcionados à implementação de uma escola inclusiva, foi criado, no Programa de Pós-Graduação em Educação da UERJ (PROPEd), no âmbito da linha de pesquisa Educação Inclusiva: ciência e cultura da inclusão escolar, um grupo de pesquisa1 voltado para o estudo da inclusão escolar de alunos com necessidades educacionais especiais oriundas de deficiências, condutas típicas de síndromes neurológicas, quadros psiquiátricos e psicológicos graves, e altas habilidades.

Uma das investigações em curso, cujos dados parciais constituirão a base para a presente discussão2, tem como objetivo oferecer um panorama atual do atendimento educacional aos alunos com necessidades especiais nas escolas públicas municipais do Rio de Janeiro, e analisar, o processo de implementação da política de Educação Inclusiva nesta rede.

Vale destacar que esta é a maior rede pública municipal de ensino da América Latina, compreendendo, em 2007, 1057 escolas com aproximadamente 740.000 alunos. A administração desse universo escolar é realizada de maneira descentralizada por dez Coordenadorias Regionais de Educação (CREs), abrangendo diferentes áreas geográficas da cidade.

O acompanhamento e a orientação do trabalho com os alunos com necessidades especiais, encontra-se a cargo do Instituto Helena Antipoff (IHA)3, órgão da Secretaria Municipal de Educação (SME) do Rio de Janeiro, que é também responsável pela elaboração e implementação de políticas em Educação Especial, incluindo a formação continuada dos docentes que atuam com esses alunos. 


1  Este grupo de pesquisa é coordenado pela segunda autora, e é integrado por grupo professores e alunos de graduação e pós-graduação da Faculdade de Educação da UERJ, bem como profissionais da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro (SME-RJ); a primeira autora, ora discente do Curso de Mestrado, também membro da equipe da SME-RJ, vem participando do grupo desde 2005. 

2 Educação Inclusiva na Rede Municipal de Educação do Rio de Janeiro: estudo etnográfico do cotidiano escolar e desenvolvimento de estratégias pedagógicas de ensino-aprendizagem para alunos com necessidades educacionais especiais em classes regulares” (financiamento CNPq & FAPERJ).

3  Em 1959 foi criado o Instituto de Educação do Excepcional, encarregado pela Educação Especial no antigo Estado da Guanabara. A partir da fusão entre o Estado da Guanabara e Rio de Janeiro, em 1975 este órgão foi mantido para a mesma finalidade no recém formado Município do Rio de Janeiro, passando a ser denominado Instituto Helena Antipoff.


O IHA4 acompanha a proposta escolar de aproximadamente 8000 crianças e jovens com necessidades educacionais especiais, desde a Educação Infantil até o final do Ensino Fundamental. O IHA atua diretamente em todas as CREs, contando, para isso, com dez equipes, cada uma composta, em média, por três profissionais. Estes profissionais são especializados em, pelo menos, uma área de deficiência – deficiência mental, deficiência visual, deficiência auditiva, deficiência múltipla, deficiência física – e ainda condutas típicas de síndromes neurológicas, quadros psiquiátricos e psicológicos graves, e altas habilidades. Esta equipe de profissionais especializados está organizada em grupos de estudos, nos quais desenvolvem pesquisa e aprofundamento teórico sobre as peculiaridades do ensino e da aprendizagem das pessoas com necessidades educacionais especiais oriundas de tais situações.

Cada CRE, por sua vez, conta com professores especializados distribuídos pelas diversas escolas, que recebem suporte da equipe do IHA a ela designada. Fazem parte também da estrutura das CREs os chamados Agentes de Educação Especial - profissionais encarregados, entre outras funções, da condução e acompanhamento dos encaminhamentos relativos à Educação Especial no âmbito de sua região. A função de Agente de Educação Especial surgiu na Rede Municipal de Ensino do Rio de Janeiro a partir de uma reestruturação no funcionamento do Instituto Helena Antipoff (IHA) implantada nos anos de 1995 e 1996. Sua origem se vinculava à necessidade de um profissional da Educação no nível regional da Secretaria Municipal, que agenciasse as ações a serem desdobradas a partir da política de inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais nas escolas municipais (SME, 1996).

A primeira etapa da referida pesquisa (que se desdobra em um estudo etnográfico) consistiu no mapeamento quantitativo e qualitativo da estrutura e funcionamento do atendimento escolar oferecido aos alunos com necessidades especiais matriculados nesta rede. Objetivou também analisar o papel e ações desenvolvidas pela área de Educação Especial no âmbito da proposta de Educação Inclusiva em vigor nesta rede.


4  Em 1994 o IHA inaugurou o Centro de Referência em Educação Especial, que tem hoje reconhecimento nacional e internacional, onde são oferecidas diversas oficinas e atividades de enriquecimento para alunos com necessidades educacionais especiais, como artes plásticas, ginástica, teatro, dança, música, e conversação em LIBRAS. Também funcionam nesse Centro laboratório de informática educativa, brinquedoteca, sala de leitura e um Centro de Transcrição à Braille, abertos para alunos da Rede Pública Municipal e comunidade em geral. Está em fase de implementação um Programa de Estudos e Pesquisa sobre Educação Especial em parceria com o Programa de Pós-Graduação em Educação da UERJ, no qual a presente pesquisa está inserida.


Os dados obtidos nesta primeira etapa (GLAT, ANTUNES, OLIVEIRA & PLETSCH, 2006; GLAT, PLETSCH & FONTES 2006) indicaram, entre outros aspectos, a necessidade de uma análise mais detalhada sobre o processo de encaminhamento e avaliação dos alunos com necessidades educacionais especiais, bem como sobre o papel desempenhado pelas Agentes de Educação Especial responsáveis por esse trabalho no âmbito das Coordenadorias Regionais de Educação (CREs).

Para permitir tal aprofundamento foi empreendido um novo estudo utilizando como instrumento de coleta de dados entrevistas semi-estruturadas com 16 Agentes de Educação Especial das 10 Coordenadorias Regionais de Educação do Município5. As entrevistas foram previamente agendadas, por meio do IHA, e realizadas na própria CRE onde os sujeitos atuavam. As entrevistas foram gravadas em áudio e transcritas textualmente pelas próprias pesquisadoras.


5  Este número corresponde apenas às Agentes de Educação Especial que concederam as entrevistas. Em cada CRE há de duas a três Agentes em função do número de escolas atendidas na região. Deve-se esclarecer também que a entrevista aconteceu com pelo menos uma Agente de cada CRE. Neste texto, faremos referência ao termo Agente de Educação Especial sempre no feminino pelo fato de que esta função na Rede Municipal de Educação do Rio de Janeiro tem sido exercida exclusivamente por mulheres.


A partir da análise das entrevistas, foram delimitados alguns grupos temáticos, incluindo-se entre esses a avaliação. Vale observar que avaliação é tema recorrente nas discussões pedagógicas de modo geral, porém, especificamente na Educação Especial reúne conteúdos muito significativos, os quais explicam algumas práticas cotidianas com relação aos alunos com necessidades educacionais especiais.

De modo geral, os dados obtidos nas entrevistas com as Agentes de Educação Especial referentes às questões voltadas para avaliação, apontam para a necessidade de ampla discussão sobre as práticas que no cotidiano da escola fundamentam processos de exclusão educacional dos alunos com deficiências. Também ficou aparente, que muitas ações pedagógicas ainda são pautadas em um modelo de avaliação centrado na identificação da deficiência ou problema do aluno, estabelecendo a superação das dificuldades como critério de inserção plena na turma comum. Esse tipo de postura, típico do modelo de “Integração”, até recentemente predominante, deveria estar sendo superada frente aos pressupostos da Educação Inclusiva.

Em outras palavras, as propostas pedagógicas previstas e realizadas, são identificadas como cuidados para que o aluno avaliado possa desenvolver algumas habilidades julgadas necessárias para o seu melhor desempenho na turma comum. Nesse particular observa-se uma preocupação em alterar ou adequar o aluno para que esse tenha condições de acompanhar a proposta educativa da turma comum, portanto uma ação com vistas à sua integração em outro momento.

A Integração Educacional dos alunos com necessidades especiais constituiu-se, a partir da década de 1970, como um processo organizado e mantido por uma parte dos educadores que atuavam na Educação Especial. Durante muito tempo, como responsável, quase exclusiva pela escolarização desses alunos, a Educação Especial realizou um intenso trabalho nas escolas regulares para garantir que eles acompanhassem as propostas curriculares das turmas comuns, beneficiando-se do convívio com seus pares da mesma idade e de interesse social, em um ambiente mais normalizado. Entretanto, esse era um trabalho que exigia um acompanhamento quase individual do aluno, assim o quantitativo de alunos integrados sempre foi muito pequeno.

Conseqüentemente, com um número reduzido de processos de Integração de alunos, o fortalecimento da política pública foi pouco expressivo, como foi pouco expressiva a representação da Educação Especial para a Educação como um todo. Destacamos as afirmativas de Ferreira (1998, p.7)  que analisando a LDB no que tange a área de Educação Especial, ressalta: “nas leis 4.024/61 e 5.692/71 não se dava muita importância para essa modalidade educacional (…) em 1961, destacava-se o descompromisso do ensino público; em 1971, o texto apenas indicava um tratamento especial a ser regulamentado pelos Conselhos de Educação.”

Mesmo de modo tímido, com limitações, os profissionais da área da Educação Especial contribuíram para o estabelecimento de um caminho progressivo para que esses indivíduos começassem a participar nos diferentes espaços sociais (JANUZZI, 2004). O processo de Integração responsabilizou administrativamente o sistema regular de ensino e o de Educação Especial para alteração de propostas educativas, estabelecimento de legislação específica, e previsão de recursos materiais, dentre outras ações, e possibilitou a alteração do conceito sobre a escolarização desses alunos.

O sucesso na consecução das propostas educativas da Educação Especial, aliado à luta das próprias pessoas com deficiências e suas famílias por seus direitos na sociedade, foram aos poucos, nas últimas décadas, possibilitando um quadro de maior visibilidade das questões relativas a essa população. Assim é que, contraditoriamente, a Integração como um processo de inserção de alunos com deficiências na escolarização formal, passou a ser mais praticado a partir da difusão das políticas de Inclusão na década de 1990. A proposta de Integração Educacional, baseada na filosofia da Normalização, tinha como fundamento básico a necessidade de oportunizar experiências educativas para as pessoas com deficiências o mais próximas das que eram oferecidas aos demais alunos(GLAT, 1989; 2004). E, uma vez vencidas as dificuldades inerentes à condição da deficiência, esses indivíduos beneficiar-se-iam das propostas escolares nos ambientes regulares de ensino. Esta visão foi aos poucos sendo incutida nas práticas educacionais e aceita por boa parte dos professores das turmas comuns.

Entretanto, tal forma de encarar a escolarização das pessoas com deficiências choca-se com os pressupostos da Educação Inclusiva, onde a escola deve preocupar-se em favorecer alternativas curriculares para ampliar a participação e a aprendizagem de todos os alunos, alterando desse modo os seus projetos curriculares e práticas pedagógicas (GLAT & BLANCO, 2007). Tais premissas foram amplamente difundidas pela Declaração de Educação para Todos,(UNESCO, 1990) elaborada em Jomtiem, e especialmente analisados na Declaração de Salamanca sobre Princípios, Políticas e Práticas na Área das Necessidades Educativas Especiais (UNESCO, 1994).

Considerando os fundamentos do processo de Integração e as premissas das políticas de Inclusão Educacional de alunos com necessidades especiais como explicitado até o momento foi que analisamos o desenvolvimento das ações das Agentes de Educação Especial na Rede Pública Municipal de Ensino do Rio de Janeiro. Tal análise apontou, de imediato, um distanciamento entre as práticas desses profissionais com relação a esse alunado e as orientações emanadas pela Secretaria Municipal de Educação (SME).

No eixo avaliação destacamos como subcategorias a avaliação inicial que visa o encaminhamento do aluno e a avaliação do processo de ensino/aprendizagem, as quais serão sucintamente discutidas a seguir
Vale observar que a utilização do termo avaliação inicial evoluiu da expressão avaliação diagnóstica, incorporada por esta área e, segundo Blanco (1999, p.2), “referindo-se a um conjunto de ações de diversos especialistas e vistas como condição prévia para a educação de pessoas portadoras de diferenças”. O encaminhamento trata das propostas de apoio em modalidades já reconhecidas pela Educação Especial, tais como sala de recursos ou professor itinerante, ou até uma programação diferenciada para efetivar a permanência e participação do aluno na escola. No âmbito da avaliação do processo procuramos investigar questões relacionadas ao desempenho e progresso escolar desses alunos.
Percebe-se pelos depoimentos concedidos pelas Agentes de Educação Especial uma defesa recorrente em relação ao que sabem ser teoricamente correto, mas que não pode ser realizado na prática. Essa dicotomia também é atribuída para algumas orientações da SME-RJ, que elas reconhecem, por princípio, serem legítimas, mas consideram não exeqüíveis no contexto do cotidiano escolar como se apresenta concretamente.

O trecho a seguir, extraídos da transcrição de uma das entrevistas, expõe um exemplo da afirmativa anterior:

“A indicação é que a gente vá par adentro da escola, mas a gente só faz isso em uma parte do grupo e a outra a gente não consegue dar conta, mas também não fica parada. A gente entra em contato com a escola e explica isso tudo e a gente pode estar chamando esse aluno aqui.É um local que a gente diz que é um corte  da realidade dele, que não faz parte da realidade dele, então a gente  leva tudo isso em consideração na hora da avaliação (...)

Olha, é... Porque tem o ideal e tem o real, e tem o histórico e tem o cultural que a gente não pode estar falando do ideal sem estar fazendo essas considerações. Então, eu acho que isso é processo também. Não vai ser de uma hora pra outra que esse processo de inclusão vai ser consolidado (...)


Por exemplo, às vezes, a gente recebe um pedido de uma escola para avaliação [dizendo] que esta criança não está construindo conhecimento.  ... É uma criança que está totalmente... não se sente integrada na verdade. ... Ela acompanha socialmente ... mas no pedagógico ela não está. Então, a gente vê as possibilidades, a maneira como pode estar estimulando esta criança. E aí a gente conversa, a gente faz o encaminhamento para a sala de recursos. (…)

E na sala de recursos, essa criança é trabalhada...”

Nas entrevistas as Agentes expõem suas dúvidas e oscilam entre as orientações dadas pelo IHA e o que é possível acontecer. Observa-se no relato acima que a solicitação da escola para avaliação de um aluno, reúne as informações sobre as dificuldades de aprendizagem deste, porém não sobre as condições da própria escola. A avaliação e a proposta da sala de recursos é definida pelas Agentes, que reconhecem que só a freqüência do aluno à sala de recursos  não basta, mas não sabem como agir.

Também merece destaque o fato de que a Agente de Educação Especial realiza uma avaliação pedagógica, fora do contexto escolar, desconsiderando as interações do aluno com a proposta que está sendo realizada na escola. E, a partir dessa avaliação indica uma modalidade de atendimento paralelo da Educação Especial, a sala de recursos, para realizar um programa voltado para as suas dificuldades, considerando também as dificuldades emocionais. Todo esse plano visa favorecer a permanência desse aluno na classe comum da escola que o indicou. Como já discutido, esse circuito é eminentemente integracionista, na medida em que o foco é colocado todo no aluno; muito embora no discurso os Agentes e vários outros professores defendam a inclusão educacional dos alunos com necessidades educacionais especiais.

De fato, o investimento previsto pelas Agentes após a avaliação realizada, conforme relatado no trecho acima, está completamente voltado para as características individuais do aluno com problemas. O distanciamento em relação aos pressupostos da Inclusão ficou patente por não terem sido encontrados em nenhuma das 16 entrevistas qualquer menção sobre modificações para a proposta curricular da escola. Ou seja, foi desenvolvida a avaliação sem considerar que na interação com o contexto escolar podem existir situações que são barreiras à aprendizagem do aluno além de suas dificuldades intrínsecas (CARVALHO, 2002; GLAT & BLANCO, 2007).

No que tange à avaliação inicial, a análise dos dados aponta três aspectos que demandam atenção. O primeiro diz respeito a quem faz a avaliação inicial dos alunos com deficiências. Segundo Nacif (2003) a orientação do IHA quanto aos procedimentos de avaliação inicial prevê que tudo aconteça na escola, devendo ser iniciado pelo professor da turma onde se encontra o aluno com necessidades especiais.  À medida que a equipe da escola tem dúvidas sobre as melhores iniciativas e propostas adequadas às especificidades (respostas educativas adequadas) para o aluno e inicia a busca por outros olhares, é quando deve ser acionada a Divisão de Educação- DEE da CRE, bem como o IHA. Neste aspecto os relatos apontam para uma impossibilidade operacional, pois as Agentes de Educação Especial sinalizam que não conseguem que tais estudos sejam de fato iniciados na escola; e elas são sempre acionadas, perfazendo um número exagerado de relatórios com solicitação de avaliação. Como não dão conta de atender essa demanda seguindo a orientação do IHA, descrita acima,  optam por entrevistar a família e avaliar o aluno na Coordenadoria, fora da escola. 

As controvérsias presentes na avaliação dos alunos com necessidades especiais entre esses profissionais, sugerem que a base clínica que sempre fundamentou esta ação na Educação Especial permanece sendo a base para a tomada de decisões em relação às propostas educacionais (BEYER, 2005), apesar da intensa mobilização para a garantia de acesso e permanência com aprendizagem na escola para todos os alunos. Assim, os professores nas turmas comuns recebem os alunos com necessidades educacionais especiais como imposição legal, mas definem para si mesmos que a proposta educativa de que necessitam tais alunos é tarefa de professores especializados. No meio especializado, os professores responsáveis pelo apoio complementar atuam buscando demonstrar sempre que os alunos com deficiências têm possibilidades de desenvolvimento escolar, que podem aprender, procurando ampliar as habilidades necessárias à participação na sala de aula, porém não contam com as alterações nas propostas que estão em andamento e que podem ser barreiras para um bom desempenho do aluno.

Um outro aspecto identificado na subcategoria avaliação inicial foi o posicionamento das entrevistas frente ao diagnóstico clínico. As respostas oscilam entre algumas considerarem o diagnóstico importante para encaminhar propostas ou mesmo para diminuir o desconforto de alguns alunos com dificuldades, até outras que questionam sua utilização já que o mesmo pode ser passível de equívocos. As afirmativas abaixo, feitas por diferentes Agentes, ilustram esta análise:

“O laudo vai funcionar ... em determinados comprometimentos, tipo a deficiência auditiva”.
“Os laudos podem ser equivocados…a gente não sabe de onde vem aquilo e…às vezes a gente não pode confiar no laudo”.
“Com certeza a gente deixa o laudo médico em última instância”.
“Apesar de ser importante, ele não é o único orientador para se fechar uma avaliação, sendo essa processual”.

O uso ou não do laudo médico, bem como o que caracteriza a avaliação pedagógica parecem ser pontos obscuros para as Agentes de Educação Especial. Isso é um dado que sinaliza uma situação grave, na medida em que a nível regional esses profissionais têm grande responsabilidade pelo encaminhamento de diferentes ações relativas ao alunado com necessidades educacionais especiais.

A segunda subcategoria analisada diz respeito à avaliação processual, ou a avaliação do desempenho dos alunos nas turmas. E sobre essa questão as respostas concentram-se na afirmação da impossibilidade de investimentos nessa tarefa. Segundo as Agentes entrevistadas, as avaliações iniciais dos alunos absorvem totalmente a sua disponibilidade e são prioritárias uma vez que, as providências necessárias ao apoio desses alunos dependem da conclusão obtida nessa avaliação inicial.

Como proposta a ser investigada, as Agentes sugerem que o acompanhamento do desempenho desses alunos seja realizado por outros elementos da Educação Especial como os professores itinerantes ou de salas de recursos. Assim esta categoria, que é citada na análise do eixo avaliação, não pode ser estudada, não há entre os profissionais do acompanhamento direto às escolas e aos alunos com necessidades educacionais especiais, informações concentradas sobre o desempenho desses alunos nas escolas.

Os dados apresentados sobre a ação das Agentes de Educação Especial na Rede Pública Municipal do Rio de Janeiro, embora referentes a uma determinada realidade, são representativos e podem servir de indicadores sobre como vem sendo conduzido no sistema educacional brasileiro o processo de Educação Inclusiva. Fica aparente nessa análise preliminar, que a temática avaliação, quando envolve alunos com necessidades educacionais especiais, é um campo de estudos profícuo a várias investigações, e que podem desdobrar-se em conhecimentos necessários a modificações de práticas escolares. Particularmente o conceito: necessidades educacionais especiais, intimamente relacionado ao conceito de resposta educativa, ambos propostos como uma ruptura paradigmática entre a escola tradicional e a escola inclusiva, são distorcidos em função das crenças equivocadas em relação ao processo de ensino / aprendizagem dos alunos com necessidades especiais.  

Considerando que o olhar / avaliar nos encaminha para a definição dos caminhos / currículo, aspecto que é fundamental no âmbito das discussões coletivas da escola, deve ser atentamente estudado, pois é parte imprescindível para ressignificação das práticas escolares com vistas a inclusão educacional de alunos com necessidades educacionais especiais.


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JANUZZI, G. M. A educação do deficiente no Brasil: dos primórdios ao início do século XXI. São Paulo: Autores Associados, 2004.

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