http://www.psiquiatriainfantil.com.br/congressos/uel2007/194.htm |
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Londrina, 29 a 31 de outubro de 2007 – ISBN 978-85-99643-11-2
ENSINO MÉDIO: APRENDIZAGEM E A INCLUSÃO/EXCLUSÃO DO ALUNO
SURDO
Elaine Teresinha Dal Mas Dias
Centro Universitário Nove de Julho - UNINOVE
RESUMO
INTRODUÇÃO: Estuda e analisa as vivências de exclusão experenciadas por portadores de
deficiências auditivas. O ser humano está em convívio, estabelecendo contatos, construindo relações,
amalgamando-se ou individualizando-se. Esse movimento permite a observação do fenômeno do
pertencimento por apontar o lugar na hierarquia social. Se há um lugar a ser ocupado existe o da não
ocupação, evidenciando o caráter intersubjetivo das relações interpessoais, caracterizando a exclusão.
Exclusão indica deixar de admitir e afastar, é um ato volitivo e conduzido que aparta o outro do
convívio. METODOLOGIA: Visando a compreensão do todo a partir do individual investigou-se a
trajetória escolar da pessoa portadora de necessidades especiais. A história oral como proposta de
acolhimento de depoimentos apresenta-se como adequada por implicar uma percepção do passado
como algo contínuo e inacabado e por garantir um sentido social à vida dos depoentes. Os sujeitos são
portadores de deficiências auditivas, do sexo feminino, com idade variando entre 16 e 18 anos. O
professor realiza anotações sumariadas no quadro negro; aguarda que os alunos copiem a matéria e
em seguida faz uma exposição oral do conteúdo apresentado e procura expressar-se com vagar e
seu esforço se torna maior quando não há um professor intérprete em sala. A observação do
fenômeno inclusão/exclusão social revelou aspectos interessantes do agrupamento e do afastamento
dos grupos. Ouvintes e não-ouvintes guardam separações distintas e evidenciam atitudes
mutuamente segregadoras, caracterizando o preconceito e o estereótipo. O professor de classe,
apesar do esforço empreendido desnuda seu despreparo para atuar junto aos alunos portadores de
necessidades especiais. ao pedir auxílio aos alunos ouvintes para poder se comunicar com os não-ouvintes quando a mediadora não está presente mostra, também, seu desconhecimento da
linguagem gestual que impede a comunicação com os surdos.
Palavras-chave: educação, subjetividade, complexidade
a intersubjetividade do cotidiano escolar e o fenômeno inclusão/exclusão
Introdução
O homem como sujeito floresceu na modernidade. A edificação de sua interioridade acontece pelo
entrelaçamento das relações interpessoais e na transmissão dos aspectos sociais e culturais, que
resultam do convívio compartilhado, que, ao serem transmitidos, são interiorizados constituindo a
pessoa e sua subjetividade, especialmente por intermédio da linguagem. Esta, por sua vez permite a
tipificação das ndo-se como base e instrumento do acervo coletivo do conhecimento. Sob essa
ótica, o desenvolvimento do ser humano implica o relacionamento com o ambiente e com uma
ordem cultural e social específica.
Nesse cenário, como está colocado o portador de necessidades especiais, particularmente, o
deficiente auditivo?
Sabidamente, o mundo, apesar das normas de acessibilidade, ainda está despreparado para receber
a pessoa que apresenta alguma necessidade específica, obrigando-a a viver apartada e dificultando
a tessitura da trama que estabelece o convívio entre os indivíduos. Sua condição, algumas vezes, a
coloca em compartilhamento, mas raramente em pertencimento, determinando um fenômeno de
exclusão na inclusão.
A inclusão1 é o estado daquilo ou de quem está incluso, inserido, implicado; é a introdução de
alguém em um grupo; é um ato que depende da volição ou é um ato conduzido. A exclusão2, por
sua vez, indica não ter compatibilidade com alguém, deixar de admitir, privar, despojar, não deixar
entrar, afastar. Ambas sugerem uma imposição externa do como ser e como estar ou de ser e estar.
A Declaração de Salamanca (1994) - que culminou no documento das Nações Unidas “Regras
Padrões sobre Equalização de Oportunidades para Pessoas com Deficiências” e demanda que os
Estados assegurem que a educação de pessoas com deficiências seja parte integrante do sistema
educacional -, é um exemplo desse estado de coisas, como se pode depreender do artigo 7 da
Estrutura de Ação em Educação Especial, a saber:
Principio fundamental
da escola inclusiva é o de que todas as crianças
devem aprender juntas, sempre que possível, independentemente de
quaisquer dificuldades ou diferenças que elas possam ter. Escolas
inclusivas devem reconhecer e responder às necessidades diversas de
seus alunos, acomodando ambos os estilos e ritmos de aprendizagem e
assegurando uma educação de qualidade a todos através de um
currículo apropriado, arranjos organizacionais, estratégias de ensino, uso
de recurso e parceria com as comunidades. Na verdade, deveria existir
uma continuidade de serviços e apoio proporcional ao contínuo de
necessidades especiais encontradas dentro da escola
(www.direitoshumanos.usp.br).
No Brasil vemos a inclusão ocorrer por força de lei3. A instituição
educacional fica responsabilizada
pelo atendimento de todos os alunos com necessidades educativas especiais em classes comuns,
pelos professores especializados em seu corpo docente, pela flexibilização e realização de
adaptações curriculares, pelo apoio pedagógico e pela garantia da acessibilidade física à escola,
pela participação da família nas decisões e pela formação continuada dos professores.
1 Cf. Houaiss, 2001:1595.
2 Idem, p. 1282.
3 A Resolução CNE/CEB nº 2, de 11 de setembro de 2001 do Conselho Nacional de Educação.(Câmara de
Educação Básica. Resolução CNE/CEB 2/2001. Diário Oficial da União, Brasília, 14 de setembro de 2001. Seção 1E,
p. 39-40).
Como afirma Morin (2002, p.64), “uma sociedade é o produto das interações entre os indivíduos
que a compõem”. Nesse sentido, como se encontra o portador de necessidades especiais,
particularmente o deficiente auditivo, que interage, mas não pertence? A repercussão interativa
seriam as leis, os estatutos e as declarações que procuram incluir essas pessoas? E a pessoa?
O pertencimento ocorre quando o sujeito interioriza os fenômenos sociais objetivados e dotados de
sentido, transmitidos por intermédio da oralização e observados nas representações, atitudes e
comportamentos, cujas características fundantes só amenizam por força da conscientização.
Tomando-se, então, a linguagem como um dos processos determinantes para o desenvolvimento da
cognição e da consciência, a pessoa surda, provavelmente, estará limitada na sua significação do
mundo e na construção de conhecimentos, pois as trocas interativas estão calcadas no universo
falante, fato que determina um sentido próprio e singular dos fenômenos.
A noção de sujeito de E. Morin permite, contudo, um olhar consubstanciado à pessoa,
principalmente, ao portador de necessidades especiais, já que “compreende uma definição subjetiva
e biológica, simultaneamente; não podendo ser reduzida a uma concepção humanista, que considera
a consciência que o ser humano tem de si, nem pode ser reduzida a uma concepção metafísica, que
se norteia por conceitos transcendentais, e tampouco a uma concepção antimetafísica, que aponta
para a inexistência do sujeito, mas compreende a inseparabilidade de todas elas”. (Petraglia, 1995,
p.58).
Petraglia (1995, p.59) mostra que
a noção de sujeito vai além do indivíduo e remete-nos à idéia de que cada ser
vivo, é um ser único e indiscutivelmente ímpar, no seu aspecto subjetivo, até
em maior escala do que as diferenças genéticas, fisiológicas, morfológicas e
psicológicas. Na relação com o outro, a autotranscendência do sujeito o
permite superar para si mesmo a ordem da realidade, para além de sua
própria esfera e de seu ambiente, alterando-a a partir de sua dimensão ética,
que irá nortear os seus valores.
A intersubjetividade, por sua vez e nessa perspectiva, amalgama-se a tessitura e aos
atravessamentos velados e escamoteados das práticas e dos discursos da vida diária e do cotidiano
escolar que engendram, excluem e/ou incluem o portador de necessidades especiais, produzindo e
reproduzindo mesmices e pseudoigualdades (Kupfer, 1999).
Indubitavelmente, uma via se mostra possível: a conscientização. É, portanto, por ela que a
formação do professor deve caminhar, pois, apenas mediante a reflexão4, na qual estão presentes os
significados, as representações e a emocionalidade, é que se vislumbra a transposição de
preconceitos e estereótipos. Deve-ser acrescentar que a exigência da transformação cultural da
instituição educacional é parte integrante desse movimento.
Cabe esclarecer a compreensão dada aqui a preconceito5 e estereótipo. O primeiro pode ser
compreendido como um conceito formado a priori, anterior à experiência e composto por atitudes –
entendidas como disposições ou predisposições afetivas favoráveis (positivas) ou desfavoráveis
(negativas) - direcionadas pontual ou generalizadamente para algo ou alguém, visando a restrição e a
repetição de movimentos; que fala e mostra mais a respeito do preconceituoso do que sobre os seus
objetos. O segundo, o estereótipo6, como um dos elementos do preconceito, é uma forma rígida e
anônima reprodutora de imagens e comportamentos que categoriza e separa os indivíduos; é
passível de apropriação e modificação conforme as necessidades que busca transmitir, objetivando
a manutenção do status quo.
4 “imersão consciente do homem no mundo de sua experiência” (Gómez (1998, p.369).
5 Cf Amaral (1998), Crochik (1997) e Krüger (1986).
6 Cf USP-NEMGE/CECAE, 1996.
O déficit auditivo
O desenvolvimento da linguagem e a realização educacional das crianças com déficits auditivos
estão diretamente ligado à idade do início e ao grau de perda, a qualidade do ensino e às condições
socioeconômicas. De acordo com Sacks (1998, p. 44), a “língua de sinais deve ser introduzida e
adquirida o mais cedo possível, senão seu desenvolvimento pode ser permanentemente retardado e
prejudicado, com todos os problemas ligados à capacidade de proposicionar”.
É considerado surdo (Brasil/MEC/SEESP, 1994) o indivíduo que possui audição não funcional na
vida comum; e parcialmente surdo, aquele que, mesmo com perda auditiva, possui audição funcional
com ou sem prótese.
A tendência atual é enfatizar as implicações educacionais e sociais da perda como aspecto mais
significativo do que a valoração quantitativa. Entretanto, as classificações e rotulações são usadas
com o propósito de delimitar e sinalizar a surdez e a audição reduzida. A mediação inadequada
entre o ouvinte e não-ouvinte pode representar sérias dificuldades na aquisição dos conhecimentos
lingüísticos, principalmente no que se refere ao domínio das estruturas e da produção escrita. Para
Fernandes (1990), essas dificuldades são observadas nas dificuldades com o léxico; no
desconhecimento da contração de preposição com o artigo; no uso inadequado dos verbos, seja em
suas conjugações, tempos e modos, ou nas trocas entre ser e estar, e no uso indevido dos verbos
ter e estar; no uso inadequado das preposições, na omissão de conectivos em geral e de verbos de
ligação; na colocação do advérbio na frase; na falta de domínio e uso restrito de outras estruturas de
subordinação.
Por força de lei as escolas devem se responsabilizar pelo professor mediador com proficiência na
linguagem dos sinais, e a importância desse profissional é decisiva anos iniciais e finais do Ensino
Fundamental. E os alunos do Ensino Médio? Sua presença em sala pode ser dispensada? As
dificuldades léxicas são permanentes ou no ensino médio tendem a desaparecer?
Este trabalho pretende apresentar alguns dos aspectos presentes na ação prolongada e contínua da
inclusão/exclusão escolar experenciadas por portadoras de deficiências auditivas e as conseqüências
do despreparo na formação de professor licenciado sem formação na linguagem dos sinais.
Metodologia
Este trabalho emprega a abordagem qualitativa de pesquisa, buscando compreender, primeiramente,
as relações interpessoais, o compartilhamento de experiências e o fenômeno inclusão/exclusão do
aluno surdo. Partiu-se da observação e do registro semanal das aulas, por um período de três meses
na disciplina de geografia ministradas por um professor efetivo, que aceitou a presença do
pesquisador, e interpretadas por uma professora especialista em linguagem gestual. E, num segundo
momento apreender a história de vida escolar dos alunos/colaboradores.
Os sujeitos são 7 jovens surdas, cursando a 1ª série do ensino médio, com idade entre 16 e 18
anos, que freqüentaram serviços de assistência fonoaudiológica durante anos e que se comunicam
exclusivamente por intermédio da linguagem de sinais.
O professor, embora não fosse foco principal da investigação, mereceu atenção por desvelar
aspectos no exercício da prática que não puderam ser desconsiderados e que tonalizaram o
fenômeno do pertencimento e da formação do profissional especialista.
Houve aceitação consubstanciada da aceitação e participação na pesquisas.
Resultados
As observações das aulas mostram que o professor segue um padrão didático. Realiza anotações
sumariadas no quadro negro; aguarda que os alunos copiem a matéria e em seguida faz uma
exposição oral do conteúdo apresentado, utilizando-se de textos de revistas ou livros
especializados. Acompanha atenciosamente os grupos de alunos que trabalham em conjunto e
chama a atenção dos que se mantém dispersos. Procura expressar-se com vagar e seu esforço se
torna maior quando não há um professor intérprete em sala.
O grupo observado se mantém coeso e atento à mediadora durante o período de apresentação do
conteúdo, questionando quando alguma explicação não é entendida, quando necessitam mais
informações sobre as atividades que devem desenvolver ou quando alguma aluna se dispersa ao
executar alguma tarefa. Seguem as orientações cuidadosa e aplicadamente, dispersando pouco,
trocando impressões, discutindo e se divertindo.
O contato com outros não-ouvintes é esporádico e apenas acontece quando precisam trocar
informações sobre as produções. Não houve atenção dirigida aos colegas ouvintes durante todo
período de observação.
Aparentemente, as jovens sentiram-se pouco à vontade durante as entrevistas, pois muitas questões
foram respondidas com frases curtas ou com monossílabos, diferentemente, do observado durante
as aulas, quando mantinham conversas mais longas e contínuas. Algumas perguntas feitas por elas
sugerem que não compreendiam a finalidade ou as razões das perguntas e do estudo.
A observação do fenômeno inclusão/exclusão social revelou aspectos interessantes do agrupamento
e do afastamento dos grupos. Ouvintes e não-ouvintes guardam separações distintas e evidenciam
atitudes mutuamente segregadoras, caracterizando o preconceito e o estereótipo.
O desempenho e a produção textual acadêmica das alunas são limitados; as avaliações revelam
dificuldades de compreensão e de realização, evidenciando omissões, substituições e distorções.
Mostram também dificuldades no uso dos verbos - nas conjugações, tempos e modos; no uso
inadequado das preposições, na omissão de conectivos, dos verbos de ligação e na colocação do
advérbio nas frases. Os testes de avaliação são incompreensíveis, pois são feitas sem o auxílio do
professor mediador.
O professor de classe, apesar do esforço empreendido em sala da aula, desnuda seu despreparo
para atuar junto aos alunos portadores de necessidades especiais. Ao pedir auxílio aos alunos
ouvintes para poder se comunicar com os não-ouvintes quando a mediadora não está presente
mostra, também, seu desconhecimento da linguagem gestual que impede a comunicação com os
surdos.
Conclusão
A prevalência da oralidade, a dificuldade de defrontação com a diferença e o preconceito exclui o
surdo do convívio, obrigando-o a recolher-se ao grupo de iguais, que, entretanto, também
discrimina e exclui.
O fenômeno da exclusão ancora-se na subjetividade e na complexidade das relações interpessoais,
impedindo o pertencimento e dificultando a facilitação da aprendizagem e a apreensão de
conhecimentos.
A produção dos surdos desnuda o despreparo do professor especialista, a precária condição do
ensino e dúvida da efetivação da educação inclusiva.
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TÍTULO: SUBJETIVIDADE, COMPLEXIDADE E EXCLUSÃO: O PORTADOR DE
NECESSECIDADES ESPECIAIS