http://www.psiquiatriainfantil.com.br/congressos/uel2007/215.htm


Londrina, 29 a 31 de outubro de 2007 – ISBN 978-85-99643-11-2

VARIEDADE LINGÜÍSTICA E PRÁTICA PEDAGÓGICA: IMPLICAÇÕES NO ENSINO–APRENDIZAGEM DA LÍNGUA PORTUGUESA
Solange Franci Raimundo Yaegashi
Universiade Estadual de Maringá
Tacianne Mingotti Carpen
Centro Universitário de Maringá


RESUMO

O termo variedade lingüística refere-se às diferentes maneiras de pronunciar uma palavra, decorrentes de fatores sociais, culturais e geográficos. Este trabalho teve por objetivo realizar um diagnóstico psicopedagógico de um sujeito falante da variedade não-padrão do português falado no Brasil, a fim de analisar as questões que envolvem a fala e a aquisição/desenvolvimento da linguagem escrita na prática pedagógica. O sujeito tem 13 anos e 6 meses, é do sexo masculino, encontra-se matriculado na 5ª série do ensino fundamental em uma escola estadual de Maringá – PR, foi encaminhado para avaliação psicopedagógica por apresentar alteração na fala e dificuldades no aprendizado da leitura e da escrita. Para a realização do diagnóstico foram utilizados instrumentos como: anamnese, Entrevista Operativa Centrada na Aprendizagem (EOCA), Faz de conta, provas piagetianas, provas projetivas psicopedagógicas, Teste de Desempenho Escolar (TDE) e jogos lúdicos. Ao final, foi constatado que o sujeito não apresenta alteração fonética e/ou fonológica, mas sim marcas de variedade lingüística. Além disso, apresenta dificuldades na leitura e na escrita, sem alterações cognitivas, necessitando, portanto, de apoio psicopedagógico. Foi possível perceber que a variedade lingüística interfere de modo significativo na educação, porque ao não reconhecer a existência de uma multiplicidade de variedade do português, a escola tenta impor sua norma lingüística, com se essa fosse, de fato, a língua comum a todos os brasileiros.
Palavras-chave: Variedade Lingüística, Dificuldades de Aprendizagem, Diagnóstico Psicopedagógico.



Introdução


A literatura aponta que há, no Brasil, uma carência de reflexão teórica envolvendo os problemas de aprendizagem da língua materna. A prática pedagógica no ensino-aprendizagem da língua portuguesa reforça essa constatação à medida que não tem se apresentado associada às determinações sociais e sociolingüísticas que fundamentam os conhecimentos acerca das relações entre linguagem, sociedade e escola.


Cagliari (2001) considera que os diferentes modos de falar acontecem porque a língua portuguesa, assim como qualquer outra língua, é um fenômeno dinâmico, pois está em constante evolução. Portanto, o uso diferenciado ao longo do tempo e em diferentes grupos sociais faz com que a língua se transforme em um conjunto de falares diferentes ou dialetos, todos muito semelhantes entre si, embora cada qual apresentando suas peculiaridades com relação aos aspectos lingüísticos.


Lingüistas e estudiosos do processo ensino-aprendizagem do português como língua materna vêm apontando em suas pesquisas algumas contradições e equívocos desse processo. Embora haja iniciativa e esforço, tanto dos pedagogos quanto dos profissionais de áreas afins, ainda não se chegou a um consenso e, lamentavelmente, a uma prática efetiva no ensino-aprendizagem da língua materna. Autores como Geraldi (1996), Lemle (2000) e Marcuschi (2001), acreditam que este fato está diretamente relacionado ao modo como a oralidade e a escrita têm sido tratadas e relacionadas na prática pedagógica.


Para compreender a relação entre oralidade e escrita é fundamental considerar as relações que a Lingüística estabelece entre essas duas modalidades da linguagem, como adverte Santana (2002). Para a autora, a Lingüística tradicional relacionava a oralidade e a escrita como dicotomias, numa caracterização baseada em diferenças. Um dos defensores deste pressuposto foi Saussure (1981), que define língua e escrita como dois sistemas distintos de signos e considera esta última como representação da fala. Entretanto, tal função representacional da escrita ainda prevalece para alguns autores, implicando em diversos aspectos, sobretudo, no ensino da língua materna.


Historicamente a escrita foi considerada a verdadeira forma de linguagem, cujas concepções existentes a determinavam como uma modalidade de estrutura complexa e formal, enquanto a fala, por ser instável, de estrutura simples e informal, não poderia constituir objeto de estudo. Esses estudos, porém, não resultaram em comparação entre oralidade e escrita, mas acentuaram a especificidade de cada uma, embora a primeira seja classificada como primária e a segunda como dela derivada. Para Fávero, Andrade e Aquino (2002), a gramática contribuiu para o surgimento de uma postura polarizada e preconceituosa, visto que trata as relações entre fala e escrita estabelecendo como parâmetro esta última.


Segundo Geraldi (1996), o desenvolvimento de pesquisas a respeito do funcionamento da linguagem em sua modalidade oral permitiu constatar que entre as duas modalidades (fala e escrita) há diferenças e semelhanças, no entanto, uma pode interferir sobre a outra. O autor afirma que o processo de construção histórica da escrita permitiu uma reflexão sobre a linguagem em geral e sobre a língua em particular. Concomitantemente, a modalidade escrita passou a ser usada como uma “estratégia” para normatizar a fala, uma vez que a escrita seria a língua dita correta. Nesse sentido, o correto seria falar como se escreve.


Bagno (2002) adverte que a gramática normativa deve ser aplicada com critérios pelo professor, no sentido de duvidar sobre o que está dito no livro, questionar a validade das explicações e selecionar as informações, tomando como base seu próprio saber lingüístico. O professor não deve reproduzir a gramática tradicional, mas refletir sobre tal e produzir seu próprio conhecimento. Sabe-se que a afirmação “o certo é falar assim porque se escreve assim” é uma prática milenar que reflete, negativamente, na educação. O professor deve orientar aos alunos que falam / pranta /, / grobo /, / vorta /, / ponhá /, / noís /, / bobra /, que a escrita deve ser diferente da fala, pois precisa obedecer à variedade padrão, para que possa ser compreendida por todos.


Para Abaurre (2005), deveria fazer parte da formação do professor um conjunto de informações sobre como as línguas evoluem no tempo, como se manifestam, como variam de acordo com as classes sociais e regionais, pois muitos professores não percebem que a língua se transforma com o passar do tempo e acreditam numa língua estática e monolítica, que é a concepção encontrada na gramática normativa. Assim, o professor teria mais segurança para aceitar a variedade lingüística dos alunos e informá-los da existência de outras.


Este trabalho teve por objetivo realizar um diagnóstico psicopedagógico de um sujeito falante da variedade não-padrão do português falado no Brasil, a fim de analisar as questões que envolvem a fala e a aquisição/desenvolvimento da linguagem escrita na prática pedagógica.


Embora a questão da variedade lingüística no contexto escolar seja um problema teoricamente conhecido como crucial para o ensino-aprendizagem da Língua Portuguesa parece ser negligenciada, quer na elaboração de programas pedagógicos e políticas de ação voltadas à comunidade, quer na própria formação do professor.  Sendo assim, faz-se necessária a busca de maior compreensão da natureza do processo lingüístico, visando, sobretudo, alertar a escola para a necessidade de assumir a existência de muitos tipos de língua falada, compreender as variedades lingüísticas levando em consideração a linguagem apresentada pelo aluno, para melhor intervir nas possíveis dificuldades de aprendizagem e, logo, propiciar que o alfabetizando torne-se um sujeito autônomo em seu discurso e em suas produções gráficas.



Método


Procedimentos para a realização do estudo

O estudo em questão foi realizado com um aluno matriculado na 5ª série de uma escola estadual de Maringá–PR, encaminhado pela orientadora pedagógica para avaliação psicopedagógica em uma clínica-escola de uma Instituição de Ensino Superior de Maringá. No primeiro momento a mãe do aluno foi esclarecida a respeito dos objetivos do estudo e seus procedimentos. Na ocasião também foi assinada a autorização para a aplicação das provas e testes para diagnóstico e uma possível intervenção. Posteriormente foi realizada a anamnese com os pais da criança.


Durante o estudo foram realizadas entrevistas com os professores e aplicado um questionário para os mesmos responderem. As atas do conselho de classe foram analisadas, bem como a pasta individual do aluno, onde consta o laudo de alguns dos profissionais que realizaram uma avaliação por solicitação da equipe pedagógica. O material do aluno também foi analisado, a fim de compreender as ocorrências das alterações gráficas e seu desempenho durante as atividades. Foram realizadas ainda observações dentro e fora da sala de aula, com intuito de verificar seu comportamento e relacionamento social.


Para a realização do diagnóstico psicopedagógico foram utilizados os seguintes instrumentos: anamnese, Entrevista Operativa Centrada na Aprendizagem (EOCA), provas piagetianas, provas projetivas psicopedagógicas, Teste de Desempenho Escolar (TDE) e jogos lúdicos. Entretanto, serão levados em consideração neste estudo apenas os resultados obtidos nas atividades pedagógicas tendo em vista o objetivo da pesquisa, já citado anteriormente.


É importante ressaltar que o diagnóstico psicopedagógico foi realizado por uma fonoaudióloga com formação em Psicopedagogia, e supervisionado por uma professora universitária com formação em Psicologia Educacional e Psicopedagogia.


Apresentação do sujeito

O sujeito, referido como Victor (nome fictício), tem 13 anos e 6 meses. De acordo com a orientadora pedagógica, o aluno apresenta alteração na fala e dificuldades de aprendizagem, manifestadas na leitura, escrita e interpretação textual. Estuda nesta escola desde a 1ª série do ensino fundamental, concluída no ano de 2000, com o auxílio da professora da sala de recursos. Durante os anos seguintes Victor continuou apresentando dificuldade para aprender o conteúdo abordado, sendo necessário permanecer na sala de recursos. Apesar do desempenho da equipe pedagógica, foi reprovado na 4ª série, no ano de 2003. Atualmente, Victor encontra-se na 5ª série e continua freqüentando a sala de recursos, duas vezes por semana, durante duas horas.


A professora da sala de recursos não tem hipóteses formuladas referentes à queixa, apenas, acredita que Victor “escreve mal porque fala mal”. Diante dos exemplos assumidos pela professora, fica evidenciado que, em alguns momentos, Victor parte da fala para a escrita e não da escrita para a fala. O mesmo ocorre com a criança em fase de aquisição da escrita e reflete de certa forma, a concepção que se tem da escrita como uma representação da oralidade.



Resultados e Discussão


Análise da Leitura, Interpretação de Texto e Produção Escrita

Os Aspectos Notacionais e Discursivos da Escrita foram avaliados por meio de leitura, interpretação textual e produções gráficas, espontâneas e relacionadas ao tema lido e discutido previamente.


Para exemplificar uma produção gráfica realizada pelo aluno, depois de leitura e interpretação textual, faz-se necessário descrevê-la detalhadamente, a fim de abordar os processos utilizados pelo mesmo durante a elaboração do texto, evidenciando sua relação com os aspectos sintáticos, semânticos e pragmáticos da linguagem.


Ao entrar na sala, Victor encaminhou-se diretamente à mesa, logo começou a “observar” os livros de literatura infanto-juvenil que estavam dispostos sobre a mesma. A pesquisadora solicitou que escolhesse um dos livros e, depois de explorá-los, selecionou “Ali Babá e os 40 Ladrões”. Foi orientado a ler a história com atenção e, durante a leitura pôde-se observar que, embora o aluno tenha realizado uma leitura lenta, foi fluente, por ter respeitado os sinais de pontuação presentes no texto. Em seguida, foi estimulado a “recontar” a história do livro lido. No primeiro momento mencionou “não saber, ser burro”, contudo, depois de ter manifestado certa resistência relatou a história de modo coerente, conforme descrito a seguir:


“Ali Babá foi a uma caverna e lá ele encontrou muito ouro, mas quando saiu da caverna foi visto por um ladrão que queria pegar ele por causa do ouro. O ladrão combinou com os outros ladrões para roubar Ali Babá no dia do seu casamento com a princesa. Mas Ali Babá ouviu uma conversa e desconfiou do plano que eles estavam armando, então mandou o guarda prender todos os ladrões. Depois disso, ele e a princesa viveram felizes para sempre”.(Victor)


A partir da transcrição acima fica evidenciado que o aluno compreendeu a história, pois elaborou um início, meio e fim de acordo com o livro. Embora este tenha narrado de modo sintetizado com omissão de algumas partes, salienta-se que não fantasiou fatos e personagens.


Depois da leitura e discussão da história do “Ali Babá e os 40 Ladrões”, o aluno foi solicitado a escrevê-la.  Victor mencionou, novamente, “eu não sei escrever, sou burro”, no entanto, conseguiu concluir sua interpretação sem o auxílio da pesquisadora. Na análise de sua produção gráfica, foram constatadas alterações referentes aos aspectos notacionais e discursivos da escrita, uma vez que apresentou dificuldade na relação grafema/fonema (por exemplo: / preços / para “presos”), inversão de letras (por exemplo: / uoro / para “ouro”), omissão (por exemplo: / oviu / para “ouviu”), apoio na oralidade (por exemplo: / / para “ver”), hipersegmentação (por exemplo: / a onde / para “aonde”) e uso indevido de letras maiúsculas e minúsculas, sendo que por vezes usou letra maiúscula após a vírgula e minúscula em início de frase.


Em relação aos aspectos discursivos foi constatado ausência de pontuação (sobretudo, vírgula) e acentuação. Além disso, apresentou dificuldade para usar os conectivos de ligação (por exemplo: / o guardas / para “os guardas”) e a concordância verbal (por exemplo: / ficam feliz para sempre / para “ficaram felizes para sempre”), de acordo com as regras gramaticais, prejudicando, de modo significativo, a coerência do texto.


Autores como Cagliari (2001) e Zorzi (1998) referem que a possibilidade de “errar” é maior durante a produção de textos espontâneos, uma vez que este tipo de enunciado exige maior concentração por parte do sujeito e, evidentemente, maior domínio das regras ortográficas. Em todos os textos produzidos, Victor apresentou alterações nos aspectos discursivos e notacionais da escrita, entretanto, conseguiu elaborar enunciados coerentes ao tema, com seqüências lógicas condizentes com seu domínio lingüístico (léxico).


Análise dos resultados apresentados no Teste de Desempenho Escolar (TDE)

O aluno recebeu orientações a respeito do subteste de escrita e, sobretudo, seus procedimentos: ditado de uma palavra, leitura de uma frase com esta palavra para depois ditá-la novamente. Embora orientado, Victor escreveu a palavra ditada antes da leitura da frase, por muitas vezes. Obteve 21 pontos no escore bruto, sendo que o escore máximo para o Subteste de Escrita chega a 35 pontos. Conseguiu 1 ponto ao escrever seu nome corretamente e 20 pontos correspondentes ao acerto de 20 palavras. Escreveu: / mas / para “mais”,                         / descunhecido / para “desconhecido”, / sorturno / para “soturno”, / varoniu / para “varonil”,     / digeri / para “digerir”, / forticação / para “fortificação”, / calafril / para “calafrio”,                  / lesgitimidade / para “legitimidade”, / indostrialização / para “industrialização”,                      / comesislizar / para “comercializar”, / ajulizar / para “ajuizar”, / discrivativa / para “discriminativa”, / impetolidade / para “impetuosidade”, / cimilaridade / para “similaridade”.


No Subteste de Escrita foram constatadas alterações nos aspectos notacionais (omissão, adição, substituição e inversão de letras) e nos aspectos discursivos da escrita (uso assistemático da acentuação gráfica). É de suma importância salientar que as alterações discursivas mencionadas não são descritas no teste e, tampouco, consideradas incorretas, logo, não interferiu na pontuação obtida. Utilizando-se a tabela 6 das normas para a 5ª série, fica evidenciado que este aluno apresenta um desempenho inferior no Subteste de Escrita.


Em virtude do seu grau de escolaridade, foi realizada somente a parte escrita do Subteste de Aritmética, apresentada em forma de problemas. Victor respondeu rapidamente as operações de adição, subtração e divisão. Apresentou maior dificuldade naquelas que envolviam multiplicação, sobretudo, na tabuada. Perguntou à pesquisadora quanto era “6 x 8”, esta, por sua vez, negou-se a responder, além de solicitar que retomasse desde o início da tabuada, em caso de dúvida. Neste momento o aluno passou a vocalizar, contando nos dedos: “se 6 x 6 é 36, 6 x 7 é 42, então 6 x 8 é 48”. Até a questão número 12 não precisou do auxílio dos dedos, fato ocorrido a partir da questão número 13. Obteve 28 pontos no Subteste de Aritmética, sendo que o escore máximo chega a 38 pontos.  Isto indica que o aluno apresentou um desempenho superior ao esperado para sua série.


O Subteste de Leitura do TDE é composto por 70 palavras, comumente conhecidas na língua, com exceção de algumas. O aluno leu as palavras na ficha do examinador, enquanto a pesquisadora sublinhava no caderno de aplicação todas as palavras lidas incorretamente.


Victor leu: / apricado / para “aplicado”, / atrás / para “atlas”, / echausto / para “exausto”,              / trouche / para “trouxe”, / achendo / para “azedo”, / dures / para “durex”, / losooso / para “luxuoso”, / sangóis / para “saguões”. Logo, acertou 62 palavras obtendo um escore bruto igual a 62 pontos. De acordo com a tabela das normas para a 5ª série o aluno apresentou um desempenho inferior no Subteste de Leitura.


No que se refere à oralidade, foi constatado que Victor apresenta “marcas de variedade lingüística”, considerada por muitas pessoas como “alteração na fala”. Esta variedade lingüística manifestada em determinadas palavras (por exemplo: / grória / para “glória”,         / probrema / para “problema”, / bicicreta / para “bicicleta”, / fror / para “flor”, / oreia / para “orelha”, / memo / para “mesmo”, / vamo / para “vamos”) também foi constatada no discurso da mãe de Victor. Portanto, o fato de a escola não reconhecer a verdadeira diversidade do português falado no Brasil, acaba fazendo com que a mesma tente impor sua norma lingüística como se esta fosse, de fato, a língua comum a todos os brasileiros, independente de sua idade, de sua origem geográfica, de seu contexto socioeconômico, de seu grau de escolarização (BAGNO, 2002).


Em síntese, durante o processo de avaliação, o aluno apresentou intenção comunicativa com a pesquisadora e demais pessoas envolvidas (orientadora pedagógica e professores) sendo este um fator fundamental para a realização de um trabalho efetivo. Sua emissão oral a nível sintático/semântico está preservada, uma vez que, durante seu discurso foi possível compreender sua mensagem. O mesmo faz uso adequado de conceitos, emite dentro de um contexto, respeita noções de tempo e espaço, seqüencializa fatos, utiliza um vocabulário amplo com frases completas.


Quanto à recepção oral a nível sintático/semântico, pode-se afirmar que também não há alteração neste aspecto, pois o aluno compreende e exercita ordens simples e complexas, além de saber recontar fatos do cotidiano.



  1. Considerações finais


No presente estudo ficou evidenciado que a variedade lingüística implica na educação, normalmente, por não ser compreendida como uma das diversas formas existentes da língua, assim como a própria língua não é compreendida como um fenômeno dinâmico que se transforma ao longo do tempo. Nesta perspectiva, o aluno falante do português não-padrão, passa a ser rotulado como “problemático”, “indisciplinado”, “ignorante”.


É imprescindível que o aluno tenha conhecimento de que existem muitos tipos de língua falada e saiba que as variedades lingüísticas podem ser utilizadas de acordo com o contexto, diferentemente da escrita, que para ser compreendida por todos, deve obedecer à norma culta. Não está se defendendo, com esta afirmação, que a escrita é mais elaborada, mais organizada, mais bonita, como adverte Santana (2002). Certamente, este trabalho deverá ser realizado ao longo dos anos, nunca como ponto de partida para o ensino-aprendizagem.


Lamentavelmente, a questão da variedade lingüística não é abordada na formação do professor, sendo por vezes, tratada como uma simples alteração de fala. Acredita-se que este estudo auxiliará muitos educadores que buscam respostas para as dificuldades encontradas no ensino-aprendizagem de seus alunos, uma vez que o tema é complexo, de suma importância, pouco discutido entre os profissionais das áreas afins. Entretanto, há necessidades de novas pesquisas sobre variedade lingüística e sua relação com a aprendizagem, tanto no contexto institucional quanto no clínico, a fim de favorecer a processo de desenvolvimento lingüístico, social e cultural do sujeito aprendente e torná-lo autônomo em diversos aspectos.


O educador, enquanto fonte de conhecimento, interlocutor privilegiado, mediador da aprendizagem, saberá criar situações discursivas e interacionais para favorecer o aprendizado de seus alunos. Isso implica em uma nova postura, uma postura de estar sempre em contato com as questões que podem contribuir para este processo. O educador como sujeito crítico, em contato diário com seus alunos, buscando compreender suas dificuldades e, sobretudo, valorizando suas potencialidades, pode desenvolver uma prática pedagógica transformadora e uma intervenção terapêutica significativa.



Referências


ABAURRE, B. É preciso Esquecer a “Cultura do Erro”. Artigo recebido em 17 de agosto de 2005. Disponível em: www.fae.ufmg.br:8081/ceale/noticias/bernadete


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