http://www.psiquiatriainfantil.com.br/congressos/uel2007/223.htm


Londrina, 29 a 31 de outubro de 2007 – ISBN 978-85-99643-11-2

A IMPLEMENTAÇÃO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL NO COTIDIANO DA ESCOLA REGULAR
Rute Abelha Januário
Pedagoga especializada em Educação Especial/Área DM – CESULON/Londrina/PR
Escola Especial Maria Mendes Valente – Bela Vista do Paraíso/PR
Professora PDE – SEED/PR


RESUMO

O objetivo do presente trabalho, com um caráter de ensaio teórico, é mostrar que a implementação da Educação Especial no cotidiano da escola regular constitui uma problemática digna da reflexão desencadeada por todos aqueles que se envolvem nesse processo. Na atualidade todo assunto relacionado à educação vem sendo direcionado à questão da educação inclusiva. A política de educação inclusiva que segue o princípio de educação para todos tem suscitado discussões e debates referentes à proposta que é inovadora, polêmica e complexa. A troca de experiências entre os profissionais da área, o enriquecimento de informações sobre a realidade e as necessidades de cada um e a diversidade dos temas que abrange torna possível perceber o quanto são comuns as angústias e fragilidades vivenciadas e a necessidade de busca de soluções para as mesmas. A realidade do ensino regular e da Educação Especial no país tem demonstrado que a proposta de educação inclusiva, enquanto um instrumento de construção da cidadania e de rompimento das desigualdades sociais, tem tomado rumos divergentes e, muitas vezes, até incoerentes e inconsistentes, realizando um caminho inverso ao daquele que foi preconizado inicialmente. Isto revela que a educação ainda submete-se a uma política social dominante e realmente excludente, do mesmo modo pelo qual se caracteriza a sociedade contemporânea, colocando em discussão a compreensão que se tem a respeito das relações existentes entre escola e sociedade.

Palavras-chaves: Educação inclusiva; Educação especial; Relações escola-sociedade; Desigualdades sociais; Políticas públicas.

Introdução
Políticos, profissionais da área educacional ou mesmo de outras áreas, afirmam em meios de comunicação, em palestras ou, ainda, em suas próprias obras, que a educação pode transformar uma pessoa. Nesse sentido, julgam que o processo educacional pode levar o indivíduo a tornar-se de fato um cidadão e, conseqüentemente, ser capaz de exercer, de maneira consciente e plena, seus direitos e deveres.
A falta de cidadania é praticamente uma deficiência coletiva e um dos problemas causados por esta situação é a desigualdade e a exclusão social. Análises realizadas sobre a organização escolar e seu desenvolvimento têm apontado para a questão de um paradigma que tem se firmado com o passar dos anos, que é em relação à escola enquanto reprodutora de desigualdades sociais. Situação esta que se agrava, quando o foco da educação direciona-se para a Educação Especial e para os alunos portadores de necessidades educacionais especiais.
Temos conhecimento das implicações, de caráter negativo, no processo de formação das pessoas institucionalizadas e como interferem em suas constituições como indivíduos (KASSAR, 1999).
Sabemos também de alunos com necessidades educacionais especiais matriculados no ensino regular, cuja inclusão ocorre somente de forma física ou estatística (CARVALHO, 2004).
O que queremos compreender é: O que há de especial na educação das pessoas com necessidades educativas especiais que estão na rede regular de ensino? Quem são os alunos com necessidades educacionais especiais e quais são as suas necessidades? Como trabalhar para a inclusão desses alunos? Então, buscando o entendimento destas questões, esperamos dar um passo à frente na busca de uma educação melhor e realmente para todos.
A Educação Especial que tem como objetivo promover a educação dos indivíduos com necessidades educacionais especiais – cujas causas podem ser de origem patológica, social, econômica, cultural ou uma combinação multifacetada de quaisquer destas – enfrenta, hoje, um dilema, que tem levantado discussões favoráveis e contrárias quanto à inclusão de alunos especiais no ensino regular.

Método
Refere-se a um projeto de estudos e aprimoramento profissional de reflexão, discussão e construção de conhecimento articulado entre os dois níveis educacionais – educação básica e ensino superior – prevendo a socialização com outros professores da rede estadual, na etapa de formação de grupos de trabalho em rede/GTR, além do planejamento de uma intervenção na escola baseada nas propostas de capacitação continuada instituída pelo Programa de Desenvolvimento Educacional/PDE da Secretaria de Estado da Educação do Estado do Paraná-SEED/PR.
A implementação da educação especial como uma modalidade de ensino da educação básica e as especificidades do trabalho pedagógico com alunos com necessidades educacionais especiais caracteriza o foco deste trabalho, cujo caráter de ensaio teórico pretende favorecer a construção de subsídios para a análise e a reflexão acerca desse processo.

Resultado
Alguns temas relacionados com essa proposta de reflexão constituem objeto de estudo neste trabalho e o resultado almejado com a presente proposta é analisar, numa perspectiva crítica, aspectos como os apontados adiante.
Há que se entender que tradicionalmente os portadores de deficiência ou de necessidades educativas especiais sempre foram vistos como um problema, sob a ótica estereotipada e estigmatizada. Esses indivíduos foram mantidos à margem da sociedade, considerados por alguns como doentes e pela maioria como incapacitados e totalmente dependentes.
Os alunos com necessidades educacionais especiais por muito tempo pagaram um preço muito alto pela sua condição de deficiente. Sassaki (1999) considera que esses indivíduos foram vítimas de um processo de exclusão social. Essa exclusão ocorria em sentido total, em que esses indivíduos eram excluídos da sociedade para qualquer atividade, porque antigamente eram considerados inválidos, sem utilidade para a vida em sociedade e incapazes para trabalhar – características estas atribuídas indistintamente a todos que tivessem alguma deficiência.
A proposta de educação inclusiva surge com o intuito de dar aos alunos com necessidades educacionais especiais a mesma oportunidade que é dada a qualquer outro aluno considerado como “normal”, favorecendo assim, a igualdade de direitos, reduzindo a exclusão social e viabilizando a construção da cidadania. “A Educação Inclusiva se caracteriza como uma política de justiça social que alcança alunos com necessidades educacionais especiais” (ROSA, 2004, p. 11).
Esta proposta educacional é formulada numa perspectiva histórica e sociológica baseada num movimento que transformou uma sociedade de traços inclusivos em uma sociedade excludente. Resultado de uma sociedade moderna, individualista, competitiva, consumista e narcisista (LAPLANE, 2006).
A distribuição eqüitativa dos benefícios sociais, culturais e políticos que a sociedade contemporânea tem sido capaz de produzir, ainda não demonstra a mesma capacidade para repartir. Essa complexa situação vai influenciar diretamente no processo de inclusão e/ou exclusão do aluno portador de necessidades educacionais especiais, isto porque a sociedade que exclui é a mesma que inclui e integra, que cria fórmulas também desumanas de participação na medida em que traz condições de privilégios e não de direitos (MARTINS, 2002).
A história da Educação Especial tem se constituído na história da nossa sociedade com um desenvolvimento contraditório. Sua evolução é marcada por um comprometimento nas parcerias de atendimento entre os setores público e privado, não havendo previsão direta de atendimento a pessoas com deficiências severas pelo serviço público, principalmente no setor educacional (KASSAR, 1999).
Nesse mesmo sentido,
historicamente, a educação especial se constitui como um sistema paralelo de ensino e se responsabilizou pelo atendimento da população com deficiência atendendo a dois interesses contraditórios: o de oferecer escolaridade a crianças com deficiência, ao mesmo tempo em que serve de instrumento básico para sua segregação (BUENO, 1997, apud MELETTI, 2007, p. 1).
Para a autora, a escola regular passou a representar no âmbito das práticas educacionais, um local onde possivelmente a integração poderia ser concretizada, porém, no universo escolar e no cotidiano da sala de aula, a realidade tem sido outra.
Nessa mesma perspectiva, ainda, Bueno (1999) refere que o ensino regular tem excluído considerável parcela de sua população, sob a justificativa de que esta não reúne condições para usufruir do processo escolar, porque apresenta problemas pessoais, familiares ou carências culturais.
Conforme Libâneo (2003),
exigir níveis de chegada igual para diferentes pontos de partida é um fator de exclusão. (...) a melhor política de inclusão para as crianças e jovens portadoras de necessidades especiais, nas condições atuais do ensino regular do nosso país ainda é oferecer-lhes cuidados especiais, atendimento especial com educadores qualificados para as várias necessidades a atender e com possibilidade de atendimento em grupos pequenos ou de forma individualizada, sob a responsabilidade do poder público e de instituições especializadas.
Ainda nesse mesmo enfoque, este autor afirma um temor de que as ações de organização estrutural e de ensino, “tidas como democráticas, justas, solidárias e destinadas à inclusão nas escolas regulares dos alunos portadores de necessidades especiais, sejam de fato provocadoras de mais exclusão, mais discriminação e mais marginalização”, produzindo, contrariamente, efeitos diferentes daqueles que são esperados nas propostas vigentes.
Questiona-se, então: Se o ensino regular já exclui alunos que se enquadram dentro deste perfil, como poderá dizer-se inclusiva? Como irá viabilizar uma educação inclusiva ao portador de necessidades educacionais especiais?
Pelo que se percebe desse quadro aqui apresentado, a resposta é que não viabilizará nenhum tipo de inclusão, pois somente favorece a exclusão, a segregação social, mantendo o ciclo de uma política educacional e social totalmente fora das premissas e diretrizes que propõem uma educação para todos, para a diversidade e para a cidadania.
Kassar (1999) mostra, também, que a Educação Especial tem desacreditado da capacidade de seus alunos apropriarem conhecimentos como outros, criando, assim, um princípio de ineducabilidade para seus educandos.
Assim, a educação especial é excludente, na medida em que considera que, por suas próprias características, o aluno com necessidades especiais não possui condições para receber o mesmo nível de escolarização que as crianças normais (BUENO, 1999).
O que se tem na atualidade, é uma educação para a minoria e não para a maioria, reafirmando uma intensa e antiga luta pela igualdade social. “Na raiz de todos esses problemas está a dificuldade em desatar o nó de uma organização social onde impera o capitalismo selvagem” (JANUZZI, 1999, p. 137).

Discussão
Com o intuito de socializar os questionamentos e as reflexões suscitadas e na busca de superação das reais necessidades de enfrentamento dos problemas da Educação Básica em relação às propostas de inclusão, a pretensão é que atividades diversificadas sirvam de recursos e estratégias adequadas para a realização dos grupos de estudos e discussão como os necessários na realidade identificada.
Dentre as atividades que podem ser propostas, destacam-se:
·    ESTUDOS ORIENTADOS: Fundamentação teórica, através de livros, textos, artigos, teses, pesquisas bibliográfica, dentre outros.
·    ATIVIDADES DE FORMAÇÃO E INTEGRAÇÃO EM REDE – PDE: Ocorrerão a partir do segundo período, de acordo com o planejamento e organização a serem divulgadas pela coordenação geral do PDE-SEED/PR.
·    ELABORAÇÃO DE MATERIAL DIDÁTICO: Elaboração de um material didático específico, a ser definido de acordo com as demandas verificadas na implementação das reflexões aqui propostas.
·    IMPLEMENTAÇÃO DA PROPOSTA DE INTERVENÇÃO NA ESCOLA: Prevê grupos de estudos para professores das escolas especiais e regulares, para análise e compreensão da temática abordada.
·    AVALIAÇÃO E REGISTRO DOS RESULTADOS DO TRABALHO: Ocorrerá por meio de registro de atividades realizadas durante os dois anos de estudo, dos debates sobre os temas abordados, da socialização das propostas das áreas específicas pelas orientações das propostas do plano.
Análise dos resultados obtidos nos grupos de estudos para reflexão sobre mudanças e permanências nos modos de pensar e trabalhar com alunos com necessidades educativas especiais e possibilidades de ação ampliada devido à nova leitura que se faz necessária são esperadas após a implementação desta proposta de trabalho e da reformulação da compreensão do que sejam necessidades especiais.
         
Referências
BUENO, J. G. S. A educação inclusiva e as novas exigências para a formação de professores: algumas considerações. In. BICUDO, M.A.V. & SILVA JÚNIOR, C.A. (org.). Formação do educador e avaliação educacional: formação inicial e continuada. v. 2. São Paulo: UNESP, 1999. p. 149-164 (Seminário e debates).
JANUZZI, G.S.M. O docente e a educação integradora. In. Formação do educador e avaliação educacional: formação inicial e continuada. v. 2. São Paulo: UNESP, 1999. p. 131-137. (Seminário e debates).
KASSAR, M. C. .M. Deficiência múltipla e educação no Brasil: discurso e silêncio na história de sujeitos. São Paulo: Autores Associados, 1999.
LAPLANE, Adriana. Uma análise das condições para a implementação de políticas de educação inclusiva no Brasil e na Inglaterra. Educ. Soc. Campinas, v. 27, n. 96. Especial, p. 689-715.
LIBÂNEO, J.C. O projeto de educação nacional: a desatenção aos critérios de qualidade das aprendizagens escolares. (Texto de palestra transcrito de gravação revisto pelo autor). Goiânia: 17 set. 2003.
MARTINS, J. S. A sociedade vista do abismo: novos estudos sobre exclusão, pobreza e classes sociais. Petrópolis: Vozes, 2002.
MELETTI, Silvia M. F. Políticas de educação inclusiva e a educação da pessoa com deficiências no Brasil. In: IX SEMANA DE EDUCAÇÃO. Políticas e gestão da educação: dilemas e perspectivas. Anais. Londrina, 28 a 31 de maio, 2007.
PARANÁ. SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO. SUPERINTENDÊNCIA DA EDUCAÇÃO. COORDENAÇÃO DO PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL/PDE. Uma nova política de formação continuada e valorização dos professores da educação básica da rede pública estadual: documento-síntese. Curitiba: 2007.
ROSA, S.P.S. Fundamentos teóricos metodológicos da inclusão. Curitiba: IESDE, 2004.
SASSAKI, R. K. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. 3. ed. Rio de Janeiro: WVA, 1999.