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Londrina, 29 a 31 de outubro de 2007 – ISBN 978-85-99643-11-2

A INCLUSÃO DOS ALUNOS SURDOS NO ENSINO MÉDIO REGULAR: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA
Maria Edileuza Selleri
IEEL-Instituto Estadual de Educação de Londrina
Professora PDE - SEED/PR – 2007
Monografia: curso de Pós Graduação
Educação Especial: Atendimento às Necessidades Especiais
ESAP – Londrina/Pr, 2006.


RESUMO
                                                                                                                 
O presente estudo teve como objetivo conhecer a História da Educação do Surdo e as concepções que a determinaram ao longo do tempo, a visão atual da surdez e a proposta de Educação Bilíngue para Surdos, além da  Legislação e das Políticas Públicas de Educação Especial. Justifica-se a intenção da pesquisa, pois a grande maioria dos profissionais que atuam hoje nas Escolas Regulares e estão recebendo os alunos  de inclusão, entre eles os Surdos, não tiveram em sua formação qualquer capacitação nessa área, necessitando de conhecimentos para fundamentar sua prática e poder avaliar e replanejar continuamente o trabalho desenvolvido. Como metodologia de trabalho foram utilizados: Pesquisa Bibliográfica onde enfocamos além da visão atual da surdez, as questões da Inclusão Escolar e da Educação Bilingue para Surdos à luz da Legislação e em confronto com a realidade e Estudo de Caso dos alunos Surdos do IEEL- Instituto Estadual de Educação de Londrina através de relato de experiência. Como resultado do trabalho enfatizamos a necessidade de reconhecimento do Surdo como indivíduo diferente mas pleno e capaz, possuidor de língua e cultura próprias de sua Comunidade, que deve ter respeitados todos os seus direitos, entre eles o direito à educação com igualdade de  oportunidades para o acesso e permanência na escola e o acesso aos níveis mais elevados de escolarização.

Palavras-chave: Educação, Surdez, Inclusão, Bilingüísmo.

Introdução

Vivemos em um mundo em constante transformação, onde mudanças acontecem de um instante para o outro e notícias voam  pelo mundo, impulsionadas pelas novas tecnologias. Interessante notar o contraste: neste mesmo contexto histórico, existem tantos conceitos e preconceitos enraizados em nós, que perpassam séculos e mesmo ultrapassados e desmistificados, na prática cotidiana, continuam a direcionar nossa atitudes.
Hoje na área da educação muito se ouve falar em inclusão, em educar na diversidade, em respeitar as diferenças, de onde a necessidade de buscar bases teóricas e científicas sobre esses temas que possam fundamentar a prática, na busca de mudanças que levarão efetivamente à melhoria da educação, sem atitudes inconseqüentes ou incoerentes que podem por a perder todo o esforço já realizado.No passo da discussão sobre inclusão se levanta uma corrente que defende a matrícula de todos os alunos na escola regular, independente de terem alguma deficiência, do grau de comprometimento físico/mental/emocional, ainda que esse aluno demande cuidados específicos. Na contra mão desta vem outra corrente, apoiada na discussão sobre o respeito às diferenças, defendendo as conquistas alcançadas a duras penas no campo da educação especial, o direito de ser diferente e de ter atendidas suas necessidades especiais.
Penso que todo radicalismo é perigoso e, invariavelmente, negativo e que passar de um extremo de segregação institucional, ou da integração que na verdade perpetuava a segregação por exemplo nas classes especiais, para outro extremo em que se desmonte toda uma estrutura de atendimento e se jogar esse alunos todos dentro das salas de ensino regular, onde os problemas já são  tantos e onde ainda se dão os primeiros tímidos passos na direção de uma  educação na diversidade, que se espera possa dar conta  dos diferentes entre os ditos normais é, no mínimo, temeroso, considerando que mesmo as maiores convicções mudam.
Nesse contexto geral surgem as questões relacionadas à educação dos surdos, como por exemplo:  Escola especial ou escola regular? O que é educação bilíngüe para surdos? É possível proporcionar a educação bilíngüe para surdos no ensino regular?  Até que ponto as duas propostas são coerentes entre si, ou em que ponto elas  se encontram? Afinal, a inclusão dos alunos surdos no ensino médio regular, objeto de estudo desse trabalho, precisa ser historicamente, teoricamente e legalmente justificada e a sua efetivação deve ser acompanhada e analisada, numa avaliação contínua, que vai apontar progressos e falhas, propiciando a busca de recursos materiais e humanos e de conhecimentos necessários à efetivação do projeto.
Diante desses fatos, esse trabalho teve como objetivos: conhecer, em linhas gerais, a história da educação do surdo; conhecer a legislação atual relativa à educação especial e a LIBRAS e conhecer a proposta de educação bilíngüe para surdos, para então analisar o trabalho que vem sendo realizado no IEEL - Instituto Estadual de Educação de Londrina, com a inclusão dos alunos surdos no ensino médio regular.


Método

Uma metodologia utilizada constou de pesquisa bibliográfica a respeito da educação de surdos; da educação bilíngüe para surdos; da legislação pertinente e da proposta de educação especial do Paraná em livros, revistas, artigos, publicações de órgãos oficiais; sites da Secretaria de Educação do Estado do Paraná e outros ligados às Comunidades Surdas como FENEIS e INES. Outra metodologia utilizada foi o estudo de caso dos alunos surdos no ensino médio regular do IEEL, através do relato de experiência do trabalho desenvolvido a partir da chegada desses alunos (2004) e mais especificamente no ano letivo de 2005.

Resultado 

Como resultado da pesquisa bibliográfica realizada temos um panorama histórico do conceito de surdez e da educação do surdo, com esclarecimentos sobre a surdez e linguagem do surdo e suas implicações na educação.

O passado nos deu uma idéia do que aconteceu com o Surdo, as restrições filosóficas para que ele fosse considerado humano, os impedimentos religiosos e legais para que ele pudesse exercer seus direitos de cidadão, o papel da política e do Estado para que ele não tivesse sua língua, sua cultura e conseqüentemente poder (ainda que fosse o poder de ser diferente). O tempo todo, o noivo não pode ser mostrado, e, quando o foi (séculoXVIII), foi abafado para que os antigos conceitos prevalecessem (MOURA, 2000, p. 137).

Do contexto geral estudado, destacam-se alguns pontos importantes para esse trabalho, brevemente descritos a seguir. Juntos, recolhidos em instituições religiosas, os surdos criam uma forma de comunicação entre si, desenvolvendo uma língua e uma cultura próprias. Com a necessidade de humanizar o surdo, às vezes filhos de família nobre que precisava da fala para ter seus direitos reconhecidos, surgem as primeiras tentativas de educação do surdo. Alguns educadores reconhecendo a forma de comunicação entre os surdos e aproveitando os sinais criados pelos próprios surdos alcançam resultados surpreendentes enquanto outros, negando a importância dos sinais na educação do surdo, fazem tentativas frustradas de transformar sinalizadores em falantes, concluindo sempre após muito trabalho pela impossibidade de educar o surdo sem a língua de sinais.O desenvolvimento científico traz a visão médica da surdez e o surdo passa a ser visto como doente, deficiente, que precisava ser curado, reabilitado, normalizado, para que pudesse se integrar à comunidade majoritária dos ouvintes.
O oralismo, baseadoem diversas técnicas, dominou a educação do surdo a partir do Congresso de Milão (1880) e durante o século XX até adécada de 60, enquanto isso, a Língua de Sinais proibida na educação do Surdo, continuou a ser usada forada sala de aula pelas crianças e pelos adultos Sudos em suas associaçõers e na Comunidade dos Surdos. Na décadade 60 surgem novos conhecimentos teóricos e estudos realizados sobre a Língua de Sinais provam seu valor linguístico, semelhante às línguas orais, mostrando que os Sinais não só não prejudicam o desenvolvimento oral das crianças Surdas como ajudam seu desenvolvimento escolar; estudos também comprovam que ouvintes e Surdos têm a mesma distribuição de inteligência. No entanto, ainda não é possível falar em Bilingüismo pois estas verdades não são aceitas, naquele momento, pela cultura dominante, assim como ainda hoje não o são totalmente. Surge então uma situação intermediária com utilização dos Sinais como instrumento de comunicação, mas sem utilização da Língua de Sinais, denominada Comunicação Total que, criada não como método mas como filosofia, previa a utilização de toda e qualquer forma de comunicação com a criança Surda,  e não excluia inicialmente  a Língua de Sinais, mas transformou-se em método e forma única de trabalho (denominada Comunicação Bimodal) com utilização da fala acompanhada de sinais.
Com o início de um movimento multicultural de minorias diversas reinvidicando o direito de uma cultura própria, de ser diferente e denunciando a discriminação a que estavam submetidos, os Surdos, a muito tempo conscientes de seus direitos mas sufocados, acham espaço para se fazer ouvir e chegamos assim ao momento histórico atual em que os Surdos passaram a reivindicar o direito de que sua cultura própria seja respeitada e tenha um lugar dentro de outras culturas, particularmente da cultura ouvinte, surgindo na educação de Surdos uma nova proposta de trabalho denominada Bilingüismo.
Segundo Moura (2000) o passado mais que reflete-se na realidade atual, o presente é a reprodução do passado, das mesmas idéias, conceitos e preconceitos. Presente e passado se confundem no mesmo fazer em que as relações, da maioria ouvinte com a minoria surda, vão se refazendo sem modificações  e a escola, que deveria promover a mudança, permanecia ela mesma repetindo o que não faz sentido e não ajuda a construção de uma verdadeira linguagem (ato social e edificador de identidade).E o futuro, marcado pelo passado e pelo presente, aponta para a necessidade de poder destacar o Surdo da representação de um sujeito deficiente, para inserí-lo na Comunidade dos Surdos e no contexto majoritário do mundo ouvinte, como indivíduo diferente mas pleno e capaz, portanto detentor de direitos a serem respeitados.

Não é apenas a mudança da língua em que são transmitidos osos conteúdos ou critérios de avaliação mais justos em relação às diferenças lingüísticas que apresentam o que vai garantir ou orientar uma nova abordagem curricular, mas a compreensão do sujeito surdo em sua totalidade sócio-histórico-cultural (FERNANDES, 1999, p. 79).

Segundo Quadros (1997) há aspectos essenciais a serem considerados para a implantação de uma proposta bilingüe para surdos: primeiro a necessidade de conhecer as duas línguas envolvidas no processo educacional e o lugar que cada uma ocupa, considerando fatores sociais, culturais e lingüísticos. Segundo, o processo de aquisição de L1 (primeira língua, língua nativa) e  aquisição de L2 (segunda língua), no caso da educação de surdos no Brasil LIBRAS (L1) e Língua Portuguesa (L2). Além disso não se pode desconsiderar a importância das questões de ordem psicossocial, fundamentais no processo de formação da pessoa surda enquanto membro sócio-cultural.
No estudo da legislação  que se refere à educação, ao detacar a questão da educação do surdo e fazer um paralelo entre inclusão e respeito à diversidade vemos, já na Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) os princípios da igualdade e da diversidade, nas afirmações de que todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos; que toda pessoa tem direito à instrução e que os pais têm prioridade de direito na escolha do gênero de instrução que será ministrado a seus filhos. A mesm idéia perpassa toda a legislação, até os documentos mais recentes, inclusive o texto da Convenção Interamericana para a  Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra as Pessoas Portadoras de Deficiência, realizada na Guatemala em 1999 e promulgada pelo Decreto 3656/01, que define discriminação e afirma que não constitui discriminação a diferenciação ou preferência adotada para promover a integração social ou desenvolvimento da pessoa com deficiência desde que a diferenciação ou preferência não limite em si mesma o direito à igualdade dessas pessoas e que elas não sejam obrigadas a aceitá-las.
O Paraná saiu na frente no que se refere à educação do surdo quando, através da Lei n.°12095 de 11/03/1998, reconheceu oficialmente a linguagem gestual codificada na Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS e outros recursos de expressão a ela associados, como meio de comunicação objetiva e de uso corrente e, a partir daí, começaram a ser implantadas as ações necessárias à efetivação da educação garantida em seu Art.2º: Como resultado de estudos, reflexões e debates iniciados a partir dos movimentos internacionais pela inclusão social; já tendo reconhecido oficialmente a Língua Brasileira de Sinais e assim desencadeado mudanças em seu sistema educacional e; a partir da nova legislação educacional brasileira, é elaborada a nova legislação educacional do Paraná e o Conselho Estadual de Educação do Estado do Paraná fixa normas para a Educação Especial, através da Deliberação CEE Nº 02/03, aprovada em 02/06/03. Entre os apoios e serviços normatizados pela Deliberação Nº 02/2003 estão: intérprete de Libras/Língua Portuguesa; instrutor surdo de Libras; centro de atendimento especializado; instituições especializadas e escola especial para surdos.
A experiência de inclusão de alunos surdos no ensino médio regular relatada nesse trabalho acontece no IEEL-Instituto Estadual de Educação de Londrina e tem início quando, conforme  relatos de pessoas envolvidas no processo, alguns alunos que estudavam na escola  especial para surdos até 2003, a maioria concluintes doEnsino Fundamental, resolveram se transferir para um colégio de ensino regular para cursar o Ensino Médio. O início do ano letivo de 2004 foi bastante difícil pois  os alunos surdos começaram a frequentar as aulas num ambiente totalmente novo para eles e para os professores e demais envolvidos no trabalho educacional, ainda sem a presença dos professores intérpretes, contando apenas com a colaboração de uma mãe para intermediar a comunicação entre surdos e ouvintes. A  situação foi aos poucos se ajeitando e, oom a chegada dos professores intérpretes de LIBRAS – Língua Portuguesa, estabeleceu-se um nível de comunicação que permitiu aos alunos surdos participarem das aulas em igualdade de condições com os colegas ouvintes, demonstrando muita dedicação em sala, estudando muito fora da sala de aula para acompanhar os conteúdos e recuperar algumas defasagens, conseguiram ótimo desempenho e foram aprovados para a série seguinte.
O ano letivo de 2005 começou mais tranqüilo, com os alunos surdos e ouvintes e os profissionais envolvidos no trabalho educacional, que estavam no colégio no ano anterior, já habituados com a situação e podendo esclarecê-la aos que estavam chegando, de forma que não aconteceram maiores dificuldades. Reunões periódicas e projetos desenvolvidos, com muita dedicação da maioria dos envolvidos, contribuiram para o sucesso do processo de inclusão de alunos surdos no ensino médio regular do IEEL.

 
Discussão

Conhecendo estes fatos e diante das análises apresentadas podemos compreender como foi formada a idéia de surdez que conhecemos atualmente e, como foram elaboradas as propostas de educação para surdos, hoje aplicadas nas nossas escolas. Fica evidente também que as propostas para o ensino de surdos centradas na oralidade nunca produzem resultados positivos para todos os surdos, nem mesmo para a maioria deles, enquanto as propostas centradas na língua de sinais proporcionam a todos os surdos o máximo desenvolvimento, segundo suas capacidades. Concluimos que a inclusão do aluno surdo no ensino regular pode e deve ocorrer, mas somente depois da aquisição da língua de sinais como primeira língua e consequente formação da identidade surda do aluno, com aquisição da cultura surda e desenvolvimento cognitivo que lhe permitirá aprender tanto na classe comum do ensino regular, com o apoio do intérprete de LIBRAS-Língua Portuguesa, como em uma escola ou classe de educação bilingue que utilize a LIBRAS e a modalidade escrita da língua portuguesa no desenvolvimento de todo o processo educativo, ou ainda na escola especial para surdos, conforme sua opção.
Quanto à efetivação da inclusão dos alunos surdos no ensino médio regular do IEEL, com igualdade de condições para o acesso e permanência do aluno na escola com sucesso podemos dizer que já é uma realidade. As matrículas são aceitas, a escola conta com professores intérpretes de LIBRAS – Língua Portuguesa para as turmas com alunos surdos e o processo de conscientização dos professores das demais disciplinas quanto à singularidade linguística do surdo, bem como o processo de sensibilização/conscientização de toda a comunidade escolar e da sociedade como um todo estão instaurados.. No entanto, é preciso que cada vez mais pessoas se empenhem nesta luta, pois mudanças de paradigmas não se fazem com passe de mágica e demandam, acima de tudo, muita persistência daqueles que conseguem ver além dos próprios interesses e se comprometerem com a causa de um grupo minoritário. Só assim, poderemos tornar realidade, não só a inclusão escolar do surdo, mas a sua inclusão social, como idivíduo diferente mas pleno e capaz, igual a todas as pessoas em dignidade e direitos, mas respeitado em sua individualidade. 
Há certamente um longo caminho a percorrer na implantação da educação bilíngüe para surdos, pois além da fallta de conscientização geral e de conhecimentos dos envolvidos no processo, esbarramos na falta de profissionais com formação específica. Entretanto iniciamos agora uma nova etapa, pois com a regulamentação da Lei nº 10436 de 24 de abril de 2002 que reconhece a LIBRAS como meio de comunicação e expressão, através do Decreto nº 5626 de 22 de dezembro de 2005, abrem-se os caminhos para a inserção da LIBRAS no contexto social majoritário, e especialmente no contexto educacional , o que vai permitir a formação dos profissionais que hoje não existem e a escolarização dos surdos e sua formação como cidadão ativo, inserido na comunidade dos surdos e no mundo dos ouvintes.
Numa questão tão delicada em que pode ser tão prejudicial impor um extremo quanto o outro, o melhor caminho parece ser o da opção. Assim o ideal é que se ofereça diferentes caminhos e que cada indivíduo, por si ou através de seus responsáveis, possa optar pela escola que melhor atenda as suas necessidades e espectativas e que, na escola regular ou na escola especial cada um possa ter respeitados os seus direitos, através do acesso aos níveis mais elevados de educação, segundo suas capacidades, conforme determina a lei.
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