http://www.psiquiatriainfantil.com.br/congressos/uel2007/232.htm


Londrina, 29 a 31 de outubro de 2007 – ISBN 978-85-99643-11-2

ANÁLISE DE DOCUMENTOS DA LEGISLAÇÃO NACIONAL E INTERNACIONAL À LUZ DO DIREITO À EDUCAÇÃO ESPECIAL
CAMPOS, Dra. Regina Célia Pereira
Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais – FaE/UEMG
Programa de Mestrado em Educação – UNIPAC-Barbacena-MG
CAMPOS, Ana Célia Passos PereiraFaculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais – FD/UFMG


RESUMO

Este trabalho pretende situar a formação das políticas de inclusão das pessoas com necessidades especiais, no panorama das políticas internacionais, de forma a contribuir para clarear elementos que se encontram na fronteira entre os campos de conhecimento do Direito, do Direito Internacional, da Educação e da Educação Especial. Pretende, ainda, abrir um debate sobre a questão do direito inclusivo à educação dos portadores de necessidades especiais no que tange às garantias definidas pelas políticas nacionais e internacionais de inclusão e a prática educacional das escolas brasileiras. A análise dos documentos baseia-se na abordagem da pesquisa documental cujos princípios constituem da análise dos documentos nacionais e internacionais, tais como: Convenção de Viena (1969 - Direito dos Tratados); Constituição Brasileira (1988); Conferência Mundial de Educação Para Todos (1990); Estatuto da Criança e do Adolescente (1990); Declaração de Nova Delhi (1993); Declaração de Salamanca (1994), Declaração Internacional de Montreal sobre inclusão (2001) que enfocam, direta ou indiretamente, o tema da educação especial. Os dados foram analisados a partir da técnica de análise do conteúdo. Logo após as análises, foi realizada uma discussão a partir do confronto desses dados com a realidade da educação especial no Brasil.


Introdução

A legislação atual tem se pautado em Tratados e Convenções Internacionais para abordar as garantias das pessoas com necessidades especiais a fim de assegurar o acesso irrestrito destes aos seus direitos civis e de cidadania. As práticas escolares inclusivas, nos dias de hoje, fazem emergir questões importantes no que se refere às limitações concretas e necessidades urgentes da escola brasileira. É importante situar, no contexto do Direito Internacional, como essa normatização é constituída e que efeitos ela promove em termos da conquista jurídico-política para a garantia dos direitos das pessoas com necessidades especiais no Brasil.
Atualmente, o contexto neoliberal domina grande parte dos países ocidentais, propõe a reestruturação capitalista dos países, a internacionalização e a globalização da economia e põe ênfase nas relações de mercado como reguladoras da vida social.
As normas de Direito Internacional implicam em uma relação com o Direito Interno. Isso acontece na medida em que cada Estado signatário se vincula obrigatoriamente ao acordado, obrigando os seus poderes internos a implementarem a matéria aderida sob pena de uma responsabilização internacional.
Busca-se confrontar dispositivos normativos internacionais, dos quais o Brasil é signatário, com o texto constitucional de 1988, legislações ordinárias e a realidade prática da educação especial no nosso país. 

Método

A perspectiva teórico-metodológica da pesquisa está situada na abordagem da pesquisa documental cujos princípios constituem da análise dos documentos nacionais e internacionais, tais como: Convenção de Viena (1969 - Direito dos Tratados); Constituição Brasileira (1988 - Direito Fundamental à Educação); Conferência Mundial de Educação Para Todos (1990); Estatuto da Criança e do Adolescente (1990 – ECA); Declaração de Nova Delhi (1993); Lei nº 9394 de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996 – LDB) e as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Escola Básica, enfim, documentos que produzem efeitos, direta ou indiretamente, sobre o tema da educação especial. Os dados foram analisados a partir da técnica de análise do conteúdo.

Resultado

Observando a trajetória histórica da constituição das normas nacionais e internacionais, percebemos que, de início, elas se constituem de forma coordenada e relacional, sendo que o consentimento vem a ser sua principal fonte de obrigatoriedade. A historicidade do direito demonstra que os direitos são constituídos a partir de lutas históricas e demandas por novos direitos. O direito surge para manter o status quo, só pode se constituir e se atualizar na medida em que é reinvindicado. Assim podemos perceber sua evolução dentro de categorias denominadas gerações de direitos. A educação é um direito humano fundamental que está situada na terceira geração de direitos, em que os direitos passam a ser difusos, internacionalizados e visando um destinatário coletivo.

Para garantir as concepções já definidas fora do país, as estratégias nacionais mantêm um projeto de decisões políticas no âmbito do planejamento e da gestão educacional que, apesar dos avanços e da melhoria da qualidade de ensino das escolas brasileiras, quando se pensa na educação inclusiva, ainda restam questões importantes a serem discutidas, tais como, a escola como unidade de transformação do processo de aprendizagem, a formação de professores e autonomia da escola.

A aplicação das políticas inclusivas nas escolas brasileiras, reflexo das políticas internacionais e nacionais, a curto e médio prazo, vai requerer mudanças no estatuto e na estrutura das escolas públicas. Em termos da formação de um sistema de incentivo para as escolas, é importante constituir o provimento de recursos diático-pedagógicos, constituição de projetos inovadores e organização da escola para o recebimento dos alunos com necessidades especiais. Torna-se necessário a capacitação docente como estratégia de educação em serviço, um sistema de monitorias ou assistência pedagógica por área curricular que forneçam o suporte técnico e financeiro para o aperfeiçoamento profissional. Necessário, ainda, é a  criação de oficinas pedagógicas, oferta de materiais de apoio e bibliografia adequada, grupos de estudos, um sistema de informações que permita o diálogo entre técnicos, pais e educadores.

Os documentos internacionais sobre a Educação Especial, assinados pelo Brasil, fixam diretrizes para que o Direito Interno do país se adequou às demandas neles elencadas. Percebemos essa adequação em diversos dispositivos presentes na Constituição Federal, em legislações ordinárias e em políticas públicas diferenciadas.
No que tange à formação das políticas nacionais, o contexto neoliberal dominante o qual elas estão inseridas põe ênfase nas relações de mercado como reguladoras da vida social. Esse contexto marca o desafio de mantermos uma gestão democrática dessas políticas. Esse esforço se concretiza no texto constitucional de 88 e proporciona, na década de 90, reformas administrativas no setor educacional, tanto no nível federal como estadual e municipal. A participação da sociedade civil no Conselho Nacional de Educação, nos Fóruns Nacionais de Educação está garantida pelo princípio da Gestão Democrática. Sendo um serviço público, a educação garante a democracia, ou seja, está implicada na noção de participação política, seja ela, nacional ou internacional.

De fato, os dados do Censo Escolar de 2006 (MEC/INEP) registram que a participação do atendimento inclusivo cresceu, no Brasil, passando dos 24,7% em 2002 para 46,4% em 2006. 

Observamos, entretanto, que os acordos internacionais são firmados à revelia das políticas educacionais regionais e locais. Os princípios, objetivos e prioridades estabelecidos pelo BIRD são pré-requisitos para aprovação de empréstimos celebrados com as Secretarias de Educação. Essas ações evidenciam um planejamento centralizado e uma execução descentralizada, porém, controlada, na medida da centralidade das decisões em grupos econômicos e definição dos recursos segundo as referidas prioridades internacionais.

Discussão

De fato, a partir da década de 90, importantes transformações na gestão dos sistemas educativos estiveram diretamente vinculadas às políticas internacionais. Organismos Internacionais, como o BIRD - Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento, promovem uma intervenção financeira trazendo imposições de condições políticas que, por sua vez, intervêm na decisão política nacional e local. A reforma administrativa do Estado trouxe a racionalização dos empregos e gastos públicos, mudanças nas formas de organização e controle do sistema de ensino. Essas ações estiveram voltadas para oferecer um suporte de insumos educacionais, tais como investimentos na elaboração de materiais didáticos, formação de bibliotecas e fornecimento de equipamentos e tecnologias para escolas da rede pública. Essa destinação de recursos, centralizada nos insumos básicos das escolas, deixou a desejar no que se refere à formação dos recursos humanos, principalmente, quanto à formação e ao plano geral de cargos e salários dos professores.
 
As medidas adotadas pelo Governo Federal para organização da oferta da educação básica passam pela estratégia de descentralização política de distribuição de recursos pela via da municipalização da oferta do ensino e vem definir a manutenção do controle da educação sobre os estados e municípios. As diretrizes elaboradas de forma ampla, sem levar em conta a realidade de cada município, a falta de preparação administrativa e didática dos professores, a multiplicidade de ações pouco integradas, a falta de acompanhamento e controle das estratégias de coordenação das ações do MEC com as unidades federadas, são fatores que complicam o projeto político nacional para a educação brasileira

Não se discute a disponibilidade dos recursos financeiros conforme a prioridade de cada escola, nem um sistema de avaliação que seja vinculado ao processo de gestão (prestação de contas e responsabilidade) e à adoção de uma sistemática de avaliação de resultados como pré-requisito para novos financiamentos.

A participação da sociedade civil no Conselho Nacional de Educação, nos Fóruns Nacionais de Educação está garantida pelo princípio da Gestão Democrática. Sendo um serviço público, a educação garante a democracia, ou seja, está implicada na noção de participação política, seja ela, nacional ou internacional. Fazendo, entretanto, uma análise da atuação das práticas inclusivas, no que tange às normas governamentais observa-se que, enquanto se pensar que o Brasil como um todo, no que se refere ao acolhimento dos alunos portadores de necessidades especiais, irá alcançar um padrão unitário de qualidade na educação, não se conseguirá realizar a efetivação da inclusão educacional das pessoas com necessidades especiais.
Apesar de louvável, legal e legitimado, o tema da inclusão educacional, na prática, esbarra na falta de preparo dos professores, na precária qualidade da rede escolar pública.

É importante acrescentar ainda que as políticas educacionais brasileiras baseadas em legislações educacionais difusas, impessoais e internacionalizadas, na maioria das vezes, não levam em conta a diversidade e a complexidade da realidade do ensino brasileiro. Falta diálogo e interação entre legisladores, políticos e educadores, principalmente, na educação especial, pela sua especificidade. Essas são algumas evidências de que o campo educacional ainda encontra-se diretamente dependente das políticas nacionais e internacionais e que essas não respondem às especificidades do tema. Essa discussão nos leva a concluir que o educador é figura-chave na constituição dessas normas jurídicas e das políticas públicas da educação e da educação especial para possibilitar que, na prática, existam transformações significativas de inclusão. 

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