http://www.psiquiatriainfantil.com.br/congressos/uel2007/264.htm


Londrina, 29 a 31 de outubro de 2007 – ISBN 978-85-99643-11-2

LEVANTAMENTO SOBRE OS RECURSOS DE ALTA TECNOLOGIA ASSISTIVA EXISTENTES NO MERCADO NACIONAL PARA O USO POR ALUNOS COM PARALISIA CEREBRAL
Gerusa Ferreira Lourenço
Profa. Dra. Cristina Yoshie Toyoda
Profa. Dra. Enicéia Gonçalves Mendes
Programa de Pós-Graduação em Educação Especial
Universidade Federal de São Carlos


RESUMO

Recursos de Alta Tecnologia Assistiva consistem em sistemas computadorizados, operados através de programas especiais de softwares, podendo ser usados por alunos com necessidades especiais. O objetivo do projeto foi a construção de um banco de dados sobre os recursos de alta tecnologia assistiva existentes no Brasil indicados para o uso no ambiente escolar, especificamente para atividades acadêmicas em sala de aula, por crianças com paralisia cerebral, sistematizando informações sobre esses recursos, auxiliando em sua prescrição e implementação. A pesquisa se constituiu em uma pesquisa de levantamento descritiva, através de uma busca na literatura e nos sites nacionais existentes sobre o assunto; depois, foi construído um arquivo computadorizado de banco de dados sobre a disponibilidade desses recursos, tendo como parâmetros a metodologia já aplicada em estudo anterior. Dessa forma, foram sistematizadas informações sobre recursos adaptados para o uso do computador, constituindo uma fonte de dados acessível a todos os interessados.

Introdução
Paralisia Cerebral
A paralisia cerebral constitui um grupo de desordens neurológicas, com etiologias e quadros clínicos diversos, em que predominam distúrbios motores e alterações posturais permanentes, podendo apresentar desordens associadas nas áreas do desenvolvimento cognitivo, visual, auditivo e da comunicação, secundárias à lesão não progressiva no cérebro imaturo considerado desde a fase embrionária até os dois anos de idade (GAUZZI e FONSECA, 2005; GIANNI, 2003). Os aspectos de mutabilidade no quadro clínico são decorrentes do desenvolvimento maturativo do sistema nervoso central, do aprendizado de novos comportamentos motores e da interferência do ambiente.
Autores como Lauand (2000) e Alpino (2003) investigaram como ocorre o processo de escolarização de crianças com deficiência física/paralisia cerebral de acordo com a percepção dos pais, dos professores e dos alunos, refletindo sobre as dificuldades encontradas frente à falta de recursos humanos e materiais adequados para o atendimento dessa população.
Os estudos acima apontaram que para o atendimento educacional efetivo às crianças com paralisia cerebral, podem ser necessárias tanto a implementação de recursos de tecnologia assistiva, como sistemas alternativos e aumentativos de comunicação, como também adequação da mobília, espaços físicos e auxílios pedagógicos orientados ao desenvolvimento de suas possibilidades intelectuais.

Recursos de Tecnologia Assistiva
O termo “tecnologia assistiva”, relativamente pouco utilizado ainda em nosso país, tem como definição mais usual a contida numa lei dos EUA de 1988, Technology-Related Assistance for Individuals With Disabilities Act (1988) que especifica: “qualquer equipamento ou sistema que seja utilizado para aumentar, manter ou melhorar as capacidades funcionais de indivíduos com incapacidades”.
Quanto ao nível de complexidade e custo, os recursos podem ser divididos em baixa, média e alta tecnologia (COOK e HUSSEY, 2001; LANGONE, MALONE, KINSLEY, 1999). Recursos de Baixa Tecnologia são os recursos mais simples, que não fazem uso de energia, e, portanto, apresentam uma função limitada, tendo como vantagem uma maior disponibilidade, com baixo custo e requererem menos treinamento para o seu uso. Recursos de Média Tecnologia são recursos que geralmente utilizam eletricidade para o seu funcionamento, porém não requisitam um sistema computacional integrado. Recursos de Alta Tecnologia Assistiva são mais complexos, multifuncionais, geralmente envolvendo sistemas computadorizados, operados através de programas especiais de softwares, podendo ser usados por alunos com deficiências de fala, alunos com dificuldades de aprendizagem, que requerem instrução individualizada, ou alunos com deficiências motoras, que de outro modo não teriam acesso ao currículo, pela falta de movimentação para manipular os materiais básicos de escrita (lápis, caderno, borracha, etc.).
A educação de alunos com necessidades educacionais especiais requer serviços especializados durante toda sua educação ou durante boa parte dela. Dentre esses serviços, a tecnologia assistiva tem fundamental importância para possibilitar seu desenvolvimento e aprendizagem (LAUAND, 2005).
Infelizmente em nosso país tais recursos computacionais e de tecnologia assistiva ainda estão inacessíveis para a grande maioria da população das escolas públicas e mesmo onde eles existem não são utilizados pela falta de conhecimento dos educadores (LAUAND, 2005).
Dessa forma, conforme relata Lauand (2000), o desenvolvimento e a utilização da tecnologia assistiva consiste, na atualidade, num campo promissor e trata-se de uma área que requer investimento tanto do ponto de vista do desenvolvimento teórico, para avaliar necessidades especiais, criar, escolher e prescrever recursos adequados às necessidades dos usuários, quanto para a aplicação, com o desenvolvimento de tecnologia concreta para a produção desses produtos.
A citada autora assinala ainda, que apesar da existência atual de muitos recursos de tecnologia assistiva disponíveis no mercado nacional, faltam informações sistematizadas sobre como obtê-los, suas finalidades e uso, dificultando o acesso por educadores, profissionais da área da reabilitação e família a esse tipo de informação por parte dos educadores, profissionais da área da reabilitação e familiares. Assim, após constatar essa grande lacuna na produção e sistematização de conhecimentos no país, a mesma construiu um banco de dados através da identificação e categorização de todos os recursos de tecnologia assistiva existentes no mercado brasileiro. Dessa forma, o estudo possibilitou organizar e sistematizar informações inerentes aos produtos, propondo-se a facilitar o acesso aos recursos pela população alvo. Seu estudo contribuiu com um grande passo no sentido de produção teórica sobre tecnologia assistiva.
No sentido de continuar promovendo a sistematização de informação sobre recursos de alta tecnologia assistiva de modo a auxiliar os profissionais da saúde e da educação na prescrição do recurso mais adequado para as demandas do ambiente escolar, além de promover uma atualização na fonte de informações construída por Lauand (2005), o objetivo geral da presente investigação foi sistematizar informações sobre a disponibilidade, características e formas de obtenção dos recursos classificados como alta tecnologia assistiva, tendo como parâmetros o estudo efetuado por Lauand em 2005.

Método
A metodologia proposta se baseou em uma pesquisa de levantamento de natureza descritiva, buscando-se coletar, descrever e armazenar as informações sobre os recursos de alta tecnologia assistiva, com a finalidade de produzir e disseminar esse banco de dados. 

Procedimentos
A primeira etapa realizada foi a leitura da tese de doutorado de Lauand (2005) de modo a conhecer a metodologia empregada para a construção do banco de dados sobre recursos de tecnologia assistiva. Buscou-se a existência de dados sobre como foram realizadas a descrição dos recursos encontrados e a sistematização das informações, visando seguir os mesmos direcionamentos de pesquisa.
A etapa seguinte da pesquisa foi a construção de uma ficha de identificação do recurso para que as informações colhidas sobre eles pudessem ser registradas conforme a sub-categoria, grau de complexidade do equipamento e características de funcionamento, média de custo e disponibilidade no mercado brasileiro.
Com a ficha de identificação finalizada, foi dado início à busca pelos recursos através de consultas a bibliotecas virtuais, sites de busca na Internet, sites especializados sobre reabilitação, sites de representantes comerciais dos equipamentos e publicações especializadas impressas. A busca foi realizada para a localização dos recursos de alta tecnologia assistiva disponíveis no mercado nacional, identificando e selecionando os recursos a serem utilizados no ambiente escolar, mais especificamente nas atividades dentro da sala de aula (não foram selecionados, portanto, os recursos de mobilidade, atividade de vida diária e esporte/lazer) por crianças com paralisia cerebral. Foram buscados itens que pudessem ser classificados dentro da categoria Dispositivos e acessórios computacionais especiais (LAUAND, 2005).
À medida que os recursos foram sendo registrados, as informações colhidas foram depositadas em um banco de dados criado a partir de tabelas no software Microsoft Word®. Dada por encerrada a busca e a inserção de dados no banco em meados do mês de Abril/2007, deu-se início à fase de análise do material organizado, contabilizando o número dos recursos encontrados em cada subcategoria, os tipos, o nível de complexidade e o custo para obtenção.
Com o banco finalizado, pretende-se agora disponibilizar o arquivo já em formato PDF para sites de interesse do terapeuta ocupacional e de outros profissionais da reabilitação e da educação especial, como uma fonte de informações sobre os recursos.

Resultados
O banco de dados foi composto por cerca de 50 recursos localizados no mercado nacional. Foram cadastrados equipamentos em três categorias: recursos de entrada e saída de informações com as subcategorias teclados adaptados, mouse adaptado e acionadores; softwares especiais; e outros acessórios, sendo que o maior número de recursos foi encontrado para a primeira categoria, corroborando com o estudo de Lauand (2005).
De forma a tornar a discussão mais clara, a apresentação a seguir dos equipamentos encontrados e cadastrados estará divida conforme as categorias utilizadas.

Recursos de entrada e saída de informação
Dentro dos recursos de entrada e saída de informação foram localizados equipamentos como teclados adaptados, mouses especiais, acionadores e monitores especiais.
Alguns equipamentos característicos dessa categoria não foram priorizados no banco de dados. Esses equipamentos são os considerados padrões ou convencionais. No banco, deu-se preferência por equipamentos diferenciados, que possuíssem alguma característica que, de alguma forma, poderiam vir a favorecer o acesso ao computador por pessoas com paralisia cerebral.
Partindo dos equipamentos de seleção direta, os tipos de teclados adaptados cadastrados no banco são: teclado sensível ao toque, com lâminas possíveis de serem personalizadas; teclado ergonômico com disposição diferenciada das teclas preconizando o bem-estar biomecânico do corpo do usuário; teclado especial para o uso em determinados softwares de jogos infantis; teclado colorido em tamanho padrão com 101 teclas; teclados em tamanho padrão confeccionado em material emborrachado; teclado projetado em laser; caderno digital.
Não foram encontrados no mercado nacional os teclados expandidos e os teclados reduzidos. Lauand (2005) já apontava que esses tipos de teclados eram pouco disponíveis no país, estando mais a cargo da confecção personalizada, sob encomenda.
Sobre os mouses adaptados, foram cadastrados recursos dos tipos: mouse adaptado com três teclas grandes para a função dos cliques do mouse; mouse adaptado com dois roletes que quando acionados direcionam o cursor do mouse e mais três teclas para os cliques; mouse adaptado que permite o funcionamento de acionadores substituindo a função da tecla esquerda do mouse; mouse por movimento dos olhos e da cabeça; trackball.
No estudo de Lauand (2005) não foram encontrados no mercado nacional os mouses por movimento da cabeça, o trackball, as ponteira luminosas, os mouses pelo piscar dos olhos e pelos movimentos aéreos da mão. Desses, os mouses por movimento da cabeça e os trackball já estão sendo comercializados, inclusive de  fabricação nacional.
Vale ressaltar que existe ainda a possibilidade de utilizar o teclado numérico do teclado convencional para as funções do mouse quando se está trabalhando em ambiente Windows, a partir de configurações em Opções de Acessibilidade do próprio software.
A última forma de seleção direta mencionada são as telas sensíveis ao toque. Esse tipo de dispositivo, com tecnologia touchscreen, já pode ser encontrado no Brasil, em duas versões: em vidro e cristal. Além das telas, outros dispositivos com essa tecnologia estão sendo comercializados. São eles: as mesas digitalizadoras, os projetores que transformam uma lousa branca em uma tela reconhecida pelo computador, e os monitores com telas sensíveis ao toque também já comercializados em diversos formas e tamanhos. Assim, esses equipamentos também foram cadastrados no banco de dados.
Passando para os recursos de seleção indireta, os acionadores foram os equipamentos mais encontrados para comercialização no país. Lauand (2005) aponta ter encontrado apenas acionadores do tipo por pressão na época de seu levantamento. No entanto, atualmente foi possível localizar e cadastrar no banco de dados além dos acionadores por pressão (dos mais variados tipos, formas, tamanhos, de fabricação nacional e importados), os acionadores por alavanca, com destaque para o acionador em haste e o com cordão. Os acionadores de mercúrio, magnético de dedo, de sucção / sopro e o por sombra continuam ausentes no mercado nacional.
Com relação aos equipamentos de saída de informações, como os monitores e impressora, além do monitor sensível ao toque, não foi localizado no mercado nacional nenhum outro tipo que tivesse uma característica especial que o diferenciasse dos considerados convencionais. Assim, não foram cadastrados no banco.

Softwares especiais
A segunda categoria cadastrada foi a que dizia respeito aos softwares que permitem ao usuário com paralisia cerebral acessar e executar funções no computador de forma mais adequada.
Lauand (2005) assinalou que os softwares com propósitos especiais mais conhecidos são os leitores de tela (utilizados principalmente por deficientes visuais), os programas de predição de palavras e os simuladores de teclado ou teclados virtuais.
Para o banco, foi possível localizar e cadastrar os seguintes tipos de softwares: simuladores de teclado; softwares de predição de palavras; softwares para desenvolver a comunicação alternativa; softwares para construção de pranchas de comunicação e teclados personalizados; softwares para ativação das funções do computador via comando de voz.
Alguns deles foram desenvolvidos por pesquisadores brasileiros e podem ser adquiridos gratuitamente.
Dentre esses softwares, os mais complexos para o uso são os de comando por voz, pois requerem uma grande fase de treinamento do usuário. Em seguida vêm os softwares importados por apresentarem os manuais em outro idioma.

Outros Acessórios
A última categoria cadastrada no banco é formada pelos equipamentos considerados como outros acessórios que podem vir a aprimorar o uso do computador pelas pessoas com paralisia cerebral. Essa categoria é bastante diversificada, tendo equipamentos para auxiliar a digitação, apoios, etc.
Dessa forma, foram cadastrados os seguintes tipos de produtos: ponteiras para digitação com apoio na mão e na cabeça; sobreteclados de acrílico (colméia) para teclado padrão e especial; chaveador para uso com os mouses adaptados; microfone; suporte para pés; apoio para antebraço; descanso para punho; braço regulável para posicionamento do monitor;
   
Discussão
O estudo realizado possibilitou localizar e catalogar uma variedade de recursos existentes no mercado nacional que podem ser utilizados para melhorar o processo de escolarização de alunos com paralisia cerebral através do computador. O objetivo principal desse banco é possibilitar aos profissionais da área da reabilitação e demais interessados, como professores e pais, uma fonte de informações atual sobre quais são os recursos que estão disponíveis no Brasil para serem implementados junto aos alunos. Sabe-se que esse processo de implementação é complexo e envolve muitas etapas de avaliação e treino. No entanto, acredita-se que ter conhecimento dos recursos aos quais se tem acesso no país é um passo importante para o início desse planejamento.
Durante as etapas de construção as dificuldades encontradas foram mínimas e somente quando se buscou por determinados equipamentos. A maioria foi de fácil localização, mesmo via Internet, o que corrobora com a idéia já apontada por Lauand (2005) de que o desenvolvimento e a disponibilidade desse tipo de tecnologia assistiva está em ascensão no país, apesar dele ainda estar em estágio inicial quando comparado a países desenvolvidos.
Com relação às conclusões sobre os recursos do banco, pode-se afirmar que os equipamentos encontrados são mais diversificados do que no primeiro estudo de levantamento feito por Lauand (2005), em diferentes tipos e graus de complexidade. Sobre esse aspecto, dos recursos encontrados, de uma forma geral todos eles apresentaram baixa complexidade desde o momento de instalação, sendo os da categoria Softwares Especiais os que requerem maior atenção e treinamento para o uso. Sobre o custo dos equipamentos, este ele ainda pode ser considerado como um alto investimento, porém com a fabricação de recursos nacionais, esse custo tende a baixar com o passar dos anos e à medida que mais usuários tenham acesso aos mesmos.
Por fim, espera-se que, com a sistematização dessas informações em formato de um arquivo digital de fácil leitura e entendimento, ter sido construída uma fonte de dados importante e adequada a todos os interessados e, dessa forma, promovido uma colaboração para a melhora do processo de viabilização desses recursos no ambiente escolar para alunos com paralisia cerebral.

Referências Bibliográficas
ALPINO, A. M. S. O aluno com paralisia cerebral no ensino regular: ator ou expectador do processo educacional? 2003. 141 f. Dissertação de Mestrado (Educação Especial (Educ. do Indivíduo Especial)) - Universidade Federal de São Carlos. São Carlos.
COOK, A. M.; HUSSEY, S. M. Assistive technologies: principals and practice. St. Louis, Missouri: Mosby. 2002.

GAUZZI, L. D. V.; FONSECA, L. F. Classificação da paralisia cerebral. In: LIMA, C. L. F. A, e FONSECA, L. F. Paralisia cerebral: neurologia, ortopedia, reabilitação. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan. 2004. p. 37-44. 
GIANNI, M.A. Paralisia Cerebral. In: TEIXEIRA, E.; SAURON, F.N.; SANTOS, L.S.; OLIVEIRA, M.C. Terapia Ocupacional na Reabilitação Física. São Paulo: Ed. Roca, 2003. p. 89-100.
LANGONE, J., MALONE, M.; KINSLEY, T. Technology solutions for young children with developmental concerns. Infants & Young Children, 11(4), 65-78. 1999.
LAUAND, G. B. A. Acessibilidade e formação continuada na inserção de portadores de deficiências físicas e múltiplas na escola regular. 2000. 121 f. Dissertação de Mestrado (Educação Especial (Educ. do Indivíduo Especial)) - Universidade Federal de São Carlos. São Carlos.
_____. Fontes de informação sobre tecnologia assistiva para favorecer a inclusão escolar de alunos com necessidades especiais. 2005. 210 f. Tese (Doutorado em Educação Especial (Educ. do Indivíduo Especial)) - Universidade Federal de São Carlos. São Carlos.
UNITED STATES OF AMERICA. Lei. n. 2202 de 19 de Agosto de 1988. Technology-Related Assistance for Individuals with Disabilities Act. Disponível em: <http://www.law.cornell.edu/uscode/html>. Acesso em: 7 nov. 2005.