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Londrina, 29 a 31 de outubro de 2007 – ISBN 978-85-99643-11-2
O USO DO COMPUTADOR COMO FERRAMENTA PARA TRABALHAR COM
PESSOAS COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA.
Jane Aparecida de Souza Santana (FCT/Unesp)
Ms. Flaviana dos Santos Silva
Profª Drª Elisa Tomoe Moriya Schlünzen (FCT/Unesp).
RESUMO
Este artigo visa descrever a pesquisa que procurava analisar as estratégias elaboradas para
promover a inclusão escolar, social e digital de pessoas com deficiência auditiva (D.A.) incluídos
em dois ambientes distintos: em uma escola de ensino regular de Presidente Prudente/SP e no
Ambiente Potencializador para Inclusão (API) da Faculdade de Ciências e Tecnologia da
Universidade Estadual Paulista - Unesp. Para tanto, foi realizada uma observação participante na
escola o trabalho realizado por uma educadora que recebia alunos com deficiência auditiva em
sala regular. Já no API, realizava-se o acompanhamento de um aluno de 17 anos com D.A.
desde o seu nascimento. Assim, pretende-se destacar as principais características dos contextos
observados e quais as conseqüências que vem sendo acarretada devido a metodologia
empregada em ambos. Na escola, apesar de tentativas, a professora demonstrou dificuldades em
aplicar uma metodologia inovadora que propiciasse a aprendizagem de todos os alunos. No API,
foi adotada como estratégia o trabalho com projetos, buscando criar um ambiente
Construcionista, Contextualizado e Significativo (CCS). Como resultados verificamos que o uso
dessa estratégia permitiu ao aluno o desenvolvimento de competências e habilidades por estar
articulado com mudança pedagógica dos professores envolvidos no processo de formação,
favorecendo o levantamento de condições adequadas oferecendo uma nova perspectiva para a
inclusão dos alunos.
No cenário educacional atual, muito se tem discutido sobre a inclusão, e muitos
profissionais da Educação e pesquisadores acreditam que para a Inclusão deixar de ser
utópica/ilusória, a escola e os professores devem modificar as suas práticas pedagógicas em sala
de aula, revendo sua postura para construir uma nova filosofia educativa e buscando conexões
com utilizar novos recursos, principalmente o computador.
Hoje em dia, falar de inclusão é mais do que falar das pessoas com deficiência. A escola
hoje precisa estar aberta a receber todo e qualquer tipo de pessoa em situação de exclusão ou
não, seja esta qual for a sua condição. Desta forma, será contemplado neste texto, uma
discussão sobre o desenvolvimento cognitivo, educacional e social das pessoas com deficiência
auditiva. Por ter a convicção de que a inclusão escolar está vinculada à inclusão na sociedade e
no mundo digital.
Com as experiências adquiridas ao trabalhar-se com pessoas com deficiência, percebeu-se a necessidade de modificar e adequar os ambientes destinados
aos alunos e também a busca
de novas formas e estratégias de trabalho para favorecer a sua inclusão.
A partir das observações realizadas, pode-se perceber que uma das formas de
potencializar o processo de inclusão é a utilização do computador no processo de ensino e
aprendizagem. Dessa forma, a inclusão escolar e social pode acontecer via inclusão digital,
dependendo da metodologia de trabalho que o professor utilizar. Essa discussão assume ainda
maior importância porque como já é de conhecimento de todos estamos na sociedade de
informação, assim para estar efetivamente incluída na sociedade, uma pessoa deve ter
conhecimentos básicos de informática.
De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU apud LEITE
e SUAIDEN,
2004), as tecnologias são importantes não apenas pelo acesso ao conhecimento, mas porque
elas também são facilitadoras de avanços sociais. Schlünzen (2000), Valente (1991) e Almeida
(1999) completam acrescentando a melhoria educacional.
Em conformidade com o objetivo do programa: Governo Eletrônico
- Serviço de
Atendimento ao Cidadão (GESAC, 2004)1, “o acesso à informação (digital) deve ser um direito
de todo cidadão brasileiro, como o acesso aos serviços de saúde e de educação”. É nesse
contexto que procura-se entender que todas as pessoas devem ter acesso a essa informação,
independente de suas origens, classe social, nível econômico, cultural ou cognitivo.
Para que isso ocorra, mais do que haver políticas que trabalhem para dar uma maior
infra-estrutura para o acesso à Informática, é necessário dizer que o simples contato com
computadores ou com qualquer outra das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC)1,
não é suficiente para uma adequada Inclusão Digital. De acordo com Leite e Suaiden (2004)2,
“enviar computadores para as populações marginalizadas, sem uma proposta adequada de
mediação da informação, com certeza não contribuirá efetivamente para a inclusão de cidadãos
na sociedade da informação”.
É relevante ressaltar, portanto, que a Inclusão Digital só será possível com a
implementação de metodologias adequadas que mediem o acesso à informação dando valor a ela
e, conseqüentemente, transformando-a em conhecimento.
Diante do exposto, passa-se a relatar um trabalho de pesquisa desenvolvido com
pessoas com deficiência auditiva, utilizando o computador visando alcançar a inclusão digital e a
potencialização da aprendizagem das mesmas. Ao longo da realização da pesquisa, porém,
percebe-se que o trabalho com o computador adquiriu cunho além do que se esperava,
contribuindo não só para a inclusão digital, mas também para a inclusão escolar (contribuindo
com significativos progressos na aprendizagem) e para um início de inclusão social, vale ressaltar
que o trabalho com a máquina conforme a abordagem adotada pode-se explorar o lado afetivo
dos sujeitos.
Assim, a pesquisa se desenvolveu em dois contextos: em uma escola da rede regular
onde pessoas com deficiência auditiva foram inseridas e em um Laboratório Didático de
Informática da Faculdade de Ciências e Tecnologia de Presidente Prudente. Neste, os autores
atuavam de acordo com a abordagem Construcionista, Contextualizada e Significativa (CCS),
proposta por Schlünzen (2000), cujo principal enfoque é permitir que o aluno construa seu
conhecimento através de situações que partam de seu contexto e campo de interesses, sonhos e
desejos, podendo possibilitar uma aprendizagem significativa na qual se evidenciem as
potencialidades de acordo com o tempo individual de cada aluno (ALMEIDA, 1999).
A estratégia utilizada neste processo era o desenvolvimento de projetos, que segundo
Schlünzen (2000) pode permitir que as informações adquiridas pelos alunos possam ser usadas
ganhando um significado e possam ser transformadas em conhecimento, favorecendo a
formalização de cada conceito. Além disso, Almeida (1999) afirma que o aluno passa a ser ativo
no processo educacional. Para a autora, “o professor que trabalha com projetos de
aprendizagem respeita os diferentes estilos e ritmos de trabalho dos alunos desde a etapa de
planejamento, escolha do tema e respectiva problemática a ser investigada. Não é o professor
quem planeja para os alunos executarem, ambos são parceiros e sujeitos de aprendizagem, cada
um atuando segundo o seu papel e nível de desenvolvimento” (ALMEIDA, 1999, p.2), o que
favorece a inclusão.
Nessa abordagem, o construcionismo, de acordo com Papert (PAPERT apud
VALENTE, 1991, p.57), é uma forma de ensinar e aprender em que o aluno constrói o seu
conhecimento usando o computador, “a partir de ações físicas ou mentais que ele exerce no
ambiente onde vive”. Dessa forma, na abordagem construcionista o aluno não é instruído ou
direcionado, mas são oferecidas condições para que ele aprenda. Para que isso aconteça, serão
necessários: a ação física ou mental do aprendiz, o ambiente onde ele está inserido e a atuação
do professor, como mediador nesse processo. Assim, ele acaba por descobrir uma forma mais
prazerosa de ensinar, de dar significado à aprendizagem, formalizando e contextualizando os
conceitos. (SCHLÜNZEN, 2002).
Portanto, a Tecnologia na área Educacional é entendida de forma que o computador
possa ser utilizado para o aluno desenvolver projetos com a formalização, explicitação e
construção do conhecimento. Esse recurso passa a ser uma ferramenta pela qual o aluno pode
desenvolver suas produções com maior facilidade, deixando de ser apenas um meio de transferir
informação. Além disso, as produções, por meio de formalização e representação, execução e
depuração de suas idéias, permitem aos alunos descobrirem e corrigirem os seus erros com
maior facilidade, refletindo sobre a sua construção e proporcionando melhora na sua
aprendizagem.
Diante deste cenário, a atuação dos professores é indispensável para garantir o sucesso
da aprendizagem e futuramente a inserção dos alunos na sociedade, possibilitando-o a exercer
sua cidadania. Assim, ao trabalhar com projetos em sala de aula abre uma nova perspectiva ao
ensino.
No trabalho de campo, na escola, constatou-se as crianças com deficiência auditiva não
foram incluídas adequadamente os professores alegaram falta de capacitação em sala para
trabalhar com um aluno com esta patologia. Além disso, tinha o agravante também de não haver
os serviços de um intérprete de linguagem de sinais (LIBRAS), que é um dos princípios
inclusivos, necessário especialmente quando o professor que está na sala de aula não tem
conhecimento algum sobre essa nova linguagem. Tal fato ressalta que a efetiva inclusão escolar
requer a cooperação de todos no ambiente escolar. Assim, a aprendizagem em Libras deve
acontecer preferencialmente com todos da sala de aula em que tiver um aluno com deficiência
auditiva incluído e assim todos(colegas e professor), poderá aprender a se comunicar com ele.
Neste processo, como mencionamos, o computador também pode ser um aliado no
processo de potencialização da inclusão, como uma ferramenta para comunicação, avaliação e
pedagogia.
Vale salientar que a escola onde a pesquisa foi realizada conta com um laboratório de
informática composto por dez (10) máquinas com alguns softwares básicos e acesso à rede
mundial. Assim, a professora da sala com que trabalhamos estava disposta a realizar um trabalho
diferenciado, partindo de uma nova proposta de utilização do computador como ferramenta para
viabilizar o conhecimento daqueles alunos, visando um melhor convívio social entre os alunos
“normais” e os alunos incluídos.
Para a realização do trabalho, a princípio foi necessário uma etapa de observação, para
conhecer melhor os alunos e o ambiente e em seguida foi sugerido à professora alguns filmes
(Procurando Nemo, O Corcunda de Notre Dame, Sherek, etc), para sensibilizar os alunos sobre
a questão das diferenças. A segunda etapa foi escolher o tema do projeto da sala partindo de
algumas questões propostas pelos alunos numa conversa com toda sala, ficando definido como
tema escolhido pelos alunos os animais pré-históricos.
Com o intuito de manter as atividades mais colaborativa e dinâmica, a sala foi divida em
grupos, ficando cada um responsável por um tipo de animal, tendo que pesquisar em diversas
fontes como: (livros, revistas, biblioteca e rede mundial). Após a pesquisa os alunos foram para o
laboratório, ocasião em que cada grupo desenvolvou um trabalho diferente, como: maquetes com
os animais, desenho no paint, texto informativo no Word, busca na rede mundial sobre a extinção
dos animais, etc. Foi através deste trabalho que todos (alunos e professor) passaram a perceber
as habilidades dos D. A., já que o contato com o computador lhe proporcionou realizar
atividades e alcançar resultados nunca obtidos quando as atividades eram tradicionalmente
instrucionista, por ter uma certa facilidade em manusear o computador, antes não percebidos
através da metodologias tradicionais.
A importância das TIC para potencializar o desenvolvimento social, cognitivo,
educacional e familiar dos D.A. pode ser observado também no estudo de caso, que passa-se a
expor: de acordo com essa metodologia de trabalho, será relatado a experiência que os autores
tiveram com um aluno de 17 anos, com dificuldades de desenvolver o trabalho na sala de aula e
na realização das atividades no já mencionado Laboratório de informática da FCT/Unesp, onde
procurou-se propor atividades que faziam parte de seu contexto. Para isso, será relatado um
pouco de seu histórico de vida.
Vale salientar que desde a infância, esse aluno foi incentivado pelos pais, que o
colocaram em instituições especializadas para que desenvolvesse a leitura labial e aprendesse a
se comunicar por meio de LIBRAS. Devido ao seu desenvolvimento, ele passou a freqüentar
uma escola da rede particular de ensino em uma cidade próxima a região de Presidente
Prudente/SP.
Apesar disso, ao ser incluído no ambiente escolar, apresentava grandes dificuldades na
leitura e na escrita e muitas vezes não acompanhava as aulas, uma vez que estas eram ministradas
de forma tradicional por professores despreparados para lidar com um aluno com deficiência
auditiva.
A partir deste cenário, primeiramente foi realizado um diagnóstico com os pais, por meio
de uma entrevista informal, com a finalidade de descobrir as preferências do aluno, seus desejos
e quais eram as expectativas (tanto dos pais quanto dos alunos) em relação ao trabalho a ser
realizado futuramente.
Nesse primeiro momento de diagnóstico, foi possível constatar que esse aluno
demonstrava grande interesse por carros, futebol (copa do mundo) e equipamentos de sons.
Visando atender seus interesses, foi proposta a criação de uma rádio virtual, tendo como
ferramenta de criação o portal www.usinadosom.com.br.
Tendo em vista o estágio de desenvolvimento cognitivo desse aluno, buscou-se
desenvolver a autonomia, promover diversas formas de expressão, além de propiciar o
desenvolvimento da leitura e escrita, sendo que nesse portal, o aluno tem a oportunidade de criar
sua rádio e colocar músicas de sua preferência. Nessa atividade, o aluno descobriu seu caminho
isotrópico para “sentir” as músicas, através de ondas sonoras
Outra atividade interessante foi a criação de uma home-page
onde ele inseriu as
informações encontradas na rede mundial e em outros meios de comunicação sobre sons de
carro, automóveis e futebol, tendo em vista a realização da copa do mundo de 2002.
Vale salientar que os objetivos dessa atividade eram o de promover o desenvolvimento
da escrita e da leitura por meio da criação dos textos que seriam colocados em sua página;
propiciar momentos onde o aluno criasse e demonstrasse seus desejos e sentisse prazer em suas
produções, além de favorecer a construção de seu conhecimento.
Nesse trabalho, percebeu-se que o aluno apresentou um grande desenvolvimento
cognitivo, aflorando suas habilidades de leitura e escrita, bem como potencialidades
computacionais que favoreceram a sua inserção no mundo do trabalho.
Além disso, serviram de suporte para que se pudesse refletir sobre a prática pedagógica
da equipe API, fazendo com que cada pesquisador deparasse com novas estratégias que
promovessem uma aprendizagem significativa e a Inclusão Social e Digital dos alunos com
“deficiência”.
Neste sentido, pode-se conceber que, para que a inclusão ocorra, os professores devem
buscar estratégias para torná-la eficaz, no sentido de envidar esforços para contextualização do
conteúdo, tornando-o relevante e desafiador, visando um ensino de qualidade e aberto a todos
os alunos. Assim, espera-se que ambas as pesquisas realizadas contribuam para uma reflexão de
como vem ocorrendo a inclusão na escola da rede regular de ensino, e quais as estratégias que
facilitam esse processo. Desta forma, acredita-se que a inclusão pode ser concretizada, desde
que haja um melhor preparo da escola, comunidade, adequação de currículos, projetos
pedagógicos, bem como, a formação continuada dos profissionais que atuam na Educação
Inclusiva.
1 Nome dado a equipamentos, redes e aplicativos que se articulam para processar, armazenar e
comunicar informação e conhecimento. (GESAC, 2004)
Referências Bibliográficas
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<http://dbsrv01.pol.inf.br/polserver/root/setor00/inclusaodigital/> acessado em 22/05/2002,
2001, p.1.
SCHLÜNZEN, E. T. M. Mudanças nas Práticas Pedagógicas do Professor: Criando um
Ambiente Construcionista, Contextualizado e Significativo para Crianças com Necessidades
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2000.
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MINTO, C. A. Educação Especial: Da LDB aos Plano Nacionais de Educação – MEC e
Proposta da Sociedade Brasileira. In: PALHARES , M. S. 2002, EdUFSCar p.11
VYGOTSKY, in: SCHLÜNZEN, E.T.M. Mudanças nas Práticas Pedagógicas do
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Currículo), PUC – São Paulo, 2000.
MANTOAN, M. T. E. A integração de pessoas com deficiência: contribuições para uma
reflexão sobre o tema. São Paulo: Memnon/Senac,1998. P.211-214.