http://www.psiquiatriainfantil.com.br/congressos/uel2007/279.htm |
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Londrina, 29 a 31 de outubro de 2007 – ISBN 978-85-99643-11-2
INCLUSÃO NO MERCADO DE TRABALHO: ESPAÇO DE CONTRADIÇÃO
PARA ACESSO DO TRABALHADOR SURDO
Msc. Joab Grana Reis –UFAM
Prof. Dr.Arminda Rachel B. Mourão-UFAM
RESUMO
As discussões deste estudo são decorrentes da pesquisa de mestrado, na qual buscamos
construir o percurso histórico da categoria trabalho, com a finalidade de compreendermos as
contradições existentes no que diz respeito às novas organizações e relações de produção
nesta nova configuração de sociedade, onde competência e qualificação são as palavras de
ordem. Diante deste contexto temos a presença do surdo trabalhador, minoria em nossa
sociedade, que sofre inúmeros obstáculos com a imposição das barreiras sociais dentre os
entraves podemos elucidar: baixo nível de escolaridade, ausência de um ambiente lingüístico,
formação profissional incipiente, visão da sociedade numa perspectiva da deficiência. Os
avanços em relação ao processo de inclusão social das pessoas com necessidades especiais,
na área do trabalho se materializa com o Decreto Nº 3.298/1999 que regulamenta a Lei
7.853/1989, que explicita: A Empresa com cem ou mais empregados está obrigada a
preencher de 2% a 5% de seus cargos beneficiários da Previdência Social reabilitados ou
com pessoa com deficiência. Apesar disto, constatamos que as condições oferecidas ainda
são mínimas. Nesta perspectiva objetivou--se analisar o processo de inclusão do surdo no
mercado de trabalho no setor eletro-eletrônico da Zona Franca de Manaus e as barreiras
enfrentadas para o acesso ao trabalho; Identificar as principais dificuldades encontradas pelo
surdo para sua inserção no mercado de trabalho; identificar as principais funções e cargos
ocupados pelos surdos nas empresas; Analisar a política de emprego das empresas para
inserção do surdo no mercado de trabalho, dentro da proposta de inclusão social; Verificar
quais as exigências de qualificação do surdo para o mercado de trabalho. Os dados foram
coletados por meio de entrevista semi-estrururada em 02 (duas) fábricas do Distrito Industrial,
especificamente no setor de recursos humanos e com 15 surdos trabalhadores das respectivas
empresas. Os dados indicam que o baixo nível de escolaridade é um dos fatores de entrave
de acesso ao mercado de trabalho, visto que o mínimo de escolaridade exigida pelas
empresas é o Ensino Médio. Afinal a escolaridade é garantia de acesso ao mercado de
trabalho?Discursos e práticas são por relações contraditórias?
PLAVRAS-CHAVE: Educação, trabalho, inclusão social, surdez.
1 Configuração do modo de produção na sociedade capitalista
O trabalho é considerado uma categoria essencial de análise, pois é uma ação primordial para
a construção de qualquer sociedade. Braverman (1974, p. 53) ressalta que “o trabalho que
ultrapassa a mera atividade instintiva é sim a força que criou a espécie humana e a força pela
qual a humanidade criou o mundo como o conhecemos”. Portanto, é um processo mutável e
histórico, que ao longo do tempo vai assumindo dimensões muito variadas no seio de cada
sociedade.
O homem é capaz de elaborar intelectualmente determinado objeto e propor que outro
materialize sua produção. Podemos considerar que essa divisão do trabalho intelectual e
manual no modo de produção capitalista, será um marco essencial para a degradação e
alienação do homem em relação ao domínio do processo de produção, em contrapartida será
essencial para a acumulação do capital. Nos Manuscritos Econômicos e Filosóficos, Marx
(1963, p. 220) ressalta que “a divisão do trabalho é a expressão econômica do caráter social
do trabalho no interior da alienação”.
Portanto, é no modo de produção capitalista que a categoria trabalho vai se delineando como
uma forma particular de expropriação e alienação em relação ao sujeito trabalhador. Se antes
o trabalhador (agricultor rural, o artesão) era dono dos meios de produção e de sua
subsistência, o qual tinha o total controle, neste novo modo de produção esses fatores
tornam-se mercadorias, inclusive o próprio homem, considerando que passa a vender sua
força de trabalho em troca de sua sobrevivência.
2- Reestruturação produtiva: uma sociedade desigual
Para atender à nova organização do trabalho, que tem como princípio a flexibilidade, os
trabalhadores deverão ser capazes de adaptarem-se1 às transformações que são cada vez
mais rápidas, inclusive mudar de posto ou atividade. “A polivalência e as máquinas integradas
necessitam de atores autônomos, capazes de se adaptar a situações novas, de criar condições
necessárias para uma máxima eficácia” (GUGUÈ, 2004, p. 25 e 26).
Nesta perspectiva o sistema político, social, cultural e econômico vem se estabelecendo,
sustenta a constituição de uma sociedade onde a “normalização da exclusão começa a
acontecer quando descobrimos que, no final das contas, em uma boa parte do mundo há mais
excluídos do que incluídos” (GENTILI, 2003, p. 31).
1 A esse respeito da polivalência, Alves ressalta “não quer dizer que eles tenham se convertido em
operários qualificados, mas representam, como salientou Anglieta, “o extremo da desqualificação, ou seja,
seus trabalhos foram despojados de qualquer conteúdo concreto” (ANGLIETA, 1978, p. 106 apud ALVES,
2001, p. 99).
Em relação a essa questão, Robert Castel (1997, p. 5) assinala que:
A exclusão vem se impondo pouco a pouco como um mot-valise
para definir todas as modalidades de miséria do mundo: o
desempregado de longa duração, o jovem da periferia, o sem
domicílio fixo, etc, são excluídos.
O autor faz uma crítica em relação ao uso impreciso do termo exclusão, pois a tendência é ver
os sintomas: o desempregado, o sem - teto, o analfabeto, a condição do sujeito, pessoas com
necessidades especiais, no entanto, não se verifica a causa. Como nos alerta Robert Castel
(1997, p. 19), “falar em termos de exclusão é rotular uma qualificação puramente negativa
que designa a falta, sem dizer no que ela consiste nem de onde provém”.
Nesta perspectiva, abordaremos algumas formas de exclusão denominadas por Robert Castel
(1997). A primeira denominada a “Supressão Completa da Comunidade,” que se caracteriza
por extermínio de um grupo social. Como ocorreu com ação dos nazistas,2 Leis Eugênicas e
outras. A segunda, “Reclusão e Confinamento,” caracteriza-se pelo isolamento das pessoas
em espaços fechados e isolados da comunidade, como as prisões, asilos, guetos, instituições
onde ficavam as pessoas que apresentavam alguma necessidade especial, loucos e idosos.
2 O século 19 foi marcado por uma época de forte discriminação em relação aos portadores de deficiência
com o movimento eugenista, que defendia a reprodução de pessoas bem - dotadas e visivelmente
perfeitas, com a finalidade de proibir a reprodução de pessoas portadoras de deficiência (LOPES, 2005, p.
17).
A terceira utilizaremos a denominação utilizada por Gentili (2003, p. 33) – segregar incluindo:
“significa que determinados indivíduos estão dotados das condições necessárias para conviver
com os incluídos, só que com uma condição inferiorizada, subalterna”. Podemos denominar
nessas características as minorias sociais em nossa sociedade ou usando a denominação de
Robert Castel: uma categoria de subcidadãos. Nos dizeres do autor:
A exclusão não é nem arbitrária nem acidental. Emana uma ordem
de razões proclamadas. Ousar-se-ia dizer que ela é “justificada”, se
entendemos por isso que repousa sobre julgamentos e passa por
procedimentos cuja legitimidade é atestada e reconhecida
(CASTEL, 1997, p. 39).
Com relação ao surdo trabalhador, alguns estão nos espaços das fábricas, porém sofrendo
algumas exclusões, como, por exemplo, acesso aos cursos e palestras em decorrência da
barreira da comunicação.
3- Escolarização: Garantia de acesso ao Trabalho?
O acesso ao nível elevado de educação é considerado como uma condição necessária para a
inserção no mercado de trabalho, competência e qualificação são as palavras de ordem neste
mundo de constante contradição. No entanto, muitas pesquisas e situações elucidadas nos
noticiários nos revelam que não é garantia para se conseguir ou permanecer no emprego.
Segundo Kober (2004, p. 10):
Pode-se dizer que esse consenso ideológico se dá por meio da
aglutinação da relação educação-emprego em torno da noção de
empregabilidade: quanto melhor sua escolaridade, mais empregável é
o sujeito. Noção esta que transfere para o indivíduo total
responsabilidade sobre sua educação e qualificação e conseqüente
possibilidade de permanecer no emprego.
Como podemos perceber, são ideologias que passam a ser internalizadas pelo jovem, ou pelo
próprio trabalhador que já disputa um espaço no mercado de trabalho. Quando não consegue
acesso ao trabalho assume a culpa como sendo incapaz, por não ter um elevado nível de
escolarização ou por não ser qualificado para competir no mundo do trabalho. O fato de ter
um nível de escolarização somente garante a sua empregabilidade, visto que temos um
contingente de trabalhadores com nível elevado de escolaridade, mas numa situação de baixo
salário ou realizando atividades diferentes de sua formação. Acreditamos que a competência
será no sentido de conseguir acompanhar esse processo de mutação no mundo do trabalho.
Em relação à pessoa surda, sua trajetória educacional, foi marcada por preconceito,
discriminação, imposição e exclusão. Quando mencionamos o termo imposição, nos
reportamos à forma como historicamente essa educação foi sendo constituída, pois “sob o
empenho de fazer as pessoas surdas falarem, está o processo de disciplinação, de sanção e
de poder empregados sobre elas, bem como a garantia de sua diferença – cada vez mais
próximas de nós - ouvintes/normais” (LOPES, 2004, p. 41).
Como nos diz Robert Castel: “a exclusão não é arbitrária nem acidental, há uma legitimidade
e, nessa questão, está um padrão de normalidade de homem. Ser normal é quem se comunica
usando a fala oral”.
A dificuldade de o surdo ter alcance social em várias instâncias da sociedade não é uma
realidade específica da cidade de Manaus, no entanto, são barreiras que o surdo ainda
encontra, apesar de não negarmos os avanços que estão sendo alcançados.
A questão do baixo nível de escolaridade é um obstáculo na vida do surdo, principalmente em
relação ao acesso ao mercado de trabalho, atualmente o mínimo de escolaridade exigido por
uma empresa é o Ensino Médio completo.
Em razão da obrigatoriedade da lei3, que estabelece que a empresa deva ter em seu quadro
funcional, dependendo do número de empregados, um percentual de trabalhadores que
apresentem necessidades especiais, temos uma “flexibilidade”4 das empresas em relação ao
nível de escolaridade exigida. Considerando que em relação ao surdo, como mencionamos
anteriormente, o nível de escolaridade da maioria ainda é baixo.
3 Decreto Nº 3.298/1999 que regulamenta a Lei 7.853/1989, que explicita: A Empresa com cem ou mais
empregados está obrigada a preencher de 2% a 5% de seus cargos beneficiários da Previdência Social
reabilitados ou com pessoa com deficiência.
4 Destacamos a palavra flexibilidade por se tratar do acesso das pessoas com necessidades especiais
no mercado de trabalho uma obrigatoriedade legal, inclusive o não - cumprimento implica sanções
legais como multas.
Estamos nos reportando especificamente para empresas, por ser o local de trabalho da
pesquisa e também onde encontraremos a maioria dos surdos trabalhadores.5 Constatamos,
mediante levantamento de dados numa escola específica para surdo, que quase todos os
alunos que estão no mercado de trabalho se encontram em empresas do Distrito Industrial de
Manaus. É evidente que encontramos muitos trabalhadores surdos que estão fora do mercado
de trabalho; em suas falas registramos “não sei ler, não entendo as palavras, preciso aprender,
não sei português, é muito difícil, na empresa tem prova escrita”.
5 Dado emitido pela Asmam (Associação de surdos do Amazonas) e Feneis ( Federação Nacional e
Integração da Pessoa Surda).
Como constatamos, o nível de escolaridade é o grande nó no histórico profissional das
pessoas com necessidades especiais. No caso dos deficientes físicos e visuais, a dificuldade
de locomoção é a primeira barreira, inclusive em uma das fábricas pesquisadas tivemos esta
percepção, pois não existe cego na empresa por não poderem desenvolver nenhuma atividade
na fábrica, segundo informações obtidas durante a pesquisa.
Quanto ao surdo, nos deparamos com a baixa escolaridade e a questão da comunicação que
se torna também um entrave e, diríamos até, motivo de resistência das empresas em contratá-los.
Reportando-nos a Perlin (2004), o surdo ainda é violentamente silenciado, pois o que está
sendo apontado como reivindicação ainda está distante das práticas sociais, considerando que
o acesso ainda permanece negado, principalmente em relação a sua inserção no mercado de
trabalho.
Verificamos, durante a pesquisa, que os surdos que estão nas empresas não recebem
qualificações profissionais por não “terem” condições de acompanhar os cursos. Novamente
a culpa num corpo mutilado, afinal estes não ouvem igual à maioria dos trabalhadores. Por
isso lhe é negado o direito de participar pela ausência de um intérprete.
A educação e o mercado de trabalho para as pessoas com necessidades especiais não são
questões novas ou desconhecidas. Novo, talvez, seja o início de uma mobilização que pode
vir mudar a triste realidade desse grupo de pessoas em nosso país. No momento em que,
movimento de meninos de rua, idosos, negros e índios, além de ações de apoio a doente em
hospitais e tantos outros, ganham visibilidade, a situação das pessoas com necessidades
especiais também desperta como tema a ser tratado, discutido e transformado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
É importante destacar que a vida é processo contraditório, e na sociedade a luta de classes se
faz presente. Gadotti enuncia que “a transformação das coisas não se realiza num processo
circular de eterna repetição, numa repetição do velho” (2003 p. 26). Por isso, enfatizamos
que na sociedade, ocorrem rupturas e continuidades, e nesse processo que é dialético, novas
relações sociais se estabelecem.
Os preceitos legais garantem o direito de acesso ao mercado de trabalho, afinal são pessoas
com necessidades especiais, mas são pessoas produtivas, no entanto, as barreiras sociais são
suas grandes inimigas.
Os surdos são pessoas que encontram inúmeras dificuldades, como o baixo nível de
escolaridade, visto que o mínimo exigido pelas empresas é o Ensino Médio. No entanto,
sabemos que o acesso ao trabalho é uma barreira em nossa sociedade, não só para os
surdos, devido à configuração do mercado capitalista.
Outra questão a ser destacada, é a incipiência do acesso, principalmente as barreiras da
comunicação que impossibilitam o surdo de participar de cursos, palestras, reuniões.
A visão na perspectiva da incapacidade, da deficiência, pelos empregadores gera: insegurança
em contratá-los, dificuldade em colocá-los em outros espaços que não seja na linha de
produção, resistência em atender a lei, dificuldade ou ausência de ações que favoreça a
participação em cursos, visto que, a grande maioria de surdos se sente excluída das
oportunidades concedidas a outros funcionários da empresa.
A questão da inserção das pessoas com necessidades no mercado de trabalho também
precisa ser discutida, como foram apontadas neste estudo ainda persistem muitas barreiras.
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KOBER, Claudia Mattos. Qualificação profissional: uma tarefa de Sísifo. Campinas, SP:
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