Artigos Científicos

O Braille na Educação Inclusiva

Sandra Taioli

1 de agosto de 2007

O Braille na Educação Inclusiva

"Posso admitir que o deficiente seja vítima do destino, porém não posso admitir que seja vítima da indiferença" John Kennedy.

 

Sandra Taioli [1]

  

Inicialmente, propõe-se uma reflexão sobre o significado da diferença. Reconhecer que somos diferentes é o primeiro passo dessa discussão e que as Instituições Educacionais devem ter isso como premissa em sua proposta de ensino. Para tal, é necessário dar suporte ao professor, funcionário e corpo técnico que estiver envolvido no processo de aprendizagem, não perdendo de vista que as diferenças existem e precisam ser respeitadas.

 

Considerando que diferenças existem e podem ser de origem patológica, tais como: paraplegia, deficiência auditiva, deficiência visual e deficiência mental. Os portadores destas são chamados “pessoas com deficiências”.

 

No grupo de deficiência visual, existem variações. Para explicá-las a Organização Mundial da Saúde - OMS (Bangkok, 1992), classifica a deficiência visual em 2 grupos: os portadores de baixa visão ou de cegueira (apud De Masi, 2002). Não cabe aqui discutir conceitualmente, mas sim explicar a diferença no processo educacional; alunos com baixa visão devem usar a escrita adequada, enquanto os cegos devem usar o Sistema de Escrita Braille.

 

Vale ressaltar o momento em que a inclusão da pessoa com deficiência foi introduzida nas Instituições de Ensino e como as mesmas se prepararam para lidar com ela. Isso ocorreu quando, em 1998 é decretada a matrícula em escolas da Rede de Ensino Nacional. Nesse momento, as escolas contam com uma postura ambígua: por um lado, têm que aceitar essas pessoas com deficiências e por outro, mantém sua estrutura dentro do mesmo formato. Ou seja, nenhuma preparação para que seus professores e equipe de apoio possam atuar com esses alunos.

 

Este movimento dá início ao chamado “processo de inclusão”. Notando-se que a palavra “inclusão”, vem do latim e quer dizer participar de”. Um outro conceito, segundo Saint-Laurent (1997), diz que inclusão é “a resposta às necessidades pedagógicas de todos os alunos e que se faça no mesmo contexto através de atividades comuns, embora adaptadas”.

 

As necessidades fundamentais para a inclusão do cego no processo educacional são: locomoção – orientação espacial, noções da AVD (Atividades da Vida Diária), bem como aprendizagem com livros e equipamentos adequados da escrita Braille. Dentro deste contexto, o Sistema Braille é ferramenta vital e, portanto se faz necessário conhecer um pouco da história de seu criador, Louis Braille.

 

Nasceu em 1809 numa província a 45 km de Paris. Aos 5 anos de idade perdeu a visão, vítima de um acidente doméstico. Como sua família era muito bem relacionada na província em que viviam, foi levado para um colégio de meninos cegos, onde estudou até os 10 anos. Este estudo ocorria de forma auditiva e oral, deste modo os alunos não sabiam ler, nem escrever, adquirindo apenas o conhecimento dos fatos relatados.

 

Devido ao seu desembaraço e inteligência, Louis Braille, foi encaminhado para o Instituto Real de Jovens Cegos de Paris. Lá inconformado com a unilateralidade do processo educacional, começou a imaginar forma de escrita que atendesse aos cegos. Este formato começou a ser desenvolvido através de uma régua, um estilete e 6 pontos em relevo.

 

Aos 25 anos, Braille já havia criado este sistema, com o alfabeto, números e pontuações. Foi apresentado ao diretor do Instituto, que adotou de imediato a prática do mesmo. Desenvolvido com a combinação de 6 pontos em relevo, criou 63 caracteres diferentes, como também a musicografia e a cartografia.

 

Mais tarde foi chamado para lecionar matemática e geografia no mesmo Instituto, onde permaneceu dando aulas até seus 41 anos. Retornou então para sua província natal, pois havia contraído tuberculose e a doença se agravara nos últimos anos, a ponto de impedi-lo de lecionar.

 

Em 1852, aos 43 anos, faleceu com a certeza de ter deixado um grande legado aos cegos. Na ocasião não foi perfilhado por seus contemporâneos, somente 100 anos após sua morte o mundo reconheceu seu trabalho brilhante. Seus restos mortais foram transferidos para o Pantheon, onde permanece ao lado dos grandes homens da França.

 

No Brasil em 1854, por ato de D. Pedro II, foi criado o Imperial Instituto dos Meninos Cegos, hoje Instituto Benjamin Constant, no Rio de Janeiro; torna-se assim, o Brasil, o primeiro país na América Latina a adotar o Sistema Braille. Este mantém suas características originais, tendo acrescido apenas sinais que atualizaram sua grafia.

 

O Sistema Braille de escrita, na atualidade, apresenta vantagens como:

  • O baixo custo de alguns equipamentos - o que favorece a aquisição por todas as classes sociais;
  • Possibilita o acesso a Bibliotecas bem equipadas;
  • Os livros que são impressos em Braille, não podem ser comercializados, apenas doados.

 

Destacam-se pontos relevantes que o Sistema Braille interage diretamente no dia-a-dia dos cegos, permitindo que estes tenham uma autonomia satisfatória, como:

  • A independência de identificar (por meio de etiquetas com escrita em Braille) peças de roupas, CDs, objetos pessoais, etc.;
  • Identificar medicamentos que possuem informações em Braille;
  • Consultar cardápios em Braille;
  • No supermercado, escolher produtos com legenda em Braille;
  • Identificar nos elevadores o painel de comando em Braille;
  • Produtos eletrodomésticos que possuam manual de instrução em Braille;
  • Em situações que requerem anotações imediatas, o Sistema Braille é o grande facilitador.

 

Portanto, hoje o Sistema Braille representa recurso indispensável para a formação educacional, cultural e profissional das pessoas cegas, permitindo que os educandos cegos tenham acesso aos componentes curriculares e que os profissionais da área sintam-se preparados para atender, com qualidade, os usuários do Sistema Braille; embora não se pode deixar de considerar que o progresso da tecnologia e informática, tenha trazido vários benefícios a estas pessoas.

 

A Educação Inclusiva

 

Os anos 90 marcaram definitivamente o movimento denominado “Inclusão Educacional”, compreendido como novo caminho de uma escola aberta para todos, a educação inclusiva.

 

O processo de inclusão é aquele pelo qual se possibilita ao aluno o desenvolvimento de suas habilidades, raciocínio, valores, vontades, interesses, aspirações, integração e participação.

 

Herminia Prado Godoy (1998), estudiosa no assunto de Inclusão, apresentou uma linha do tempo para explicar o sistema educacional dos deficientes: mental, físico, auditivo e visual e a dividiu em 4 fases:

 

  • 1ª fase, a Exclusão.

Anterior ao século 20, o deficiente não tinha direito nenhum à escola, simplesmente ficava em casa ou internado; não tinha a possibilidade de entrar no sistema escolar, daí a fase de exclusão.

 

  • 2ª fase, a Segregação.

Foi marcada no século 20, por grandes Instituições que cuidavam de deficientes, como: a Pestalozzi, Instituto Benjamim Constant, Instituto Padre Chico entre outras; na década de 50 esta segregação continuou com a formação de “Classinhas”, que eram classes só com deficientes, dentro de uma escola regular.

 

  • 3ª fase, a Integração.

Começou na década de 70, com o interesse das escolas em receber o aluno deficiente em suas salas de aula; porém, o educando tinha que se adaptar ao sistema, providenciando seus próprios recursos; não tinha por parte das escolas nenhuma adaptação para recebê-lo.

 

  • 4ª fase, a Inclusão.

Começou acontecer na metade da década de 80; seguiu nos anos 90 e adentrou no século 21. Marcada pelo fato de que tanto a sociedade como as pessoas com deficiência procuram adaptar-se mutuamente, dando-se o processo de inclusão.

 

Nota-se assim que, para a inclusão do cego no processo educacional é necessário que a Instituição o considere na sua individualidade e cultura, exigindo do professor o conhecimento sobre a deficiência visual e os comprometimentos impostos por ela. Os professores da rede regular de ensino encontram dificuldades em receber o aluno cego, e a justificativa principal é a falta de oportunidade de preparo dos mesmos para atenderem as necessidades destes alunos.

 

Futuros professores preparados e dominando a escrita Braille, se sentirão mais confortáveis diante do processo educacional deste educando e estarão assim inseridos no processo de inclusão.

 

Concluindo, a Inclusão não se faz por decreto; é um processo e como tal leva tempo. Implica em mudanças estruturais na cultura educativa e na vida da sociedade.

 

 

 

 

Bibliografia

DE MASI, I. 2002. Formação de Professor: Deficiente Visual, Educação e Reabilitação. Programa Nacional de Apoio à Educação de Deficientes Visuais. Ministério da Educação Secretaria de Educação Especial. São Paulo.

GAMA, A.S. 1999. Avaliação da educação inclusiva de deficientes visuais nas escolas municipais de 1a a 4a séries das cidades de Campinas/SP e Recife/PE. Universidade de São Paulo.

GASPARETTO, M.E.R.F. 1997. A criança com baixa visão e o desempenho escolar: "caracterização do uso do resíduo visual. Universidade Estadual de Campinas.

GASPARETTO, M.E.R.F., TEMPORINI, E.R., CARVALHO, K.M. & MONTEIRO, N.K.J. 2001. O aluno portador de visão subnormal na escola regular: desafio para o professor? Arq. Bras. Oftalmol. Vol.64 nº1. São Paulo.

GODOY, H.P. 1998. Panorama sobre a Integração, Inclusão e Participação Social da Pessoa Portadora de Deficiência. Universidade Mackenzie. São Paulo.

 

MASINI, E.F.S. 1997. Integração ou desintegração? Uma questão a ser pensada sobre a educação do deficiente visual, in MANTOAN. Maria Theresa Égler e Col. A integração de pessoas com deficiência. São Paulo.

 

MAZZOTTA, M.J.S. 1982. Fundamentos de Educação Especial. Ed. Pioneira. São Paulo.

 

SAINT-LAURENT, L. 1997. A educação de alunos com necessidades especiais, in MANTOAN. Maria Theresa Égler e Col. A integração de pessoas com deficiência. São Paulo.

 



[1] Formação em Serviço Social, pesquisadora da Inclusão Educacional e docente do Sistema Braille de Comunicação. Contato: staioli@uol.com.br 

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