DESEJO DE SER MODELO
Francisco B. Assumpção Jr.
Os primeiros anos deste século, entre outras coisas, podem ser caracterizados por um culto a beleza e a juventude.
Assim, trazem consigo uma supervalorização dessas categorias que, passam então a ser incentivadas econômicamente e, em conseqüência, familiarmente, uma vez que as famílias tentam sempre fazer de seus filhos elementos de sucesso e de realização social e econômica.
Quando nasce uma criança seus pais projetam sobre ela fantasias, muitas vezes inconscientes, de poder, sucesso e realização que, em muitos casos, correspondem a frustrações dos próprios genitores. Assim, em uma sociedade que considera sucesso e realização pessoal como sinônimo de poder e dinheiro, fica claro que esse passa a ser o objeto de interesse familiar.
Assim, duas são as maiores possibilidades, em nosso país, dessa realização a curto prazo e com considerável benefício.
Uma é o caminho do esporte, para o qual são encaminhadas uma considerável parcela de crianças e que, com o devido estímulo e a devida dedicação, podem obter aquele sucesso tão desejado, pincipalmente nas camadas menos favorecidas da população onde o investimento de tempo e dinheiro necessários para a aquisição de cultura torna-se demasiado.
Outro caminho, ligado também às mesmas questões, passa pelo aspecto estético.
Todos os pais orgulham-se de filhos bonitos, que sejam reconhecidos por todos e, mais ainda, se esse padrão de beleza é recompensado, de forma muitas vezes régia, pela sociedade.
Assim, abrem-se as portas para a possibilidade do sucesso precoce e o conseqüente encaminhamento daquela criança na vida produtiva de uma sociedade capitalista.
Uma única questão deve ser considerada, a criança.
Uma criança é ainda um ser em desenvolvimento que deve necessáriamente passar pelo seu processo de desenvolvimento cognitivo e afetivo de maneira coerente e integrada.
Para isso deve ter condições de interagir com outros indivíduos da mesma idade, compartilhando experiências e possibilidades.
O trabalho infantil, e temos que considerar que ser modelo constitue igualmente em trabalho infantil, priva a criança de um padrão de desenvolvimento similar ao das demais crianças, fazendo com que ela ao invés de participar de atividades normais para a sua idade passe a dividir interêsses com o adulto, muitas vezes ainda sem ter condições de avaliar corretamente aqueles valores, o que prejudicará, consideravelmente, seu posterior desenvolvimento.
É curioso que, ao mesmo tempo em que criticamos e propomos propostas de punição para o trabalho infantil menos privilegiado ( como por exemplo o das crianças que são exploradas nas fábricas ou nas lavouras), fato esse que realmente deve ser evitado, fechamos nossos olhos para essa outra atividade que, embora estéticamente mais bonita e econômicamente mais diferenciada, não se difere da exploração do trabalho da criança que, levada pelos pais e por interêsses puramente econômicos, é desvirtuada em sua infância e sua ingenuidade.
Cabe portanto pensarmos, sem nos deixarmos levar pela sedução do dinheiro e do sucesso, na necessidade de cuidarmos da criança como um ser em desenvolvimento, dignos de consideração e de não ser explorado pelo sistema que nos cerca.